Críticas

Crítica | O Estado das Coisas

O Estado das Coisas é um título interessante para o longa protagonizado por Ben Stiller, como se de alguma forma afirmasse qual é o sentimento de geral de uma geração inteira. Nesse caso, de um homens em torno dos 30/40 anos que hoje se vê na mesma monotonia que não desejava anos atrás. O Estado das Coisas é um longa sobre a crise de idade, uma reflexão acerca daquilo que foi conquistado ao longo de uma vida inteira.

Stiller interpreta Brad Sloan, um homem beirando os 50 anos que deve levar seu filho a uma série de entrevistas para ingressar nas mais importantes universidades do país. Esse fato faz com que o protagonista revisite sua trajetória desde seus anos gloriosos de faculdade, comparando o que conquistou até aquele momento da sua vida e o que ele sabia a respeito de seus companheiros de classe. Um é comentarista político na televisão, frequenta a Casa Branca e tem uma série de livros famosos; o outro vendeu seu próprio fundo de investimento e tem até jatinho particular; um amigo vendeu sua empresa de sucesso, aposentou-se aos 40 e agora vive numa ilha paradisíaca; e para terminar teve até um que se tornou um figurão de Hollywood. O espectador ouve em uma narração de Brad comentando as decisões que tomou na vida, enquanto acompanha aquele importante fato na vida de seu filho.

O Estado das Coisas ganha contornos tragicômicos, com um humor que surge desse sentimento bastante profundo em relação ao andamento da própria vida e seus percursos. Esse lado cômico surge realmente da relação do protagonista com seu próprio eu, numa espécie de autocomiseração, um sentimento quase repugnante em relação a sua própria vida. Dessa forma, o longa consegue questionar o seu espectador, provocando essa análise sobre uma geração, enquanto exagera em seu retrato, provocando riso e realizando um retrato um tanto quanto irônico dessa situação, dessa crise de meia idade.

O mais interessante é realmente esse panorama geracional, que no título original fica como Brad’s Status (O Estado de Brad), mas que a tradução em português, apesar de confundir com o filme de Wim Wenders, entende que o longa deseja de falar de um sentimento extremamente presente. Tão presente que O Estado das Coisas está longe de ser o único título sobre o assunto no ano. Essa resistência do passado para uma geração em que o sucesso era garantido surge com força nas mais variadas obras, uma sombra recheado de um perigo nostálgico, em que as lembranças são mais gloriosas e animadoras do que qualquer promessa do presente.

A epifania trazida pelas entrevistas do filho faz com que se crie um espaço de conflito entre o passado e presente. Um confronto interno que está totalmente ligado ao cenário do campus universitário, dos bares lotados de gente jovem com planos e ambição, aquilo que Brad deixou para trás e deseja retomar de alguma forma. Nesse ponto, o protagonista faz com que seus conflitos internos conectem-se com os conflitos externos, os objetivos do filho passam a ser a missão de Brad, como se aquela derrota ele não pudesse aceitar. A viagem até Harvard é um marco para as duas gerações presentes no filme, a última chance de Brad sentir-se útil e a grande oportunidade daquele garoto. Algo que afasta e aproxima Brad de seus mais íntimos pesadelos.

Essa relação entre pai e filho, assim como as pazes entre passado e presente fazem com que O Estado das Coisas realmente compreenda os passos de uma geração que perde o seu antigo posto, com uma ilusão de que não se tem mais o direito de almejar sonhos, ou ter o mundo a sua disposição, e que isso agora passa ser função de novos garotos, assim como o filho de Brad. Por outro lado, o que se vê em O Estado das Coisas é uma repetição de alguns clichês, desse homem de mau humor com o mundo e com o que ele apresenta, assim como o roteiro escrito por Mike White (também diretor do longa) que sempre leva essa desilusão para o campo sexual e uma possível não satisfação entre Brad e sua esposa, como se sucesso estivesse ligado a ficar com jovens mulheres com o padrão de beleza em dia.

Esses clichês se materializam também na forma do filme, onde White reproduz o modismo do cinema indie mais recente e também o mais fraco, a câmera da mão fluída que às vezes reproduz ruídos na imagem sem que isso tenha alguma necessidade. Algo que dá uma sensação de simples cópia, buscando um despojamento que daria uma cara sincera para aquela narrativa. Pretensão esta que entra em choque com a atuação de Ben Stiller que refaz o seu clichê, que refaz essa persona do homem de meia idade em crise, já estando nesse papel em algumas situações. Stiller nunca consegue chegar a esse estado de sinceridade, sendo só uma reprodução.

O Estado das Coisas pode não ser uma análise definitiva desse sentimento tão característico de uma geração que envelhece. Todavia, aos trancos e barrancos, o longa de White faz um retrato interessante, mostrando realmente que o estado daquele personagem afeta muito mais do que só aquele homem inscrevendo seu filho em universidades.

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