A primeira temporada de The Witcher chegou à Netflix com grandes expectativas por parte dos fãs, e com a série trazendo mais um universo medieval de fantasia para a televisão, era inevitável que diversas comparações fossem feitas entre a história de Geralt e a finada Game of Thrones.
Tais comparações também ficaram ainda mais intensas por estarmos encerrando o ano que trouxe o grande final de Game of Thrones, cuja recepção (tanto de crítica, quanto do público) foi bem mista, para dizer o mínimo. E desde então, diversas séries estão sendo encaradas como potenciais “novas Game of Thrones”, e dadas as semelhanças com The Witcher, a série da Netflix despontou como uma séria candidata.
Mas afinal, será que tal comparação é justa? Em minha crítica da nova série, deixei claro que comparar as duas séries é um tanto improdutivo, por estarmos lidando com abordagens, espaços e aspirações bem diferentes, mas como a discussão continua a todo vapor, vamos colocar estes aspectos lado a lado, e ver se conseguimos chegar aos principais motivos pelos quais The Witcher pode ser aproveitada sem carregar tais expectativas, ou se a série da Netflix está fadada a continuar perseguindo o legado da guerra dos tronos.
Proposta e Abordagem
Primeiramente, é preciso olhar para as intenções principais de ambas as séries, em suas primeiras temporadas. Nem todos se lembram, mas quando Game of Thrones estreou na HBO em 2011, a principal comparação e referência que circulava a série era a trilogia “O Senhor dos Anéis”, basicamente por conta da temática fantasiosa (direcionada a um público mais velho), e pela presença de Sean Bean no elenco. Hoje em dia, podemos perceber claramente como tal comparação era bem superficial, mas o mesmo parece estar acontecendo com The Witcher e outras séries de grandes orçamentos que estão adentrando o cenário televisivo.
Apesar de não contar com a mesma proporção de suas futuras temporadas, Game of Thrones já havia começado sua jornada com um foco claro na política de Westeros, e dava destaque às manobras políticas de seus personagens, mais do que para qualquer cena de ação. Os aspectos fantasiosos da série eram utilizados como “ganchos” para o espectador, enquanto a maior parte do trabalho da primeira temporada era construir este universo e as principais dinâmicas entre os diferentes personagens. E com o final “chocante” do primeiro ano, também ficou claro que Game of Thrones não era uma história sobre um único protagonista, mas sim sobre os vários participantes da guerra dos tronos.
Já The Witcher deixa bem claro, logo no primeiro episódio, que a dinâmica de Geralt como um caçador de monstros, com poderes mágicos à sua disposição e horrendas criaturas de CGI sangrando por todo o lado, era o seu foco. Ainda assim, temos a construção deste universo, com intrigas políticas que servem mais para preparar grandes cenas de ação, do que para servir como um retrato de como funcionam as cortes deste mundo fantasioso. E apesar da temporada contar com uma certa dispersão em sua estrutura, Geralt permanece como o protagonista desta série, ainda que sua perspectiva acabe cedendo espaço para a trajetória de Yennefer.
Ritmo e Estrutura
É essencial notar como Game of Thrones movia suas tramas em um ritmo lento, porém repleto de movimentos e perspectivas. Cada episódio trazia um número de personagens com suas próprias trajetórias que poderiam se cruzar eventualmente, mas não necessariamente. E esta estrutura narrativa proporcionava uma visão geral de Westeros de uma forma que The Witcher não está tão interessado em construir com sua primeira temporada. Vemos, sim, as perspectivas de Yennefer e Ciri, mas a abrangência é consideravelmente menor por aqui, com a história seguindo um caminho procedural com os diferentes trabalho de Geralt, enquanto o crescimento de Yennefer e a jornada de Ciri ficam responsáveis pela continuidade da temporada.
Não é uma questão de qual estrutura funciona melhor ou pior (embora a estrutura de The Witcher tenha seus problemas na execução, o que torna a série mais lenta do que precisaria ser para suas intenções). Mas sim perceber que ambas as séries estão tentando contar suas histórias de formas bem diferentes, com recompensas emocionais bem diferentes durante o crescimento de seus personagens. Se comparar estas primeiras temporadas inteiras já não é visivelmente estranho, compare apenas os episódios finais e aponte-me qualquer semelhança.
Visual e Orçamento
Mas se o público (e a crítica) continuar buscando qualquer comparação entre as duas séries de fantasia, é provável que os aspectos visuais tomem um bom espaço da discussão. A HBO sempre foi conhecida por entregar séries chamativas, visualmente, e Game of Thrones foi se consagrando, cada vez mais, como uma referência neste quesito, buscando se comparar aos blockbusters do cinema em suas temporadas finais.
Mas apesar de The Witcher ter um orçamento maior, por episódio, do que a comparação, o mesmo deslumbre não está presente, justamente por que a série da Netflix está lidando com dragões cuspidores de fogo completamente crescidos logo em sua primeira temporada, e busca entregar cenas de ação elaboradas a cada episódio, ao invés de sequências de longas conversas em volta de uma mesa dentro de um castelo.
Como disse (algumas vezes), são propostas bem diferentes, e aqueles que se sentiam entediados pelas intrigas políticas e diálogos pesados de Game of Thrones, com certeza se sentirão mais estimulados por The Witcher e suas batalhas mágicas. Ao mesmo tempo, se o roteiro substancial de Game of Thrones era o que te fazia acompanhar a série, acima do cenário fantasioso, então talvez a série da Netflix possa te decepcionar.
Qual série ganha? Vai depender do seu gosto. Ambas tiveram primeiras temporadas bem diferentes, com qualidades empolgantes e defeitos que precisam (e precisavam) ser lidados em temporadas seguintes. Então talvez este seja o melhor motivo para comparar ambas as séries. Olhe para a primeira temporada de Game of Thrones, veja o quão longe a série caminhou até o seu final, e gaste um tempo pensando e especulando para onde The Witcher pode seguir, com o tempo.