História do Brasil

Crítica – Marighella

Estreia de Wagner Moura na direção comete alguns deslizes, mas entrega com clareza sua proposta

Desde antes do início das gravações, Marighella foi alvo de críticas por boa parte da população, que acreditava que não deveriam ser lançadas obras como esta em questão, pois figuras como Carlos Marighella representariam o que de pior houve na história de nosso país.

Bom… para estas pessoas, claramente mal-intencionadas fica aqui a lição de que as artes representam um espaço de histórias, ideias e discussões de todo tipo, assim, permite-se que troquemos figurinhas para que cada indivíduo na sua intimidade chegue a uma determinada conclusão, seja esta positiva ou negativa em relação àquele material em destaque.

Entra Wagner Moura, ator renomado e talentoso que resolveu se aventurar atrás das câmeras dessa vez, estreando na função de cineasta com o competente Marighella, longa adaptado da biografia Marighella – O Guerrilheiro que Incendiou o Mundo de Mário Magalhães, que narra um específico período da vida do escritor, político e guerrilheiro marxista-leninista Carlos Marighella (Seu Jorge), que durante a década de 60 combateu a ditadura militar brasileira.

O estreante Wagner Moura

Toda vez que fazemos qualquer análise, sempre devemos levar em consideração todos os tipos de contextos que rondam aquele material. No caso de Marighella existem muitas contextualizações a serem destacadas, sendo a principal delas a respeito da censura que teve por parte de órgãos federais, que por uma escolha de preferência política não queriam que esta versão ficcional da história de Marighella chega-se até as pessoas, cerceando quaisquer possibilidades de um debate e conscientização sobre algo muito relevante à trajetória do Brasil, assim como também para o atual momento polarizado que vivemos.

Dentre os méritos encontrados nesse trabalho de estreia de Moura, vale exaltar uma narrativa capaz de pontuar tantos detalhes de um só homem, expandindo o escopo. Consequentemente, oferecendo ao público uma chance de analisar com maior clareza quem e o que fez a figura biografada.

Quando estamos na resolução dos fatos, ficamos com a sensação de termos presenciado uma história cheia, portanto temos os argumentos para concluir o que tiraremos daquilo. Se esta era a intenção de Wagner Moura: missão cumprida!

Apesar disso, vale comentar que pelo meio do caminho, também conseguimos perceber alguns deslizes narrativos, seja pela execução de cinema de gênero ação, que continua a trepidar uma câmera, mesmo após toda a ação ter ficado para trás, tornando esta produção algo visualmente menos atraente e hábil de cansar a quem assiste; assim como pelo roteiro que na tentativa de destacar tantos personagens que rodeiam o protagonista, perde-se um pouco, deixando escapar parte da intensidade proposta.

Herói ou vilão?

Talvez, muito por causa dos tempos que vivemos, sentimos uma natural necessidade, mas um tanto conveniente, de encontrar pessoas que consigam simbolizar tudo aquilo que acreditamos de modo consciente ou não, ao mesmo tempo que defendam tais crenças com unhas e dentes e o que mais, enquanto silenciam ou atacam aqueles que se encontram do outro lado, que não partilham da mesma visão. Conseguimos observar pessoas de ambos extremos que agem desta maneira, sem pudor ou a menor consciência do cenário em volta.

São estas pessoas que querem elevar ou rebaixar o brasileiro Carlos Marighella como um salvador ou bandido, respectivamente. Afastando as possibilidades de qualquer progressão, já que estão mais preocupadas com as cadeiras que se sentam, do que aquilo que está disposto à mesa.

Em um determinado momento da parte final de Marighella, vimos em Wagner Moura uma notável sensibilidade de unir elementos que geralmente estariam em lados opostos, quando a atual mulher do guerrilheiro e sua ex-esposa choram pela morte dele, emboscado por membros representantes da ditadura militar. Este é, provavelmente, o momento que indica quais são as intenções de Moura com o projeto: revelar que ali havia um homem que acreditava firmemente em seus pensamentos e emoções, exterminado por possuir estes dentro de si; mas, que antes o levaram a ir por outros meios por essa defesa de ser quem é, e ver as coisas por um espectro diferente.

Cabe a nós, portadores de nossa própria consciência julgar os fatos e versões após conhecer todos os contextos possíveis. Seja herói ou vilão, Carlos Marighella é parte da história deste país, quer queiram ou não, portanto, merece ter sua vida contada para que possamos analisar cada um de seus atos, benéficos ou nocivos.

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