Críticas

Crítica | Nada a Perder - Contra Tudo. Por Todos.

Cinebiografias quase sempre apelam para o cárater altruísta de seu protagonista, manipulam a história de superação da figura central e tendem a disfarçar as máculas da trajetória de seus heróis, transformando-os em mártires como último mecanismo de sua estrutura manipuladora. Sejam líderes políticos ou religiosos, eles empesteiam essas narrativas historicamente maquiadas através do recorte samaritano de uma vida repleta de ações questionáveis, quando não fétidas. Nada a Perder – Contra Tudo. Por Todos., de Alexandre Avancini (Os Dez Mandamentos: O Filme, 2016), não glamouriza os seus conflitos dentro de uma ótica geral, mas extermina a potência do seu enredo ao erradicar a sua transparência, fazendo desse apenas um registro para sectários de seu biografado.

A obra nos apresenta aos poucos a história de vida do afamado bispo Edir Macedo (Petrônio Gontijo), tendo como ponto de partida a sua infância em Rio das Flores, município do Rio de Janeiro, seguido por fatos como a inserção na igreja, local onde conhece a esposa Ester (Day Mesquita), até a fundação da Igreja Universal do Reino de Deus, que em seu apogeu lotava o Maracanã com membros de sua congregação, cujo único propósito era pregar o evangelho e ganhar almas para Deus, segundo tudo o que está deslindado na película. Por fim, a compra da TV Record e a sua comentada prisão em 1992, tinham tudo para configurar um arrebatamento conclusivo, porém isso não acontece devido ao modo como o filme é conduzido.

A relevância adotada como critério para a exposição dos episódios da vida do protagonista, acaba por delimitar o longa, desencadeando em uma narrativa presa à convenção, refém de sua linearidade que nada acrescenta em termos de andamento, visto que a dinâmica da obra sofre um desequilíbrio na precipitação dos acontecimentos, muitos deles aglomerados em seu terceiro ato.

Acusado de charlatanismo, o bispo que não se considera líder religioso por associar a Igreja Universal a uma universidade que ensina os caminhos da vida e da salvação, poderia dividir a acusação atrelada à taxação de vigarice com Avancini, responsável pela direção do longa. Com um histórico predominantemente televisivo, ele demonstra a imperícia de seu trabalho ao empregar recursos preguiçosos como imagens de arquivo e manchetes de jornais para indicar o contexto histórico do Plano Collor, que com a substituição do cruzado novo, moeda corrente da época, pelo cruzeiro, beneficiou o bispo na aquisição da Rede Record.

A linguagem provinda da TV também se manifesta em fragmentos que costuram com fugacidade acontecimentos que poderiam ser melhor explorados, como a má formação congênita da filha mais nova e a sua relação com o cunhado, o missionário R. R. Soares (André Gonçalves), instantes onde inexistem ajustes finos de montagem, posto que os cortes secos desconhecem sutilezas, mostrando o seu apego à identidade nacional da linguagem derivada da narrativa folhetinesca.

Petrônio Gontijo se esforça para atribuir personalidade à figura do bispo, adequando posturas e trejeitos de acordo com a progressão de tempo que o longa sofre. Mas se por um lado o seu desempenho não compromete, por outro realça a inaptidão de seus colegas de elenco, que parecem replicar cacoetes utilizados em novelas, colecionados há décadas e reproduzidos no filme. Nos breves momentos em que Dalton Vigh encarna Juiz Ramos, a sensação de reciclagem de entonações familiares é constante, assim como no caso de Eduardo Galvão, que ao entrar em cena como Monsenhor José Maria reafirma o constante revival de suas atuações, sacramentando de vez a limitação dramática de ambos os atores, já atestada antes em produções realizadas para a televisão.

Se feito com a intenção de agigantar ainda mais a imagem de Edir Macedo, Nada a Perder – Contra Tudo. Por Todos. obtém êxito, visto que visibiliza a conquista de seu império calcada num retrospecto de luta e provações. Contudo, é uma pena que ao realizar isso o filme induz ainda mais os seus fiéis à comoção, ferramenta recorrente em obras do tipo, mas que aqui se encontra num nível incômodo de debilidade imagética.

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