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Cobra Kai | Crítica - Primeira Temporada

Já fazem mais de 30 anos desde o lançamento de Karatê Kid – A Hora da Verdade, e as inúmeras reprises na Sessão da Tarde firmaram o filme sobre artes marciais não somente como um clássico daquela época, mas marcou e inspirou uma geração e se fincou no imaginário popular com sua receita tipicamente oitentista, onde o jovem Daniel LaRusso (Ralph Macchio) e seu sensei, o senhor Miyagi (Pat Morita, indicado ao Oscar pelo papel), criam laços para além da relação mestre e aluno em meio a arte do karatê e ensinam lições valiosas um ao outro como superação e perseverança.

Três décadas depois e com algumas continuações na bagagem, além de um derivado estrelado por Jaden Smith e um badass Jackie Chan, pareceu o momento oportuno para ressuscitar não apenas Larusso na atualidade, como também seu icônico rival, Johnny Lawrence (William Zabka). E por mais que pouquíssima fé fosse posta nesse revival (afinal, quantas obras oitentistas não foram diminuídas ao serem ressuscitadas em nossos tempos contemporâneos?), havia o atrativo irresistível de vermos Macchio e Zabka reprisando novamente seus papéis, matando a saudade dos clássicos personagens e reavivando os sentimentos que nos tomavam conta a cada reprise do filme original nas tardes chuvosas.

Dividida em dez episódios e produzida pelo YoutubeRed (uma versão paga do YouTube exclusiva para os Estados Unidos), a trama nos atualiza sobre as consequências na vida de Johnny Lawrence após perder a final do campeonato, assim como a solidificação da vida de Larusso, que se casou, constituiu família e é dono de uma concessionária bastante lucrativa. Johnny, por outro lado, trilhou pelo caminho inverso e se tornou um adulto deprimido, distante do filho delinquente e que se contenta com bicos onde reforma casas. Aproveitando brechas do filme original, Johnny decide reabrir o dojo Cobra Kai, do qual fazia parte, o que reacende sua rivalidade com Larusso.

Há um resgate deveras respeitoso por parte dos showrunners Josh Heald, Jon Hurwitz e Hayden Scholossberg em reaproveitar todos os elementos que marcaram a obra clássica, trazendo novos contornos e extensões conscientes para os conflitos que já conhecemos, ao mesmo tempo em que ambienta, gradativamente, nossa percepção da atualidade na vida dos dois rivais, cujas relações com suas famílias ganham contornos que fazem paralelos óbvios, porém justificáveis, com tudo o que marcou a história de Larusso e Johnny. O espírito do original está ali, resgatado nos emocionantes flashbacks do primeiro filme (e com direito a cenas inéditas com o senhor Miyagi!), mas a serviço de uma construção inédita sobre nomes e rostos com os quais fomos familiarizados há 30 anos.

E por mais que esta reescrita da mesma história não seja tão impactante quando imaginada na vida dos filhos de Larusso e Johnny (mas apesar disto, o desenvolvimento e estabelecimento das motivações de cada é muitíssimo bem justificada e explanada pelo roteiro), é no redescobrimento de nossos protagonistas sobre si mesmos e sobre sentimentos do passado que está a cereja do bolo de Cobra Kai. Visivelmente à vontade no retorno aos seus papéis, Macchio e Zabka seguram firme a ambiguidade que os cerca de vez, com novas ações, decisões e questionamentos sobre o passado que enriquecem tanto a narrativa quanto este novo olhar sobre os mesmos. E felizmente, os roteiristas são coeretes ao superar o didatismo fácil e evitam entregar qualquer resposta sobre tais questionamentos, deixando a reflexão moral e ética nas mãos do público. A imparcialidade aqui é mais do que bem-vinda.

O que talvez falte a Cobra Kai seja um trabalho menos estereotipado sobre os novos rostos que acrescenta, e quando os filhos de Johnny e Larusso acabam ficando inevitavelmente à sombra de suas figuras paternas, é igualmente inevitável que o ápice de seus conflitos empolguem bem menos do que quando os dois rivais originais se fazem cara a cara. Mas há muito para ser aproveitado no que Cobra Kai oferece em seu retorno, seja pela emocional e singela homenagem para Pat Morita (falecido em 2005), pelo novo chacoalhar de elementos já conhecidos e que ganham uma nova roupagem, pelas referências que também se tornam motivações, ou pelas pontas soltas absolutamente empolgantes para uma provável segunda temporada. Cobra Kai faz jus ao legado de Karatê Kid, e isto é muito mais do poderíamos esperar deste revival.

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