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13 Reasons Why | Crítica - 1ª Temporada

Adolescência, definida por alguns como a melhor fase da vida, descobertas, liberdades e afins. Basta se lembrar um pouquinho do turbulento período entre os 11 e 18/19 anos para ter certeza que não é bem assim que as coisas acontecem. 13 Reasons Why está inserido nesse pensamento, o de revelar ou entender por quê os percursos da juventude nem sempre são tão fáceis de entender, não se trata apenas de desilusão amorosa, decisões, zoações, ou coisas do tipo, adolescentes estão cercado por tantos outros temas que devem ser levado a sério.

Num típico dia de aula, Clay Jensen (Dylan Minnette), ainda abatido pelo suicídio de sua amiga Hannah (Katherine Langford), recebe treze fitas cassetes gravadas por ela ainda em vida, explicando os treze motivos que a levaram a cometer tal ato. O garoto passa então a fazer uma jornada de recomposição de sua antiga companheira, movido por esses áudios e baseado nas suas lembranças, os passos de Hannah vão sendo recontado, confrontando passado, presente e futuro. Como um álbum bem planejado, o espectador vai conhecendo Hannah e o panorama de uma geração a cada frase, cada fita, a cada lado da cassete, a cada personagem que ela cita, a cada frase que ela diz, como se os comentários da garota ecoassem como uma música capaz de fazer refletir cada ato passado no presente.

“Love Will Tear us Apart”, a faixa clássica do Joy Division dá o tom do episódio inicial, a voz marcante de Ian Curtis canta que o amor ainda será dilacerante, no final (ou no início) tudo se resume aos amores. Evidentemente, que não se fala apenas dos amores românticos, mas todos que podem gerar afeto, é apenas o que Hannah quer. Cada lado de uma das fitas narra seu envolvimento com um estudante de sua escola e como eles transformaram o amor que ela tinha a oferecer em uma arma que atingia apenas a própria garota. O bando de atletas que só a viam como um pedaço de carne sexualizado, a amiga que acreditou nos boatos ao invés da amizade, o parceiro que a usou para atingir uma outra garota e assim por diante. Nesse ritmo, segredos vêm à tona e até crimes são revelados, e enquanto as outras pessoas tentam manter sua pose, é apenas Clay que segue numa busca incessante pelo passado, revelando também toda sua fragilidade em relação àquele mundo e a sua real admiração por Hannah.

Nessa jornada que parece perdida, a dor de Clay é o condutor emocional da série, a cada palavra dita por Hannah há um peso no presente do garoto, que mal consegue ouvir uma fita inteira sem interrupção. Ele parte para o confronto, não só externo mas interno, tentando fazer com que todos naquela escola (principalmente os treze envolvidos, ele incluso) tenham consciência da sua parcela de culpa. O confronto de Clay é ainda mais profundo, inserindo um terceiro elemento na trama, a criação de uma dimensão narrativa que só existe na cabeça desse personagem, a imaginação de um futuro melhor, como seria a vida de Hannah se desde sempre ele tivesse declarado seu verdadeiro amor, como se ele tivesse sido o único que realmente pudesse, com um abraço, retirar Hannah daquele mundo sombrio escondido por baixo dos casacos de atletas.

Além de intenso emocionalmente, 13 Reasons Why é realizado com precisão. Dirigido por nomes interessantes do cinema americano, como Tom McCarthy (Spotlight), Greg Araki (Pássaro Branco na Nevasca) e Jessica Yu (Greys Anatomy, American Crime), a adaptação do sucesso literário de Jay Asher tem ideias visuais e formais que ajudam 13 Reasons Why a passar as sensações de seus personagens e a importância dos temas que toca. Com uma montagem totalmente eficiente, passado e presente estão sempre em confronto,a edição coloca causa e consequências no plano e contraplano, o espectador vê (e sente) o que Hannah narra e segundos depois percebe quais foram as decorrências daqueles fatos. O drama, por muitas vezes, ganha tons de mistério e o público é convidado, pouco a pouco, pista a pista, fita a fita a entrar no lado mais sombrio dessa geração. “Into the black” como diria Chromatics.

