Críticas

Crítica | Velozes e Furiosos 8

Em 2003, na estreia de +Velozes e +Furiosos, quando começava o ensaio do início de uma nova franquia cinematográfica, as corridas de carro ainda eram o grande atrativo do filme. Embora espetaculares havia uma busca pelo realismo dos rachas de ruas, o dilema entre o perigo e adrenalina, a estrutura de filme policial e etc. Na sequência inicial daquele filme, o protagonista está em mais uma corrida, num momento chave, um dos competidores aciona o levantamento de uma ponte, o herói, com destreza, ativa o nitro de seu carro no momento certo, não só conseguindo pular a ponte como também fazendo uma ultrapassagem no ar, um momento extremamente espetacular dentro do realismo de +Velozes e +Furiosos.

Quatorze anos e seis filmes depois, o salto de Bryan parece brincadeira de criança. Já faz algum tempo que o estilo de Velozes e Furiosos mudou, abandonando seu realismo para virar um espetáculo pirotécnico com famosos e turbinados carros. A sequência inicial desse oitavo episódio é bastante significativa nesse sentido. Toretto (Vin Diesel) e Letty (Michelle Rodriguez) estão em Cuba de férias e um valentão do lugar mexe com um primo distante do protagonista, Toretto desafia o homem para uma corrida. Pensar que aquilo significa em um retorno às origens da franquia é um equívoco, aqui só está sendo construída a constatação que Velozes e Furiosos habita um novo universo, regido por suas próprias leis. Para se ter uma noção o racha apostado em Havana termina com o carro do protagonista explodindo, mas isso é utilizado por Toretto como impulso para vencer a corrida.

Num mundo totalmente improvável, Velozes e Furiosos 8 é um filme de absurdos e sabe disso. Os 136 minutos de projeção são um acúmulo de momentos que tentam ser mais impressionantes e mirabolantes que o anterior. Essa, aliás, é a lógica da franquia, em que o objetivo de cada título é superar os absurdos do longa passado. Em Velozes e Furiosos 8 isso provavelmente chega a seu ápice. Ter esse propósito alcançado não significa, necessariamente, chegar a alguma qualidade. O filme, como muito foi vendido, traz a história desse protagonista voltando-se contra o seu grupo de amigos, a família como ele mesmo chama. Fato é que essa traição ocorre através de uma chantagem feita por Cipher (Charlize Theron), nova vilã da franquia, que obriga Toretto a trabalhar para ela, utilizando-se de um motivo muito digno que, acertadamente, vai sendo revelado aos poucos.

O longa, então, coloca frente a frente, Toretto, trabalhando para o inimigo, e seus companheiros, que precisam frear os planos de Cipher além dee entender o motivo da revolta daquele antigo aliado. Velozes e Furiosos 8 tenta aliar o seu pretenso absurdo narrativo com um debate a respeito da relação daquela família. Fato é que as opções contidas nesse primeiro objetivo afetam diretamente este segundo.

Em Velozes e Furiosos 8, Cipher é uma típica vilã de filmes escrachados de espionagem, ela vive num avião que contém um enorme satélite embutido no veículo, recheado de aparatos tecnológicos, além de incríveis cômodos de luxo. A motivação da antagonista é o genérico dominar o mundo, buscando códigos de um antigo programa nuclear soviético e tudo que a personagem basicamente faz é apertar um botão de dentro de seu avião e dar uma ordem através de alguma frase feita. Toretto segue os mesmos padrões, um personagem que parece indestrutível, que não erra um tiro, ou uma manobra, fazendo com que seu carro pareça uma simples miniatura de plástico.

O mesmo ocorre com os demais personagens, há em Velozes e Furiosos 8 a criação de um mundo próprio que nada chega a ser muito crível, tudo parece extremamente afeito à narrativa que está sendo construída. Os membros da família são recrutados pelo Sr. Ninguém e essa figura tem acesso a absolutamente tudo, as armas, os carros e as informações da trama, ele basicamente dá a chave de todos os problemas para o grupo, não oferecendo nenhuma dificuldade narrativa aos personagens, os únicos obstáculos são realmente uma série de perseguições, tiroteios e alguns grandes saltos automobilísticos. Diante dessa inverossimilhança narrativa, Velozes e Furiosos 8 aposta num recurso muito comum dos blockbusters atuais, a criação de momentos e/ou personagens que estão ali apenas para soltarem tiradas cômicas, conceder um humor à trama, deixando o longa, como um todo, num tom de brincadeira, que nunca chega realmente a seriedade.

Isso é uma opção, não significando ser ruim ou bom por este fato, a questão é que no meio desse panorama Velozes e Furiosos 8 tenta discutir a relação entre a família vista nos outros filmes frente a revolta de Toretto. Todavia, é difícil levar algo a sério de um filme que nunca propõe tal sobriedade. Parece que nada atinge os personagens de Velozes e Furiosos 8 (aqui não se referindo apenas a parte física), tudo que ocorre nas mais de duas horas de longa não muda o modo com aquelas figuras encaram seu mundo – mesmo que este seja baseado no exagero. Não há seriedade, ou alguma discussão num longa que após a morte de um personagem constrói uma cena em que todos personagens fazem piada, não demonstrando nenhuma força no que acabou de ser visto. Numa franquia em que nem os carros parecem ter peso, uma traição não significa absolutamente nada, nem para personagens muito menso para espectadores.

É fato que nesse processo de embate entre os absurdos narrativos e a impossibilidade da seriedade até quando ela é desejada, há um outro fator fundamental, a incapacidade de Vin Diesel e do elenco principal na atuação, nenhum deles demonstra essa dúvida, essa desconfiança ou alguma alteração em relação à mudança de Toretto, assim como esse personagem transmite muito mal suas reações diante dos atos que é obrigado a fazer.

Depois de quatorze anos de franquia o que ainda funciona em Velozes e Furiosos são as longas sequências de carro, os melhores momentos do filme são duas perseguições, a melhor nas ruas de Nova Iorque e a única que coloca a família frente a frente a Toretto. Se as cenas de ação física são uma confusão frenética, as automobilísticas são os poucos momentos que o diretor F. Gary Gray consegue deixar seu público tenso, preso na cadeira como se estivesse no volante de algum daqueles carros. A cada plano, a cana corte, a cada enquadramento um carro parece mais próximo do outro, alcançando a emoção que tanto promete.

Velozes e Furiosos 8 tornou-se uma franquia que tenta surpreender cada vez mais através de seus absurdos, mas são os únicos momentos que remetem ao início da franquia que realmente geram alguma tensão em seu público. O exagero acrobático de Velozes e Furiosos 8 faz com que muito pouco daquele universo seja crível, ou que contenha alguma importância real para quem assiste, no final das contas só os carros salvam o filme.

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