Críticas

Crítica | Meu Amigo, o Dragão

Meu Amigo o Dragão inicia-se com o garotinho Pete perguntando o que significa aventura para os seus pais durante uma viagem de carro. Depois daquele momento, Pete sofre um acidente com sua família e é adotado por um dragão que vive no meio de uma floresta. Aquilo será uma aventura, e é exatamente sobre isso que o filme se trata. Não aqui fazendo uma revelação a respeito do gênero da obra, mas constatando que Meu Amigo o Dragão evoca um sentimento provocado por filmes que tem o seu tom baseado na leveza de suas ações e nos rumos fantasiosos de seus fatos.

O longa, então, acompanha a vida desse garoto que, depois de seis anos vivendo com seu fiel companheiro, será devolvido a sociedade numa pequena cidade americana, que em suas canções folk mantinham viva a lenda do animal alado que habitava aquela floresta. No melhor estilo filme infanto-juvenil, Meu Amigo o Dragão abordo dois grupos distintos de personagens: um apenas interessados em caçar aquele dragão e o outro que vê com brilho nos olhos a relação entre garoto e animal.

E o mais interessante é notar como o diretor David Lowery, do pouco visto Amor Fora da Lei (2013), conta essa história, adotando um ritmo bastante cadenciado para um pretenso blockbuster. Meu Amigo o Dragão vai na contramão dos filmes contemporâneos com ritmo acelerado, recheados de efeitos visuais e uma grande quantidade de explosão. O longa da Disney é narrado como se de fato fosse um folk à americana, um longa que oferece a oportunidade do espectador de se deliciar com a trama, com os personagens e com aquele mundo fantástico que se propõe a construir. Mas o mais importante é que Meu Amigo o Dragão consegue resgatar um espírito quase perdido, uma sensação de aventura única e ao mesmo tempo em que é fantástica parece que só poderia acontecer ali, quase como um fato cotidiano.

O longa não é uma pretensa franquia que se esforça para deixar pontas abertas para uma continuação; nem, muito menos, um filme que busca impressionar a todo instante seu público, mas que entende perfeitamente seu tamanho. Meu Amigo o Dragão muitas vezes parece um filme de outra época lançado em 2016, sendo uma obra que sabe se comunicar com seu público alvo, tendo uma história infantil e lembrando a atmosfera de longas como História Sem Fim, E.T. – O Extraterrestre e O Gigante de Ferro.

Assim, o filme consegue realizar momentos inspirados como a sequência em que Pete foge do hospital e praticamente a cidade o persegue, num instante totalmente não realista, mas verossímil para aquela trama, um garoto de apenas nove anos consegue despistar todos, utilizando mil e uma artimanhas. O longa entende justamente aí que a fantasia e a aventura não estão apenas nos grandes acontecimentos e nos efeitos especiais, mas sim na construção de um momento que foge do real mesmo que isso esteja na corrida de um garoto. Por isso, Meu Amigo o Dragão é tão diferente de todos os outros grandes lançamentos.

E nesse resgate a um espírito de aventura, Meu Amigo o Dragão também é capaz de reencontrar a sensibilidade, não tem medo de apostar num afeto que está sempre presente. O filme é também sobre esse reencontro familiar, e o Dragão uma espécie de tutor para aquela criança, protegendo-o de baixo de suas asas. Grace vê no garoto também a possibilidade de suturar o longínquo trauma da perda de sua mãe e assim resolver os dilemas com seu próprio pai, o velho contador de história de dragões. E se essa onipresença da questão familiar pode parecer piegas, na verdade confere ao filme uma condição quase mítica. Meu o Amigo Dragão é quase um mito sobre a adoção, sobre ser a peça restante de um quebra-cabeça familiar que parece não montar, mas essa trama só pode ser concluída quando o próprio Pete retribuir a segurança que seu dragão lhe deu, e até mesmo encontrar um novo lar para aquele seu amigo.

Meu Amigo o Dragão revela toda inocência seja no seu clima despretensioso de aventura quanto na sua moral da história. Se esse clima infantil só beneficia a atmosfera fílmica, nota-se também uma infantilidade na construção de seus personagens, produzindo figuras que representam um lado moral da história. Há os lenhadores malvados prontos para mais uma caçada e a família consciente da guarda florestal, o que por um lado facilita a compreensão da mensagem que o filme quer passar, mas oferece poucos recursos para aquelas figuras. Com issom chega a ser difícil criar uma empatia; por exemplo, a Grace, feita por Bryce Dallas Howard, uma vez que esbanja tanta doçura e compreensão que chega a ser pouco crível, e com essas limitações a atriz não consegue oferecer um grande desempenho, não se sente uma mudança na persona daquela figura e Bryce fica monocromática ao longo de toda a projeção.

Na sua pretensão de ser uma obra totalmente infanto-juvenil, o longa da Disney quase cai na sua tentativa de tornar tudo compreensível demais. Falta um pouco de nuance nesses núcleos que são bons ou maus, parece não haver um meio termo nos habitantes daquela cidade ao longo da trama. Se nessa esfera maior o filme não consegue criar uma complexidade interessante e necessária, é difícil não se encantar quando a câmera Lowery está centrada em Pete e em suas desventuras, ou mesmo no centro dos núcleos familiares do filme, seja no garoto com sua antiga família, com seu dragão ou em seu pretenso novo lar. Meu Amigo o Dragão prende e conquista pela aventura inocente e pela sensibilidade.

O filme da Disney muitas vezes parece ser um longa de outro tempo, que contém a atmosfera e a estrutura daquelas antigas obras juvenis, que não tem medo de ser sensível, que assume sua inocência e com isso consegue criar um mundo fantástico. Ensina o que de fato é uma aventura.

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