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Crítica – 007 – Sem Tempo para Morrer

Longa final de Daniel Craig no papel do famoso agente britânico aposta mais na emoção do que na ação

Muito se questionava se o personagem e os filmes de James Bond ainda tinham algo relevante a dizer no atual século. Alguns diziam que filmes do agente 007 era só mudança de cenário, vilões extravagantes, além de algumas sequências de ação memoráveis. Nada mais.

Bom, se alguns achavam isso, certamente, tiveram que observar tais convicções serem anuladas por um fenomenal Daniel Craig, sexto ator a interpretar o icônico agente britânico.

Daniel Craig foi o intérprete do famoso agente secreto que mais se diferenciou de seus colegas. Logo na estreia, o ótimo Cassino Royale (2006) já deixava isso muito claro!

Passando da metade do filme, tivemos a cena que transformou completamente a figura de James Bond para todo o sempre. Vesper Lynd (Eva Green) encontrava-se debaixo do chuveiro ainda vestida de um belo traje, traumatizada por alguns eventos que ocorreram pouco antes. James olha Vesper toda fragilizada, e junta-se a ela no banho, também completamente vestido. Abraça-a e “limpa” seus dedos usando a boca.

Pela primeira vez, James Bond se importava verdadeiramente com alguém. Esta é a maior herança e legado de Daniel Craig como o assassino apreciador de um bom Dry Martini. Através do ator inglês de 53 anos de idade, iniciava-se um processo de humanização da personagem, que terminou agora com o empreendimento derradeiro de Craig como o agente 007.

Em 007: Sem Tempo para Morrer, James Bond deixou o serviço ativo e está desfrutando de uma vida tranquila na Jamaica. Sua paz durou pouco, porque seu velho amigo Felix Leiter (Jeffrey Wright) da CIA, apareceu pedindo sua ajuda. A missão de resgatar um cientista sequestrado acaba sendo muito mais traiçoeira do que o esperado, levando Bond na trilha de um vilão misterioso e armado com uma nova tecnologia perigosa.

O roteiro que não desce redondo

Dentre os cinco filmes estrelados por Daniel Craig, não é nenhum segredo para os fãs, ou mídia especializada que seu longa de estreia Cassino Royale, junto do surpreendente Operação Skyfall (2012), sejam os grandes destaques.

A obra de 2012 tornou-se o maior sucesso de bilheteria da franquia, engavetando pouco mais de um bilhão de dólares. Tamanho sucesso, fez com que o talentoso cineasta Sam Mendes retornasse para dirigir uma segunda parte. Veio 007 Contra Spectre (2015), uma produção abaixo da média se comparada aos filmes antecessores com Craig.

Um dos grandes equívocos do projeto anterior foi tentar aplicar um épico de enorme escala, mas falhando em estabelecer as ligações emocionais de um modo minimamente convincente, além de uma dinâmica na estrutura que não permitia um melhor proveito da obra como exemplo do gênero ação.

Infelizmente, nos seus momentos de baixa, Sem Tempo para Morrer lembra a produção lançada em 2015. Uma vez que, também temos um filme de dinâmica cambaleante. Às vezes, um tanto espaçada, deixando o enredo dramático tomar a dianteira, abdicando da ação, naturalmente, distanciando o espectador de usufruir uma narrativa que sabe entreter, enquanto te mantém refém das emoções lesadas de James Bond.

Bond e as novas mulheres

Agora, quando 007: Sem Tempo para Morrer acerta no alvo, merece os cumprimentos. No quesito que corresponde à leveza do teor cômico, que nesta obra dirigida por Cary Joji Fukunaga, ganhou um pouco mais de espaço que no filme anterior, sabemos exatamente quem cumprimentar: Phoebe Waller-Bridge.

A atriz, escritora, comediante e produtora, mundialmente reconhecida como a criadora da divertidíssima série comédia dramática Fleabag, além da chocante Killing Eve, foi contratada por indicação de Daniel Craig para fazer parte da equipe de roteiristas.

