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Crítica | Era Uma Vez um Deadpool

Apostar em um filme solo de um personagem para maiores e cuja primeira aparição nos cinemas foi em X-Men Origens é algo ousado, mas foi o que aconteceu com o primeiro filme de Deadpool e, para a sorte dos envolvidos, algo que resultou em sucesso. Mais ousado que isso, no entanto, é transformar um anti-herói tão confortável no território adulto em algo que os menores de idade possam assistir em pleno natal com seus pais, sem que role grande constrangimento.

Esse experimento, no caso, não deu igualmente certo. Era Uma Vez um Deadpool, também conhecido como a versão para menores de Deadpool 2, quase chega a nem ser um filme. Com pouquíssimas diferenças notáveis em relação ao original, a não ser pela participação de Fred Savage e a ausência de sangue e palavrões, o lançamento natalino da Fox mais parece um bônus engraçadinho de DVD, daqueles que consagravam as versões home-video dos filmes de Monty Python mas sem a mesma graça.

De certo modo, a missão de Era Uma Vez um Deadpool se justificar já era mais difícil pela clara inferioridade de Deadpool 2 ao original. Os efeitos são mais caprichados, o elenco vasto e cheio de participações especiais e o escopo da ação mais amplo, mas o longa pecava ao transformar Deadpool, um anti-herói, em simplesmente um herói que gosta de soltar piadas sujas e quebrar a quarta parede. A trama, portanto, não ganha ares tão mais novos com um tratamento PG-13 / 14 anos, sendo que também já era formalmente mais comportada que o original.

Em outras palavras, Deadpool 2 não era sujo ou ácido o suficiente para que um novo corte como esse pudesse ser considerado audacioso – pelo menos, não tanto quanto promovê-lo com um teaser focado nas qualidades da banda Nickelback. O que pode ser considerado o atrativo aqui e que dá um tempero a mais ao longa é a participação de Fred Savage, que contracena com Deadpool em um estúdio… quarto modelado fielmente a partir daquele iconizado em A Princesa Prometida. Hoje um diretor de TV, principalmente de programas de comédia, Savage tem ótimo timing cômico e sua presença sempre cativa.

Reapresentar a trama de Deadpool 2 no mesmo recorte fabulesco de A Princesa Prometida, por outro lado, não acrescenta quase nada à experiência original. A versão para cinemas de Deadpool 2 já contava com uma narração em over do herói e aqui, em meio à nova narração de Natal, parece fora de lugar e despropositada, sendo que era estabelecida especificamente para ligar os acontecimentos do prólogo ao resto do longa – esse prólogo, a parte mais sanguinolenta do corte anterior, está completamente ausente aqui. Portanto, não só a nova narração entra em conflito com a original como também anula parte de seu sentido na trama.

O principal – e talvez única – utilidade desse novo recorte é, por sinal, comentar em cima do filme lançado em maio com aquela típica autoconsciência depreciativa que os roteiristas empregaram a princípio para justificar as limitações do material. Aqui, os roteiristas – ou simplesmente estagiários que sondaram agregadores de críticas – comentam em cima dos comentários anteriores para demonstrar ainda mais autoconsciência acerca dos deméritos do lançamento original, mas isso novamente soa como um artifício vazio de roteiro que nem a entrega de Fred Savage é capaz de deixar convincente. O resultado, pelo menos, nunca chega ao ponto de se tornar numa espécie de CinemaSins na tela grande.

Ainda assim, uma ou outra cena inédita prova que há sim a possibilidade de fazer um filme de Deadpool que funcione sob censura baixa. A melhor delas, facilmente, é uma que traz Fred Savage no momento em que descobre que Matt Damon fez uma ponta em Deadpool 2. Completamente entusiasmado, Savage fala sobre como sempre sonhou em lutar com Damon, e o mercenário tagarela bipa as falas do ator precisamente para que soem como algo que, pra ser sincero, não está muito longe de uma luta corpo-a-corpo intensa – essa é uma ótima piada suja feita inteiramente na sugestão e na livre associação.

Caso a Marvel Studios e a Disney optem por incluir Deadpool ao seu universo cinematográfico, é bom que equipem o mercenário com seu aparelho de bipe. De maneira ou outra, Era Uma Vez um Deadpool ao menos consegue provar que seu personagem funciona não pelas brincadeiras juvenis ou pela violência, mas sim quando há um roteirista inspirado por trás de tudo, seja num filme para maiores ou menores. Pena que, desta vez, foi necessário lançar um bônus de DVD de quase duas horas para que alguns pequenos momentos deem o ar da graça, que não é o bastante para justificar a aquisição do ingresso.

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