O que fez Quando as Luzes se Apagam chegar com certa expectativa aos cinemas foi o curta Lights Outs, que virou fenômeno na internet. Naquele pequeno filme havia certa compreensão de como uma narrativa e meios cinematográficos poderiam beneficiar a produção de vídeos para Youtube, revelando grande habilidade de seu diretor, David F. Sandberg, em relação a ritmo e atmosfera. Onde se via um pequeno talento, Hollywood viu o sucesso – se um vídeo de apenas três minutos atraiu tanta gente, um longa nos mesmos moldes atrairia bastante dinheiro.
Produzido por James Wan, que se tornou uma espécie de guru da industria cinematográfica em termos de terror, o filme baseado no viral do Youtube já vem colhendo seus frutos no próprio mercado americano, e até então parece mais uma aposta acertada no gênero. Assim é engraçado notar que Quando as Luzes se Apagam siga os mesmos passos tanta na produção quanto no desenvolvimento estético narrativo. O longa, que também é dirigido por Sandberg, aposta no baixo orçamento, na trama fácil que pega o espectador por sua sugestão com a realidade, que nesse caso é o medo do escuro, a figura da assombração e principalmente o susto. Parece que o processo de transposição do curta para o longa foi através de uma pretensa fórmula de sucesso do gênero atualmente.
Assim, se Lights Outs se destacava entre os milhares de vídeos que há no Youtube, Quando as Luzes se Apagam parece apenas mais um filme de terror dessa geração. Nota-se que há um processo ao longo da obra de generalização até ficar totalmente genérico, uma vez que logo nos primeiros momentos o longa já demonstra toda sua habilidade nessa construção rítmica do terror, numa sequência extremamente tensa que utiliza o aspecto mais básico do filme: o medo do escuro e uma ameaça que não se pode ver, que aparece sempre nas sombras. Esses primeiros minutos são os mais funcionais e os mais bem orquestrados de todo o longa.
Dessa maneira, é perceptível, desde então, que o filme está sendo regido por um nome com alguma habilidade. Há grandes virtudes no trabalho de Sandberg, desde um entendimento do ritmo, da atmosfera e da construção do roteiro, até uma concepção visual que se demonstra bastante interessante. O cineasta mostra talento na movimentação de câmera que nunca parece exagerada ou desnecessária, mas sempre um movimento que leva o espectador até onde ele quer ou onde teria medo de ir. Sandberg também é inteligente em construir alguns momentos em que a estética dos planos ajuda a construir uma concepção visual do horror, não sendo pura estetização, mas sim uma psicologia através das luzes, das cores e do posicionamento de câmera – por exemplo, no momento em que a protagonista é assombrada por aquele monstro que ataca no escuro e sua única luz é um luminoso vermelho sangue, ou no início do terceiro ato em que a assombração pode ser vista através de uma luz negra, que faz a cena ficar toda avioletada, ambas mostrando a violência que vem a seguir e a outra o equilíbrio e a transformação do medo, do trauma. Em seu primeiro trabalho em um longa-metragem, Sandberg lembra vagamente, por exemplo, o estilo e as virtudes de Dario Argento, o mestre do horror italiano.
Diante disso, é totalmente desapontador ver em que Quando as Luzes se Apagam desemboca. O filme aposta mais e mais vezes no susto fácil, pensa menos naquela concepção do medo do escuro para pregar peças em seu público, e se aquela figura assustadora provocava temor por sempre estar nas sombras, nunca revelando de fato sua forma, o longa teima em mostrar o que é aquilo e seu design não poderia ser mais idêntico aos mais diversos monstros dessa safra de terrores. O longa vai caindo num lugar comum sem fim, parece que se vê na tela o mesmo monstro, o mesmo clímax e o mesmo desfechos, filmados de maneira genérica sem a identidade visual que parecia vir sendo construída.
Essa confusão é gerada muito pelo fraco roteiro de Eric Heisserer, que parece, assim como o público, não saber de fato o que é aquela assombração. Quando as Luzes se Apagam parece oferecer uma série de explicações que nunca são levadas até o fim, até certo ponto parece que o filme seguirá numa linha mais psicológica com direito até mesmo a um flashback num sanatório americano no melhor estilo Irmãs Diabólicas (1973) de Brian De Palma; depois, a narrativa opta por explicar seus fatos de maneira mais macabra, quase num típico filme de espírito, com direito a descoberta de mortes e corpos que parecem estar rondando por aí. Porém, a verdade é que o filme não se assume e não é nenhuma coisa nem outra, o que fica ainda mais evidente no seu final, que não se resolve de maneira alguma. Se Quando as Luzes Se Apagam pedisse um gênero, seria o terror de sustos e só.
O que Heisserer e Sandberg parecem compreender é que praticamente todo thriller com o mínimo de cunho psicológico possui uma dimensão familiar, e Quando as Luzes Se Apagam é construído justamente na fragmentação da família que se reúne através desse trauma, desse medo. Assim, é mais interessante ainda notar como essa assombração é construída como uma integrante da família que está sempre nas sombras, que está a margem, que quer ser aceita como parte daquele núcleo, mas ao mesmo tempo pede exclusividade com a matriarca, a figura emotiva central de quase todas as famílias. Assim, a força daqueles personagens está justamente em expulsar esse intruso familiar para assim poder se reconstituir, sendo este trauma fundamental para a reconciliação.
Quando as Luzes se Apagam é um filme que parece entender momentos chaves do gênero, da concepção visual, da construção rítmica e da temática recorrente no terror. No entanto, parece ser contaminado por um pensamento do que é sucesso na indústria nesse meio, o que pouco a pouco leva o filme a ser só mais um filme do gênero. A indústria não viu a possibilidade em Sandberg, mas sim naquele pequeno filme realizado por ele, o resultado é um filme moldado através de clichês, que não sobrevive nas tentativas quase naturais de seu diretor em conceber um filme diferente, um filme que causasse o frescor que seu curta havia gerado.