“Because I feel it all fading and paling” (Porque eu sinto tudo sumindo e empalidecendo) esse é o verso cantado pelo The Cure em outra faixa que surge na série. 13 Reasons Why compreende claramente sua importância como mensagem, ador, independente de estar num corpo jovem, é importante, compreender os fatos que levam essa angústia empalidecida ao extremo deve ser colocado sob à luz. Nesse sentido, a série produzida pelo Netflix coloca todos os temas que cercam a adolescência contemporânea em evidência, como bullying, assédio, machismo, stalker (perseguidores) e estupro. Esses são fatos que a todo momento são trazidos à tona, deixando claro que a série deseja mostrar que os treze motivos são esses atos e não aquelas pessoas em si. Evidente que isso traz certo didatismo à obra, a cada diálogo é lembrado que aquele assunto é sério e deve ser debatido, mas isso ocorre justamente na chave de tentar conscientizar a audiência.

13 Reasons Why não é relevante apenas pelos temas que aborda, mas pela consciência do retrato e das imagens que constrói em torno da juventude atual. O verso do último parágrafo pertence a música Fascination Streets (Ruas da Fascinação), e a série vai justamente pensar ou fascínio gerado em torno deste universo. O obra reconstitui todo um imaginário a cerca dos estereótipos juvenis, não é mais brilhante ser o atleta, a popularidade nem sempre é construída através de pilares morais e nem mesmo é correto romantizar a figura do jovem que parece estar sempre num estado melancólico – esse só pode ser um sinal de uma real depressão.

O melhor exemplo disso é a figura de Tony, com sua jaqueta de couro, suas tatuagens e seu mustang vermelho ele poderia ser apenas mais um herdeiro do rebelde sem causa construído por James Dean. Todavia o garoto se demonstra totalmente o contrário disso, um homem da proteção, que tenta fugir dos padrões do socialmente aceitável, um guia espiritual para Hannah e Clay, alguém que redefine até mesmo questões de masculinidade por trás do poçante e das roupas roqueiras. Nessa fase não há motivos para acreditar da veracidade das imagens, não há mais fascinação, por trás de estereótipos e clichês existem seres humanos, por vezes cruéis, por vezes frágeis.

Ao longo dos 13 episódios, a série vai criando um envolvimento emocional extremamente forte, muito por sua dupla perspectiva narrativa (Clay no presente e Hannah no passado). A mente do espectador é jogada num sentimento de uma expectativa burra, ou seja, a todo momento estamos torcendo para que aconteça algo que sabemos ser impossível. Hannah é a garota para Clay, e ele o cara certo para ela, há o afeto necessário para ambos. Tudo que eles queriam era simplesmente estarem juntos, isso é tudo aquilo que gostaríamos de ver.

Numa espécie de alívio emocional, a voz rasgado do cantor de folk Lord Huron faz surgir “In The Night We Met”, está no momento desta série juvenil realizar a grande cena do baile, a música sentimental clama para que eles se beijem, que tenham sua própria dança, mas mais uma vez isso é impossível. Felizmente a ficção é capaz de perfurar a barreira da morte, possibilitando que Clay e Hannah possam declarar todo amor numa dimensão que só existe numa obra como essa. Clay seguirá sem Hannah, Hannah sem Clay, o espectador sem o casal perfeito, é hora de lidar com a desilusão, com a falta.

Com tudo isso, 13 Reasons Why torna-se uma série muito mais do que simpática sobre romances fora dos padrões, o que se vê aqui é uma obra totalmente empática, logo humana. Há honestidade no retrato da adolescência, a melhor fase da vida existe apenas na cabeça de pais alienados e não no mundo real.
13 Reasons Why torna-se uma jornada dolorosa sobre ter que seguir em frente num mundo em que as idealizações não existem, reconstituir toda a dor de Hannah é necessário para que uma nova geração possa crescer e aceitar suas fragilidades e erros, só assim suas consequências não serão tão trágicas quanto a daquela garota.

Como canta Echo & The Bunnyymen, o destino, contra a sua vontade, para o que der e vier, esperará até que você se entregue a ele, 13 Reasons Why espera que o destino de muitos jovens não seja como o de Hannah.

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