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Crítica | Samantha! - Primeira temporada

Samantha! chega à Netflix trazendo a terceira produção nacional da gigante do streaming, e a primeira comédia dentre elas. Apesar de não ser inovadora, a série cumpre o seu papel dentro de seus 7 episódios e se destaca das demais produções por, ao invés de parecer longa, poder convencer o espectador que, na verdade, é curta.

Emanuelle Araujo é Samantha, uma estrela infantil dos anos 80 que se destacou no grupo musical Plimplom. O interessante de sua premissa é que, apesar da série ser nitidamente uma história brasileira, ela não se prende somente ao nosso país. O público internacional pode e deve se identificar, talvez não pessoalmente, mas indiretamente, já que os programas de auditório e os grupos infantis fizeram sucesso durante a década em questão. Não só no Brasil, mas quase em todo mundo ocidental, com destaque para as Américas, principalmente a latina.

Emanuelle está nitidamente confortável ao dar vida à protagonista. Mostrando todo seu alcance humorístico sem necessariamente fazer piadas. As situações pelas quais Samantha orbita, apesar de se apoiarem na nostalgia, são atuais e, mesmo que os envolvidos não queiram apontar nomes, cada espectador terá sim um ponto próprio de referência para dizer que a personagem é inspirada em alguém que realmente existiu. Esse é o brilho da série, que consegue trazer uma história fictícia que é bastante pautada na realidade, trazendo sua espetacular verossimilhança.

É interessante ver como a série pode ser considerada um aprendizado a partir das séries nacionais da Netflix. Ao mesmo tempo que sua aproximação com a realidade não se torna ímpar graças à O Mecanismo, pode se ver que sua universalidade na discussão também é encontrada em 3%. Dessa forma, apesar de não ser uma junção dos pontos fortes de seus antecedentes, Samantha! mostra que as séries brasileiras só tendem a crescer de forma que, mesmo não se apoiando umas nas outras, trazem toda a carga de sua evolução como audiovisual.

Douglas Silva, conhecido por papéis mais dramáticos em Cidade de Deus e Cidade dos Homens, mostra também todo o seu alcance cômico, apesar deste já ter sido explorado na série homônima ao filme onde o ator interpreta Acerola. Sua química com Emanuelle é o que leva a série adiante, funcionando muito bem também com os atores mirins que interpretam os filhos do casal. Com uma boa atuação, ainda assim o núcleo mirim pode ser o único a ser considerado como uma espécie de “barriga” dentro da trama, principalmente quando este se faz sozinho, sem conversar com o núcleo adulto. Mesmo assim, “enrolação” não é uma palavra que cabe ao descrever algum aspecto de Samantha!

Contrariando a maioria das produções internacionais da Netflix, Samantha! se faz, de certa forma, curta. Apesar da história deixar ganchos para uma nova temporada, seguindo os moldes das produções originais do serviço de streaming, ela se fecha bem. Seus episódios não são longos, com duração de pouco mais de meia hora, e são apenas sete. Dentro da lógica do “binge watching”, que funcionou com excelência em séries como Stranger Things, há total coerência na aposta. Por outro lado, ao lidar com uma comédia, que apesar de ser mais contínua do que a lógica de praxe a qual estamos acostumados em, por exemplo, sitcons como Friends ou Big Bang Theory, a imersão necessária para assistir a vários episódios seguidos se faz um pouco falha, já que seus episódios se mostram mais independentes.

Assim, sete episódios de uma duração que pode ser considerada curta se tornam pouco para o que a série, que em uma época onde mesmo as séries mais curtas podem se tornar demasiadamente longas, cumpre sua missão de deixar um gostinho de “quero mais”, sem precisar se apoiar em um grande gancho ou mistério para impulsionar uma nova temporada, tendo as peripécias de seus personagens como força suficiente para cativar o público.

Personagens como o de Daniel Furlan, Lorena Comparato, Paulo Tiefenthaler e Rodrigo Pandolfo abrilhantam o tom cômico da série e, mesmo estando voltados completamente para o humor, se mostram realistas. Apesar de nem todos serem recorrentes, estes nunca passam do ponto em questão de tempo de tela. São eles que são responsáveis pela maioria das piadas que cobrem o absurdo, de forma verossímil, quebrando um pouco o humor de Emanuelle e Douglas, que fica mais nas situações do que, necessariamente, em uma “punch line”.

Assim, Samantha! se mostra uma comédia completa nos mais diversos quesitos, trazendo uma das melhoras comédias já produzidas pela Netflix e que deve conversar bastante com o público brasileiro, trazendo um humor nitidamente nacional. Um grande exemplo disso é o personagem Zé Cigarrinho, vivido por Ary França, que é uma espécie de alusão ao que pode ser considerada uma falta de cuidado da década de 80 com o politicamente correto, mostrando um personagem infantil que, atualmente, jamais passaria pelo crivo da televisão.

Tecnicamente, a série só tem dois momentos destacáveis. O uso de uma câmera diferente das demais nos episódios centrados nas personagens de Lorena e Paulo, mostrando com Lorena filmagens baseadas em redes sociais, e com Paulo uma brincadeira com a moda “mockumentary”, trazendo um pseudodocumentário. Mesmo assim, nesses quesitos a série não traz nada de realmente inovador.

Tudo isso somado faz com que Samantha! não seja só uma série cômica qualquer, mas uma que usa do humor para fazer a sua mais magna função, a crítica. Crítica esta que, não só se estende nos anos 80, mas também chega nos dias de hoje, traçando um interessante caminho de um para o outro.

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