Críticas

Crítica | Gaby Estrella

Há uma faixa etária no público brasileiro que parece uma nova fonte de bilheteria para o cinema nacional, trata-se da faixa infanto-juvenil, e o que até outro dia era discurso sobre um público que o mercado audiovisual brasileiro não ocupava, agora colhem-se os frutos de uma série de obras que buscam justamente dialogar com esse público. Sucessos recentes comprovam o fato, filmes como Meus 15 Anos, Fala Sério, Mãe! e até Carrossel e DPA (Detetives do Prédio Azul), esses dois últimos num público um pouco mais infantil, fizeram sucesso assim como elevaram qualitativamente a disputa.

Gaby Estrella é resultado desse processo, utilizando-se um fator ainda mais forte, o fato de ser uma série infanto-juvenil de sucesso na televisão a cabo, o que faz com que o longa entre com certa vantagem no jogo. Algo que coloca um ponto ainda mais forte é uma relação com o espectador já cativo, que acompanhava aqueles personagens ainda crianças agora cresceram junto como o elenco, fazendo uma comparação evidente e bastante clara entre o público e os personagens.

Com essa relação já bastante construída com o público, pulando outra etapa, a de construir personagens que simpatizem com o espectador, o longa poderia focar em sua história, estabelecer uma narrativa que agradasse ainda mais esse espectador já cativo. Gaby Estrella segue os passos da série televisiva, a cantora juvenil de repente se vê em baixa, sendo passada em números de views e seguidores por uma nova cantora pop e em meio a essa perda de popularidade, Gaby precisa voltar a sua cidade natal no interior para ver sua avó, que provavelmente passa por alguma doença. Mas em seu lugar de natureza também está uma vloger que faz de tudo para acabar com a carreira de Gaby Estrella, mesmo sendo sua prima Rita.

O longa segue, dessa maneira, todos as formas da novelinha televisiva. E mostra o quanto é difícil se livrar desses cacoetes televisivos. Um formato que lembra outro formato, inserido em outro formato. A questão é que o filme de Gaby Estrella realmente remete ao estilo novelesco que visava o público infantil no passado, não dialogando com as série que agradam os jovens no momento, mas esse estilo viciado que o cinema infanto juvenil já citado passou há algum tempo. Esse ruído em relação ao que se vê fica ainda mais evidente quando impresso na tela, aparentando um abismo na produção que repete mais clichês e clichês.

Isso não só em sua narrativa, claramente inspirada nas séries musicais Disney, principalmente Hanna Montana e seu pé no country. Aqui o que se vê é uma montagem estranha, que parece não saber lidar com o tempo cinematográfico, que não busca a síntese na sua história, utilizando uma série de planos e imagens de transições como o nascer e o cair do sol em imagem acelerada, ou uma série de momentos onde o público assiste aos cavalos no pasto, estes com muito tempo de tela diga-se de passagem. São fatos como esse que fazem os 94 minutos de projeção parecerem muito mais longos. Esses vícios audiovisuais também estão nas opções de planos, no uso extremo dos closes, na câmera lenta em momentos dramáticos, algo que afasta qualquer tipo de público e não se pode subestimar o conteúdo consumido por jovens hoje em dia.

Numa certa ingenuidade, o longa continua a apostar em traços que não dialogam com uma atualização desse produto infanto-juvenil, a caricatura que ronda certos personagens são superficiais até mesmo para uma comédia totalmente aberta e distante de qualquer pretensão. A patricinha que é Rita em seu cômodo todo rosa, cheia de glamour, ou o empresário que parece ter saído de um desenho animado como Flinstones ou Jetsons; assim como o assistente todo atrapalhado de Gaby que sempre está levando tombos ou algo do gênero. Essas figuras mostram que Gaby Estrella não se desprendeu também dos velhos artifícios que faziam aquele título um sucesso entre o público infantil, não realizando uma ponte entre um público mais velho, aquele que já havia sido conquistado pela série.

É óbvio que o longa, por seu passado televisivo, pode atrair bastante público, mas uma coisa é fato, há uma tentativa de conversar com uma faixa etária e caba se saindo melhor num estilo outro, com piadas realmente muito mais infantis que são protagonizadas por atores bem mais velhos. Assim, observa-se uma tentativa de colocar questões como romances juvenis, a relação entre o talento que em outro tempo deveria dar lugar aos interesses familiares, enquanto a comédia e as falas remetem a um produto extremamente infantilizado, abrindo uma lacuna entre aquilo que deseja ser falado e a forma como ele é transmitido.

A aparente ingenuidade e inocência de Gaby Estrella dão lugar a certa displicência, como se o longa acreditasse que aquela vantagem inicial pudesse valer durante todo o filme. Algo que fica marcado na atuação do elenco juvenil, onde se percebe também uma típica forma televisiva, que não fica tão consistente e convincente nos cinemas, abusando de uma carga dramática em todas as falas ou num modo de se expressar totalmente engessado. Aparenta que faltara um trato ainda mais especial por parte da equipe em relação a Maitê Padilha, Bárbara Mais, Luiza Prochet e os ouros adolescentes.

Assim, o que realmente nota-se em Gaby Estrella é essa incapacidade de se comunicar com o público que deseja, algo que pode até ser funcional para uma idade menor, mas que demonstra até mesmo uma falta de cuidado com aquela narrativa adaptada ao cinema. Se é necessário atingir o público infanto-juvenil com as obras nacionais, também é necessário oferecer a mesma qualidade que ele já está acostumado.

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