Críticas

Crítica | Ben-Hur

O épico Ben-Hur é, com certeza, um dos símbolos máximos do cinema clássico americano. A prova máxima da grandiosidade dos estúdios, Hollywood podia recriar o passado em pleno Oeste Americano, com milhares de figurantes, com cenários gigantescos, com os melhores técnicos e diretores da época. Essa era a receita de uma época de ouro do cinema dos EUA. Mas os tempos mudaram.

Assim como o longa clássico dirigido por William Wyler nos anos 50, o Ben-Hur de Timur Bekmambetov também traz a grandiosidade em cada plano, em cada locação e no retorno aos efeitos práticos. No entanto, há o desejo pela renovação, uma maneira de afirmar que aquela história é universal e atemporal, a atualização poderia chamar mais atenção e visar à popularidade de um épico, gênero que vez ou outra volta a estampar os cartazes do cinema, mas que está longe de ser uma unanimidade.

O caminho para trazer um Ben-Hur mais atual logo está na utilização de uma linguagem que julga ser a contemporânea, com a usual montagem frenética assim como a câmera sempre empunhada na mão até mesmo nos momentos de mais calmaria, o moderno de Bekmambetov está muito mais na assimilação de uma estética quase videoclíptica do que em qualquer outra coisa. E nem sempre essa linguagem é a ideal para comunicar-se com esta geração.

Ben-Hur remonta o período cristão em Jerusalém, quando Roma conquistava praticamente todo mundo o mundo conhecido, mas emergia naquela região uma figura ainda mais importante que desafiava aquele império muito mais por sua filosofia do que por força política: Jesus Cristo. Diante dessa conjuntura é narrada a história dos irmãos postiços, o judeu Ben-Hur e o descendente romano, Messala, a trajetória e a descendência de ambos faz com que eles substituem o amor fraternal por traições, ódio e vingança.

Assim, a força de Ben-Hur está justamente nesse envolvimento entre essas duas figuras masculinas, que se inserem num espiral sem fim de violência e intolerância. É a busca de Messala por ferir seu meio irmão e o retorno de Ben-Hur para acertar as coisas, diante desse intenso conflito há no meio de tudo isso a figura de Jesus Cristo.

E é justamente aí que reside o maior acerto do filme, interpretado por Rodrigo Santoro; Jesus é pintado como se fosse um homem do povo, realmente no meio dos oprimidos, dos leprosos e dos comuns, sem as costumeiras e grandiosas vestimentas tingidas de azul Royal e vermelho intenso, pigmentos da elite da época. O Jesus desse Ben-Hur é um homem comum que faz sua mensagem ser ainda mais forte e é somente nesses momentos que o diretor parece abdicar de seu estilo frenético, Jesus traz uma calmaria boa para o ritmo do filme. Infelizmente, Bekmambetov não acerta a dose entre as valorosas passagens com Cristo e o espiral de violência da trama dos irmãos, parece sempre haver uma dissonância entres esses núcleos, é difícil perceber que os sermões de Jesus realmente inspirem o protagonista, sempre cego pela vingança. Como se houvesse dois filmes em Ben-Hur um de ação e outro de cunho religioso.

Naqueles tempos, Roma era a dominação, regada a muito pão e principalmente circo; Israel uma cidade oprimida com uma população clamando pela libertação e uma nobreza omissa às forças do império; e Jesus que traz a esperança em forma de redenção, perdão e amor. Bekmambetov, que é um diretor de filmes de ação ,leva seu filme ao catártico final que se concentra no reencontro entre os irmãos, na arena construída pelos romanos, na corrida de bigas. O confronto final é bem orquestrado, bem filmado, visceral e frenético, o clímax de Ben-Hur é intenso, mesclando efeitos práticos com digitais é uma sequência extremamente envolvente, sendo concluído com um final catártico, com a arena vibrando assim como os espectadores, parece que os créditos vão subir, mas aquela não é a mensagem que o filme quer passar.

No auge de seu estilo, Bekmambetov oferece o circo, mas quer encontrar corpo e sangue de Cristo, depois de longos minutos na arena é realmente difícil se voltar para o perdão, a mudança de Ben-Hur após ver Jesus crucificados parece quase jogados na tela, como se corresse para finalizar o longa em duas horas. Parece que seria necessário mais uma hora de filme para que realmente notasse esse segundo arco do protagonista, a revelação de Ben-Hur não é vista pelo público, ela simplesmente acontece enquanto o espectador ainda está cegado pelo circo romano que é a corrida de bigas. Ben-Hur quer encontrar a redenção, o milagre, mas parece muito mais maravilhado pela herança romana que são aquelas arenas.

Ben-Hur é um filme que tropeça nas suas próprias pretensões. Um longa que quer o perdão, que visa a tolerância, que busca a redenção, mas que entende que a linguagem contemporânea pede o circo e é isso que Bekmambetov realiza, com muita eficiência. No entanto, é difícil entender a transcendência de Ben-Hur, sendo um filme que fica muito mais nas sensações etéreas provocadas pela pulsante corrida de bigas, do que um longa que busque, em alguma transcendência representada por Cristo, sentimentos mais divinos.

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