Tiroteio

Crítica – Vingança & Castigo

Faroeste da Netflix surpreende positivamente com grandes atuações do elenco em trama sobre a dor que não conseguimos abrir mão

Muitos são os casos quando se perde um pouco do sentido ao traduzir um título para o nosso português. O nome original do mais recente faroeste da Netflix é The Harder They Fall, que traduzido ficaria ‘Quanto Mais Eles Caem’. Inegavelmente, este é um bom exemplo de título que faz jus ao material em questão. Assim também a nossa versão chamada Vingança & Castigo, pois é exatamente do que se trata a obra do estreante Jeymes Samuel.

Graciosamente, tudo aqui neste faroeste é uma boa surpresa. Começando pela opção de usarem personagens históricos negros em um conto ficcional, preenchendo assim o elenco de atores negros gabaritados; incluindo uma prática narrativa mais moderna que pensa em como levar esse material para o assinante da plataforma.

Vingança & Castigo rompe padrões quando o fora-da-lei Nat Love (Jonathan Majors) descobre que seu inimigo Rufus Buck (Idris Elba) será libertado da prisão, assim reúne sua gangue para rastrear Rufus e buscar vingança pela morte de seus pais. Aqueles que cavalgam ao seu lado pelo Velho Oeste, são: seu antigo amor Stagecoach Mary (Zazie Beetz), seus braços direito e esquerdo – o temperamental Bill Pickett (Edi Gathegi) e o rápido no gatilho Jim Beckwourth (RJ Cyler) -, além de um surpreendente adversário que virou seu aliado. Rufus Buck também tem sua própria equipe temível, incluindo Trudy “Traiçoeira” Smith (Regina King) e Cherokee Bill (LaKeith Stanfield), igualmente um grupo que não sabe como perder. Quem vai levar a melhor nesse duelo de tiros?

Crips & Bloods (do Velho Oeste)

Geralmente quando assistimos obras sobre gangues das ruas testemunhamos membros da comunidade negra tentando matar uns aos outros. Na vida real, duas gangues em específico ganharam enorme espaço nos noticiários americanos durante as décadas de 80/90: os Crips, uma aliança de gangues de rua com base nas regiões costeiras do sul da Califórnia, que tradicionalmente usam roupas azuis; e os Bloods, uma gangue de rua fundada em Los Angeles, Califórnia, sendo identificados pela cor vermelha usada por seus membros e por símbolos específicos, incluindo sinais manuais distintos.

Em parte, Vingança & Castigo é uma versão faroeste de Crips & Bloods. Algo que o diretor estreante Jeymes Samuel faz questão que notemos, pois Nat Love está sempre usando uma camisa azul, assim como o temido Rufus Buck que após escapar da prisão, escolhe apresentar-se ao vilarejo chamado Redwood City (Cidade da Madeira Vermelha) usando um blazer bem chamativo com a cor usada pelo grupo Bloods.

(Observação: perceber que o protagonista Nat Love usa em alguns momentos, um lenço vermelho em volta do pescoço, uma contradição que fará todo o sentido ao final deste embate.)

Interessante como através das cores, conseguimos nos localizar dentro desta obra dirigida por Jeymes Samuel, que também atende pelo codinome The Bullitts, usado em sua carreira musical.

Em um determinado momento, observaremos a trupe de Love tendo que roubar um banco de uma cidade que só tem habitantes brancos. Quando chegam lá, ficam tão surpreendidos quantos nós espectadores. Foi uma escolha muito inteligente de Samuel, que conseguiu em um breve momento revelar um choque social (infelizmente) ainda presente em nossa sociedade, enquanto quebrava um paradigma pela personalidade e simpatia do líder do grupo de assaltantes.

Mais sobre castigo do que vingança

Agora, se têm algo que sobressai além de qualquer coisa em Vingança & Castigo são as performances do elenco, que através do protagonista interpretado pelo estupendo Jonathan Majors conquistam todos os territórios narrativos possíveis.

O ator americano de apenas 32 anos de idade, que chamou a atenção de muitos no longa-metragem The Last Black Man in San Francisco (2019) e, hoje, encontra-se como uma das principais peças dentro do Universo Cinematográfico da Marvel no papel do terrível vilão Kang, o Conquistador, é definitivamente uma estrela em ascensão. Carismático, engraçado, intenso, vulnerável, tudo isso expressado de uma forma hipnoticamente naturalista. Não vai demorar muito para vermos Majors aparecendo em listas e mais listas de premiações da indústria hollywoodiana pelos próximos anos.

Não bastasse um protagonista atuando em nível de excelência, temos ainda um restante de elenco que emparelha facilmente com o astro principal, com destaques para: Regina King, que tem uma cena junto de Zazie Beetz capaz de deixar o assinante Netflix de queixo caído; e, LaKeith Stanfield, que interpreta um pistoleiro implacável de olhares aveludados.

É realmente um trabalho impressionante o que foi feito aqui em Vingança & Castigo, primeira assinatura fílmica de Jeymes Samuel. Que será capaz de agradar gregos e troianos, aqueles mais fanáticos pelo gênero faroeste, assim como outros sedentos por uma linguagem mais moderna, que copia descaradamente o estilo de Quentin Tarantino, enquanto deixa suas próprias marcas em uma narrativa que conhece o pesar do Velho Oeste, onde o castigo é sempre mais avassalador do que o intuito da vingança.

Nat Love e Rufus Buck souberam disso do modo mais doído.

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