Dois anos depois chega a segunda temporada de Outra Vida, série de ficção científica original da Netflix.
Antes de qualquer coisa, devemos dizer que é uma grande surpresa testemunhar isto acontecendo, já que a produção lançada em 2019 pouco agradou, tanto críticos especializados quanto o público da plataforma streaming. Então, não seria nenhuma surpresa que já cancelassem, logo após ter ficado disponível para o assinante. Não foi o caso.
Estamos em 2021, e temos mais uma oportunidade de mergulhar na trama estilo ‘greatest hits do sci-fi’ que Outra Vida oferece ao espectador.
A produção encabeçada por Aaron Martin começa quando um objeto voador não identificado, em forma da faixa de Möbius (ou seja, um anel em um plano hiperbólico), pousa na Terra e cresce uma torre cristalina acima dela. Erik Wallace (Justin Chatwin), um cientista empregado pelo Comando Interestelar dos Estados Unidos, tenta se comunicar com a estrutura alienígena. A esposa de Wallace, a comandante Niko Breckinridge (Katee Sackhoff), leva a espaçonave Salvare e sua tripulação milenar para determinar a origem do artefato e estabelecer o primeiro contato com a espécie que enviou tal objeto não identificado. A espaçonave é capaz de viajar mais rápido que a luz (FTL) e carrega a maior parte de sua equipe dormindo em cápsulas de hibernação, para serem despertos quando necessário. Enquanto Breckinridge e sua jovem tripulação investigam, eles enfrentam perigos inimagináveis no que pode acabar sendo uma missão sem volta.
Caldeirão de referências
Uma das críticas mais ouvidas após o lançamento da primeira temporada dizia que o material apresentado por Outra Vida era pouco original.
Bom, para estes que desgostaram em 2019, provavelmente não teremos nada de novo no cardápio atual, em vista que continuaram apostando naquelas típicas situações geralmente encontradas em qualquer produção sci-fi por aí.
E, é verdade que a história escrita por Aaron Martin não se acanha de pegar inspiração, ou mesmo copiar na cara dura, outras produções do gênero que ganharam muito destaque no passado, seja este mais recente ou antigo.
Conseguimos perceber em Outra Vida, lances que lembram: Alien – O 8º Passageiro (1979) de Ridley Scott; O Predador (1987) de John McTiernan; Independence Day (1996) de Roland Emmerich; Interestelar (2014) de Christopher Nolan; A Chegada (2016) de Denis Villeneuve; entre outros.
Óbvio que a produção lançada na plataforma da Netflix não chega nem perto de ter o entretenimento despretensioso de obras, como O Predador ou Independence Day; nem é capaz de nivelar a engenhosidade e profundidade emocional de trabalhos, como Interestelar ou A Chegada, por exemplo.
Ainda assim, vemos um esforço minimamente digno em Outra Vida, que nesta segunda temporada apresenta algumas quedas, mas definitivamente entrega algo mais substancioso que na primeira parte.
Algumas lombadas pelo caminho
Esta segunda parte da série sci-fi da Netflix contendo dez episódios pode ser dividida entre: a primeira e a segunda metade.
Nos cinco episódios que introduzem o segundo volume de Outra Vida, conseguimos perceber todas as peças e ferramentas que geralmente constituem uma prazerosa ficção científica para o espectador. Entretanto, toda a narrativa parece estar apressada, o que é incomum se lembrarmos que criaram dez episódios para o desenvolvimento do enredo.
Desta maneira, pouco sentimos os conflitos propostos nos momentos iniciais da trama, que surgem com suas devidas complicações, para serem solucionados logo em seguida, sem qualquer reflexão ou mesmo esforço. Isto enfraquece demais a narrativa, afastando as possibilidades de entretimento do assinante Netflix.
Quando chegamos no sexto episódio intitulado ‘Presente divino’, temos a impressão que outra pessoa assumiu o controle da criação da série, de modo que sentimos a narrativa pulsar com mais força. Mesmo as performances no elenco, que tinham que tirar leite de pedra na primeira metade e sofriam para demonstrar algo de mais valor, conseguiram revelar um carteado mais amplo de emoções em situações que exigiam mais reflexão ou resistência para sobreviver alguns terrores encontrados.
Os episódios ‘Desistir, jamais!’ e ‘Como um rato na gaiola’ representam o ápice narrativo de Outra Vida, não só desta temporada, mas de todo o enredo desde o início lá em 2019.
Seres humanos X IA (Inteligência Artificial)
Igualmente a franquia Alien, que começou com o clássico de 1979, dirigido por Ridley Scott, observamos a relação entre o ser humano e as chamadas Inteligências Artificiais. Temática que normalmente gera boas discussões e entretenimento para o público.
Nem cabe a comparação entre William (Samuel Anderson) e Iara (Shannon Chan-Kent) de Outra Vida, com as IAs criadas por Scott, interpretadas pelos talentosos Ian Holm (1931 – 2020) e Michael Fassbender. Até mesmo porque são abordagens completamente diferentes, cada uma com seu devido valor narrativo.
O que vale destacar aqui é o tocante trabalho de Samuel Anderson, interpretando a interface holográfica da inteligência artificial senciente a bordo da espaçonave Salvare. Apesar de não presenciarmos atos extremos vindos de William, notamos muitas nuances na performance de Anderson, que se mostra emocionalmente consciente dos fatos que presencia.
Também vale destacar o trabalho da atriz Shannon Chan-Kent, que se esforça para entregar emoções fortes na primeira metade da série sci-fi produzida pela Netflix. Lamentavelmente, é sabotada por um roteiro que não lhe oferece mais que o básico, limitando sua performance.
Sobre comunicação
O episódio derradeiro desta segunda temporada faz as honras de ditar qual é o grande objetivo narrativo de Outra Vida: enaltecer a curiosidade humana através do ato da comunicação, que nem sempre propõe os melhores cenários, mas ainda é a melhor maneira de construir pontes que permitem nossa progressão como seres parte do universo.
Sim, explicativo desse jeito, parece mais alguém lendo uma passagem de livro de autoajuda do que qualquer outra coisa. Mas lembremos que Outra Vida da Netflix não mira entregar algo novo. É uma receita requentada de algo que já foi feito anteriormente de modo mais qualificado.
Resta saber se ainda vão apostar nesse conceito para uma terceira temporada e mais adiante. Tudo ainda está aberto. Será que as limitações narrativas, dão conta do infinito do espaço?