Praticamente pouco mais de dois anos atrás, fazia-se muito barulho antes da esperada estreia do que seria a primeira temporada de The Witcher na Netflix.
Dentre os motivos para tanto alvoroço, tínhamos o fato da produção ser inspirada em uma série de seis romances de fantasia e quinze contos escritos pelo autor polonês Andrzej Sapkowski, que tiveram um culto de seguidores na Polônia e nos países da Europa Central e Oriental, sendo traduzidos para 37 idiomas e vendido mais de 15 milhões de cópias em todo o mundo. A partir do sucesso dos livros, desenvolveram uma trilogia de videogames (The Witcher, The Witcher 2: Assassins of Kings, e The Witcher 3: Wild Hunt) que foram ainda mais bem-sucedidos, com mais de 50 milhões de cópias vendidas mundialmente.
Junta-se a isso a presença de Henry Cavill, uma das maiores estrelas de cinema atualmente, no papel de Geralt de Rivia que é o protagonista destas histórias situadas em uma massa de terra fictícia de inspiração medieval conhecida como “o Continente”.
E devemos dizer que a recepção da primeira parte de The Witcher, que foi baseado em O Último Desejo e A Espada do Destino, foi apenas mediana entre os assinantes da plataforma Netflix. Agora, dois anos após a estreia ganhamos uma segunda temporada da produção que mistura ação, aventura, fantasia e um tanto de drama.
A série Netflix segue Geralt de Rivia (Henry Cavill), a Princesa Ciri (Freya Allan) e a feiticeira Yennefer de Vengerberg (Anya Chalotra) em diferentes pontos do tempo, explorando eventos formativos que moldaram seus caracteres, antes de finalmente se fundirem em uma única linha do tempo culminando na batalha por Sodden Hill contra os invasores de Nilfgaard.
Narrativa de movimentos ineficientes
Esta segunda temporada de The Witcher foi baseada em “A Grain of Truth” de O Último Desejo, O Sangue dos Elfos e no início de Tempo do Desprezo. Assim, logo de partida percebemos uma proposta de condensar várias partes dentro de apenas um volume. Se isso ajuda muito no quesito dinâmica, pode ser problemático quando comentamos sobre o envolvimento do assinante Netflix enquanto assiste à produção de estilo medieval.
Observamos que ambos resultados aparecem claramente nesta segunda parte de The Witcher, que melhorou bastante no território da ação, com cenas de batalha entre Geralt de Rivia contra algumas bestas selvagens e monstros que vão agradar principalmente aqueles que são fanáticos pelos videogames; especificamente podemos citar, por exemplo, as lutas que acontecem nos episódios ‘Kaer Morhem’ e ‘Caro amigo…’ como bons destaques do gênero ação.
Assim como também percebemos uma narrativa que se movimenta bastante por enredos diferentes que são parte de um todo, mas que nunca conseguem juntar tudo passando qualquer senso de urgência ou perigo para o público assinante da Netflix, além da ineficácia na conexão entre quem assiste e o material que se revelou algo demasiadamente frio em muitos momentos.
É tudo tão inócuo que mesmo as cenas de extrema violência gráfica que são parte essencial de The Witcher, especialmente dos jogos, parecem não surtir qualquer efeito.
O “protagonista”
Boa parte do motivo deste distanciamento entre público e história veio pela falta de foco no roteiro desenvolvido por Lauren Schmidt Hissrich, agora, por outro lado também temos um elemento que contribui negativamente para este afastamento: a performance de Henry Cavill.
Deu para perceber que tinham a intenção aqui de adicionar uma substância eastwoodiana no herói Geralt de Rivia, que é extremamente protetor com a Princesa Ciri, papel de Freya Allan. Porém, temos uma atuação muito dura, rígida por parte de Cavill, que não conseguiu demonstrar quaisquer nuances neste trabalho visto em The Witcher, muito distante das performances de Clint Eastwood nas qualificadas obras de cinema Menina de Ouro (2004) e Gran Torino (2008), por exemplo.
No lugar testemunhamos uma atuação que parece estar ligada no piloto automático, onde todas as cenas e reações de Henry Cavill parecem iguais e ao mesmo tempo tão desinteressantes de se acompanhar como espectador.
A verdadeira protagonista
Se o trabalho de Cavill tirou alguns valores imprescindíveis ao material, que sorte a de terem em Freya Allan alguém capaz de transmitir algo substancioso para nos conectar de volta à narrativa em The Witcher, que com o passar dos episódios desta segunda temporada fica cada vez mais notório perceber um destaque diferenciado da Princesa Ciri, a herdeira real de Cintra, neta da Rainha Calanthe (Jodhi May) e filha de Pavetta (Gaia Mondadori), que definitivamente tem sangue da realeza correndo por suas veias, mas que passa longe de ser uma aristocrata indiferente.
Tão logo no segundo episódio ‘Kaer Morhem’ já temos a oportunidade de testemunhar a princesa empunhando uma espada sob a supervisão de seu protetor Geralt de Rivia, mostrando que quer se tornar um bruxo assim como ele, treinando com muito afinco apesar da incredulidade e mínima boa vontade de alguns bruxos para com sua “frágil” aparência.
Pelos olhares e expressões faciais da jovem atriz inglesa de apenas 20 anos de idade recebemos algo para nos mover de uma maneira onde torna possível sentir alguma pulsação em uma trama que apresenta muitas dificuldades de manter o assinante Netflix emocionalmente envolvido com aquilo que os olhos observam.
Conclusão
Certamente tivemos uma melhora da primeira para a segunda temporada de The Witcher, ainda assim não podemos afirmar que a imersão no material acontece de modo natural, seja para os fãs dos livros ou jogos, incluindo até mesmo o público geral que desconhece a fonte original mas mostra-se entusiasta quando adentram histórias que se passam em cenários medievais.
Sabendo que temos a garantia de uma terceira temporada já assando no forno, melhor trabalhar alguns aspectos que possam contribuir mais para que esta trama de confusões encontre um eixo definitivo em como contar esta história, enquanto tenta trazer algum pulso e câmbio para o herói Geralt de Rivia, que até o momento é apenas uma peruca cinza na cabeça de Henry Cavill.