Críticas

40ª Mostra de SP | Crítica: Pitanga

O documentário Pitanga, de Beto Brant e Camila Pitanga, começa com uma reencenação de uma cena de Barramento, filme de debute de Glauber Rocha. Logo, a filmagem com Antonio Pitanga, no auge de seus 77 anos, se mescla com a sagacidade do ator em 1962, passado e presente se misturam, eternizando ecos de um filme e de um ator seminal para a história do cinema brasileiro.

Pitanga é justamente uma forma de gravar essas vozes do passado, para que possam escutadas frequentemente. Após aquela sequência Inicial, o documentário mostra uma série de encontros entre Antonio Pitanga, amigos e familiares, comentando sobre amores, política, vida e artes. O filme mescla esses diálogos com trechos de filmes que o icônico ator participou, dialogando com uma espécie de cinema ensaístico em que as vozes estimulam as imagens do passado a aparecerem na tela.

Pitanga, dessa maneira, é um filme evocativo, longa que através das palavras faz com que surjam imagens de um passado a ser resgatado. Como não se lembrar das vozes que já não podem aparecer naquele filme? Como não se lembrar de Glauber Rocha, por exemplo? Que em vários momentos é evocado, seja pelos filmes que aprecem, seja pelos depoimentos que o citam, trazendo a tona a força e o ímpeto de um dos maiores nomes do cinema nacional. Poder este explicitado pela citação de Deus e Diabo na Terra do Sol que aparece em Pitanga: “mais fortes são os poderes do povo”. Frase que ecoa toda uma história do cinema, que evoca os espíritos cinema-novistas, até hoje presentes na construção audiovisual brasileira.

É por isso que o documentário de Brant e Camila Pitanga pode ser considerado uma introdução à história do cinema nacional. Um daqueles filmes para anotar todos os longas citados e assistir em casa mais tarde. Além disso, para entender o que cineastas e artistas queriam dizer naquele e longínquo anos 1960 e 1970, que parecem tão distantes mas na verdade estão muito próximos de 2016.

Assim, Pitanga não é um filme apenas para entender a importância de seu homenageado ou do cinema nacional. Mas sim para compreender o espírito de uma época, um espírito que ainda reside no corpo daquele jovem com mais de 70 anos.

As conversas que mostram Cacá Diegues, Walter Lima Jr., Caetano Veloso, Chico Buarque entre outros demonstra como a cena cultural brasileira era extremamente integrada. Cantores, dramaturgos, cineastas e atores partilhavam um mesmo modo de se fazer arte, uma mesma forma de pensar e uma mesma maneira de ver o mundo. É engraçado como isso surge de forma extremamente espontânea, as lembranças dos amores juvenis se misturam com falas sobre a política da época, sobre a luta pelos direitos raciais e sobre sexo, tudo naquele banho de memórias.

Dessa forma, essa voz do passado que Antonio Pitanga representa deve ser ouvida hoje. Pitanga é homem forte que não tem medo de falar de religião, de segregação, de política e de paixão. Que através da xinga de um exímio capoeirista esquiva-se e entra em qualquer assunto em qualquer fala. Homem que carrega consigo a história de todo um país e por isso pode evocar tantas coisas

Esse documentário é para enraizar as sementes de Pitanga. Um filme para emoldurar uma voz que deve ecoar e ser evocada por muito tempo.

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