Críticas

Crítica | Dupla Explosiva

Só pelo nome e pelos cartazes, Dupla Explosiva já remete a uma centena de outros filmes. Estamos falando das famosas duplas de filme policiais e as suas missões impossíveis, de personagens que devem relevar suas diferenças para cumprirem suas missões, que sempre parecem estar mais perto do exagerado do que realmente de um perigo próximo ao real.

Dupla Explosiva utiliza toda essa configuração para realização do filme, numa consciência dos códigos e clichês do gênero de ação. Assim, nesse amontoado de fatos, falas e ações já vistas em tantas outras obras, Dupla Explosiva passa a ser um comentário bem humorado sobre esse tipo de filme, onde praticamente todas as cenas são uma sátira propositalmente exagerada dos códigos desse gênero. No longa tudo deixa evidente sua construção cênica, o que se vê é um mundo falso, que chama atenção para luzes artificiais, para o uso extremado dos efeitos especiais e principalmente por um jeito canastrão de ser.

Por um lado, Dupla Explosiva mostra saber muito bem os passos que dá. Os realizadores, Patrick Hughes responsável pela direção e Tom O’Connor o roteirista, fazem com que o longa nunca pense em realizar momentos que deixem sua narrativa se levar a sério, o que faz com que o filme alcance um patamar diferente de pretensos Blockbusters como o novo Triplo X. Nessa auto ironia constante e uma total devoção aos títulos de ação, o longa contém diversas sequências onde a empolgação toma conta do filme, como se pegasse os clichês dos filmes de ação e tentasse elevá-los a uma oitava acima nessa sinfonia cheia de tiros e explosões. É de se pensar se algum outro filme possui tantas balas por segundo quanto Dupla Explosiva.

Assim, os personagens e situações do longa são pautados por essa construção baseadas em figuras pré-estabelecidas pelos clichês de um gênero. Algo que oscila entre a subversão desses códigos já vistos e de uma constante repetição de estereótipos. O longa possui alguns personagens centrais, a trama realmente pouco importa, e o filme gira em torno dessas figuras que surgem como bonecos criados a partir de tantos outros filmes. Os principais são Michael Bryce (Ryan Reynolds), um guarda-costas conhecido pelo seu trabalho impecável, até que um dia um de seus clientes morre de forma incongruente; Darius Kincaild (Samuel L. Jackson), um matador de aluguel famoso e implacável, responsável por algumas baixas na carreira de Bryce. Agora é a vez de o guarda-costas proteger o assassino, uma vez que este pode colocar na prisão um líder de estado responsável por um cruel genocídio em algum país do leste da Europa.

O longa contém outras figuras que seguem a mesma lógica, como a esposa de Kincaild, Sonia (Salma Hayek), uma presidiária com raiva descontrolada, que ajuda seu marido mesmo na prisão, além de ser garçonete de um bar no México, onde nos seus serviços estavam ter que lutar até a morte com alguns clientes. E também, Amelia Roussell (Elodie Yung), uma agente que quer mostrar seu valor junto à corporação, desviando da má conduta e histórico de corrupção de seus companheiros, que faz de tudo para que Kincaild chegue vivo a sua delação. Nessas simples descrições é notável essa questão efetiva dos estereótipos, algo acentuado e utilizado por todo o filme, como se o real, o coerente e o verossímil não fossem questões dentro desse título.

Evidentemente que dramaticamente essas figuras pré-estabelecidas geram pouca empatia, é difícil compactuar com a história de cada um desses seres, por isso o que resta a Dupla Explosiva é justamente esses momentos onde o clichê é utilizado de maneira subversiva, sobretudo numa chave cômica. O longa torna-se uma espécie de grande sátira de filmes do gênero ação, e nesse quesito se sai bem, realizando momentos capazes de divertir. Por exemplo, quando Kincaild diverte um grupo de freiras numa van.

Se isso pode divertir, também nunca é capaz de fazer com que Dupla Explosiva se sustente. O filme é baseado também nas performances que seus astros já realizaram no passado, replicando uma auto figuração. O que já acontece há muito tempo com Samuel L. Jackson, que parece sempre repetir uma persona dele próprio, é feito com os outros atores, caso de Reynolds repetindo aquilo que fizera em Deadpool, uma espécie de anti-herói, com poucos valores, que pensa mais nele próprio, e possui uma constante auto ironia. Ou também com Salma Hayek, encarnando a Mexicana sensual e perigosa, um papel que a atriz sempre acaba se deparando.

Dupla Explosiva pode muito bem ter algumas qualidades e momentos engraçados em que seu humor negro funciona. Mas é digno de nota que Dupla Explosiva traz muito a lembrança um equivocado pensamento daquilo que é tarantinesco. Se há realmente alguns diálogos mais inspirados nesse filme, o excesso de sangue, de uma violência gráfica, e principalmente colocar dois foras-da-lei em um carro, sendo um deles Samuel L. Jackson, conversando sobre fatos triviais é dar muito crédito a Tarantino. No entanto, o filme parece pegar o que há mais superficial nos filmes daquele cineasta, não se atendo ao fato de que essa construção baseada em figuras pré-estabelecidas do cinema (e no caso de Tarantino, provindo de uma cinefilia ferrenha, oposta de Dupla Explosiva) surgem num mundo externo aos personagens, já suas figuras são bem construídas, singulares, com força empática suficiente, para que aqueles longas não sejam apenas sátiras de alguns gêneros.

Às vezes é possível acreditar que todo vigor de Quentin Tarantino fez mal a um tipo de cinema, que se apoia na violência gráfica e no humor negro para validar qualquer narrativa, ou agradar um público mais desavisado. E se no caso do cultuado diretor há uma espécie de violência colocada num mundo particular, totalmente cinematográfico, sem alusão nenhuma ao mundo real, em Dupla Explosiva essa condição violenta e exagerada está próxima ao mundo real, nomeia-se a Interpool, os países do leste europeu, é feita alusão a diversos atentados terroristas na Europa, e aquele espetáculo cômico e negro vira um show de irresponsabilidade. Por fim, Dupla Explosiva faz de seu espetáculo satírico de blockbusters de ação, um filme tão irresponsável quanto aqueles vendendo a mesma empolgação que parecia ironizar. O real é o último apoio do longa, ainda que aquela ameaça seja inverossímil, as ruas de países conhecidos faz o público aderir às emoções finais. O longa faz espetáculo com uma violência cotidiana, apenas pelo fato de necessitar de certa dramaticidade em um momento chave do filme.

Dupla Explosiva é um amontoado de ideias que parecem almejar tornar uma obra com cara genérico em algo totalmente avesso aquilo que se vê. Todavia, o resultado é extremamente próximo a tantos outros longas de ação. Um filme vazio, apoiado em estereótipos e totalmente irresponsável com a violência que retrata. No final, Dupla Explosiva poderia ser qualquer outra dupla, ou qualquer outra explosão estampados num cartaz genérico.

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