Críticas

Crítica | Ouija: Origem do Mal

É engraçado perceber como Ouija: Origem do Mal, em seus primeiros minutos, possui tudo que um filme de terror deveria ter. Gênero este calcado em elaborações de estilo e estética, em que o horror surge exatamente na construção da mise-en-scène, ou seja, todos os elementos fílmicos sugerem a aparição do medo em algum momento, seja na composição do plano, na iluminação, nos movimentos de câmera e na música. Acima de tudo, o terror é puramente construção.

O diretor de Ouija 2, Mike Flanagan (O Espelho), sabe perfeitamente disso. As primeiras cenas são de uma destreza em termos de direção que parecer estar-se diante de mais um dos grandes títulos da nova safra dos filmes desse gênero. A primeira em que a protagonista do filme, Alice Zander (Elizabeth Reaser), comanda uma sessão mediúnica em que os espíritos se manifestam de todas as maneiras na casa daquela moça.

Com um estilo de saltar os olhos esse primeiro momento extrai toda a tensão possível com um apuro visual incrível. O uso do split diopter, quando há uma figura em primeiro plano e outra em segundo e ambas estão em pleno foco, no momento que Alice invoca um espírito, conectando mundo espiritual e material, revela toda essa destreza de Flangan na construção da tensão. E logo em seguida tudo é desconstruído e nota-se que aquela família na verdade possui inúmeros truques de ilusionismo para fazer crer naquela sessão do além.

Em Ouija: Origem do Mal, desde os primeiros minutos, repara-se que quem está conduzindo aquela trama entende muito bem a construção do filme de terror, escancarando-a logo nessa primeira sequência. E essa relação entre autor e a obra se dá de forma excelente até quando o tabuleiro Ouija chega à casa dos Zander. Nesse momento, o jogo é introduzido através de um plano em que a câmera registra o logo de Ouija e numa grua sobe mostrando a caixa de cima terminando com um movimento inexplicável, comprovando o estranhamento daquele objeto. Esse suntuoso plano é a síntese do filme, longa que contém a elegância de seus enquadramentos e movimentos, mas que está totalmente suscetível a seus exageros, a querer chegar adiante com uma trama já vista e revista inúmeras vezes nesse mesmo ano.

Ainda que Flangan tente voltar aos seus recursos estilísticos, a trama não funciona mais. A família, composta por Alice e suas duas filhas, acostumada a utilizar o além de forma quase jocosa, uma vez que falsifica provas do mundo pós-vida para acolher seus clientes, agora sofrerá com a sua caçula nas mãos de um espírito nada acolhedor. Daí para frente o longa contará com padres, relações (quase) sexuais condenáveis entre adolescentes, poderes telecinéticos, casa mal assombradas e um grande espírito realizado CGI.

Entre influências e referências, Ouija 2 está muito mais próximo da picaretagem. O filme, como citado acima, é um misto de tudo que já foi feito no gênero, como se quisesse deixar ainda mais claro que entende do terreno que está pisando. No entanto, nessa gana de conciliar toda história do cinema de terror em apenas um filme. Com a pretensão de alcançar o horror em todos seus subgêneros possíveis, o filme acaba exagerando em todas suas situações. Aquele jogo de Ouija parece apenas uma desculpa para que o filme possa realizar suas sequências.

Muito disso se deve ao fato de que Ouija 2: Origem do Mal é, claramente fruto de um projeto realizado através de uma fórmula. O filme sofre da chama contaminação de James Wan, doença que tanto afeta os filmes de terror americano no momento. Flanagan, nesse longa, parece muitas vezes apenas repetir o que deu certo nos filmes do diretor malaio, buscando algo que se vê no sucesso de Invocação do Mal, mas que se empalidece tentando ser repetidos. Assim como ocorre com inúmeros filmes após a boa fase de Wan. Dessa maneira, se no começo parecia haver alguma força na direção de Flangan isso vai se esvaindo conforme o andamento de Ouija: Origem do Mal. Toda sua inventividade estilística e estética é deixada de lado por uma simples fórmula, fato que escancara ainda mais os problemas desse filme.

Dessa maneira, Ouija: Origem do Mal parece ser apenas um esforço exagerado para agradar os fãs do gênero. Um filme que tenta assustar de todas as formas e que acaba revelando ser mais um entre tantos outros. Ouija 2 carrega consigo certa moralidade, muito presente nos filmes de terror, em que as protagonistas são de alguma forma punidas por suas brincadeiras com o além e por isso entende-se a maldição dos mortos. No entanto, Flanagan não percebe que faz a mesma coisa, compreende e realiza todas as construções necessárias para o gênero, mas parece estar apenas reproduzindo uma centena de filmes e fórmulas, realizando apenas operações ilusórias que incapacita uma entrega de alma ao terror.

Ouija: Origem do Mal parece e até tenta, mas não consegue conectar-se à nata do cinema de horror atual.

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