Assistindo, percebe-se exatamente os momentos onde conseguimos ver o dedo dela no texto. Neste mais recente filme de James Bond teremos um clima um pouco mais soltinho nos comentários irônicos, ou tiradas inesperadas que saem da boca de alguns personagens. Quem mais se beneficiou desta contribuição de Waller-Bridge foram o protagonista, e a nova agente 00 à serviço da Coroa, interpretada por Lashana Lynch.

Outro acerto que cai na conta de Daniel Craig, é que durante a sua era como o agente James Bond, mudou-se a visão do que eram as chamadas ‘Bond Girls’. Desde Cassino Royale, as personagens femininas ganharam maior complexidade, trazendo novas camadas que ajudaram a definir o novo rumo que estava sendo tomado nesses tempos. Tudo isso, só adicionou uma maior dose de entretenimento dentro da franquia.

Até a Dama Judi Dench, que fazia o papel da chefona M antes de Ralph Fiennes assumir a cadeira, foi promovida à Bond Girl em Operação Skyfall, vejam só!

Diferença entre vilão e uma ameaça

Lembram-se quando o Coringa de Heath Ledger em Batman – O Cavaleiros das Trevas (2008) de Christopher Nolan, tomava um sacode do herói da capa preta, mas nunca perdia o riso enquanto zombava dele por não ter nada, só músculos para tentar conseguir o que queria? Ou, quando Khan (Benedict Cumberbatch) desafiou a filosofia de Spock (Zachary Quinto) em Além da Escuridão – Star Trek (2013)?

Estes não são exemplos de vilões, mas verdadeiras ameaças. Capazes de instalar medo nos heróis que se pegam questionando quem são ou o que podem fazer para impedir as ações de alguém que se apresenta tão incontrolável e imprevisível.

Agora, na maioria dos casos, lamentavelmente, encontramos apenas vilões, que se resumem em uma forma caricatural oposta ao protagonista, sem nunca chegar perto de intimidar os paladinos da justiça em nenhum momento.

E, é exatamente isso o que foi Rami Malek em 007: Sem Tempo para Morrer, repetindo o trabalho questionável de Christoph Waltz no longa anterior, e continuado aqui.

Assim, como outros exemplos da carreira de Malek, notamos uma inclinação para a caricatura, daquelas que apresentam uma nota só. Isso acaba jogando contra quando pensamos no tipo de jornada que filmes do James Bond contam para o público.

O adeus de Craig

Existem duas maneiras claras de assistirmos Sem Tempo para Morrer: a primeira, é pensarmos nesta produção como um objeto único, a ser analisado pelo o que este propõe e entrega ao espectador; já, a segunda, ser visto como o capítulo final de uma era diferenciada quando falamos de uma das franquias mais bem-sucedidas da história do cinema.

Se vermos com os olhos da primeira proposta, certamente, teremos um resultado um pouco mais frustrante, mostrando-se abaixo da média desejada; agora, visto pelo segundo conceito, teremos uma obra carregada de emoção que, sim, admite o tom de despedida do ator Daniel Craig.

É possível estabelecer um paralelo muito claro entre o que passa James Bond neste momento derradeiro, e o que aconteceu em Logan (2017) com o personagem-título. Dois homens que ergueram uma muralha interna, para se proteger de quaisquer dores e sofrimento possa haver lá fora. Contudo, ao se trancarem atrás das paredes, lidam com o pior inimigo que conheceram na vida: eles próprios.

Isto é o que os torna tão urgentes!

Muito habitual dos fãs da série, selecionar seu Bond favorito, ou indicar alguns superlativos que indiquem as características mais marcantes de cada uma das versões do agente. Por exemplo: Sir Sean Connery era o James Bond mais elegante e perigoso, ou Sir Roger Moore era o mais charmoso e canastrão.

Bom, deve-se dizer que Craig roubou o adjetivo ‘perigoso’ de Connery com menos de cinco minutos em Cassino Royale.

Todavia, talvez, a melhor maneira de definir o legado de Craig como James Bond, seja fazendo um trocadilho com o filme lançado em 1977: Daniel Craig é o espião que amava!

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