Filmes

Crítica | A Casa do Medo: Incidente em Ghostland

Rendendo uma quantidade esmagadora de produções genéricas, a maioria delas direcionadas a adolescentes, o gênero terror costuma depender de autores para se refrescar com obras mais originais, mesmo que de vez em quando. Dez anos após seu polêmico Mártires, que dividiu público e crítica entre amor e ódio, o francês Pascal Laugier chega à era pós-Invocação do Mal com A Casa do Medo: Incidente em Ghostland, trazendo sets caprichados e bonecas macabras mas querendo também acrescentar sua própria marca à fórmula. No entanto, apesar das intenções, o resultado vai da originalidade à mesmice em questão de minutos.

Iniciado com uma menção bem-humorada ao escritor H.P. Lovecraft, A Casa do Medo tem uma ótima largada, prometendo uma história que brinca ao máximo com as convenções do gênero. O enredo realmente começa bem: após se mudarem para a casa de uma parente, Pauline (Mylène Farmer) e suas duas filhas, Beth (Emilia Jones) e Vera (Taylor Hickson), são atacadas por misteriosos invasores durante sua primeira noite no lugar. Em questão de minutos, para a surpresa dos personagens e do próprio público, a mãe das garotas consegue matar os dois criminosos. Apresentado como um prólogo, esse evento traumático inspira Beth, já adulta (Crystal Reed), a escrever livros de terror.

Enquanto promove seu novo livro, Incidente em Ghostland, que se baseia diretamente naquela noite, Beth recebe uma ligação desesperada de Vera (agora interpretada por Anastasia Phillips), que enlouqueceu e ainda vive com a mãe naquela mesma casa. A escritora vai ao local visitá-las e lá descobre que as alucinações que a irmã anda tendo com os antigos invasores podem ser mais reais do que imaginava. A partir daí, o filme de Laugier fica cada vez mais bizarro, com acontecimentos inexplicáveis que fazem parecer um sonho febril, e essa imprevisibilidade captura a atenção por valiosos minutos que, infelizmente, não são feitos jus pelo restante da projeção.

Logo ao final do primeiro ato, há uma reviravolta bastante significativa que explica o porquê de tudo parecer tão sem pé nem cabeça. Sem querer entregar nada aqui, trata-se de uma sacada inteligente de Laugier para abordar o efeito do trauma sobre o psicológico da personagem, que ainda vivencia um estado de choque e não sabe disso – ou melhor, não quer saber. Porém, diretamente após essa ficha cair, A Casa do Medo deixa de ser a experiência original que era inicialmente para se tornar mais um exemplar previsível de uma subcategoria já estagnada do terror: a fuga de cativeiro.

O primeiro e mais visível tropeço do filme são os vilões, que não possuem profundidade alguma e são apresentados como caricaturas, especialmente o grandalhão que gosta de brincar com bonecas. É difícil levar a sério ou sequer se assustar com essas figuras, que parecem sair diretamente de uma atração mequetrefe de parque de diversões. Os aspectos que mais irritam neles, contudo, são a invencibilidade e onipresença forçadas, levando a momentos nos quais os antagonistas simplesmente se teleportam para onde suas vítimas estão sem que ao menos tivessem como saber aonde iriam, para começar.

A direção de Laugier, então, é quase tão frustrante quanto os superpoderes dos vilões, mesmo que apresente escolhas visuais inspiradas – principalmente nas sequências de sonho. Na maior parte do tempo, o cineasta decepciona por apostar demais nas enfadonhas jump scares, com deixas musicais altas, que certamente farão o espectador despreparado pular mas que não surtem nenhum efeito além disso. Outra decepção fica por conta do mau-aproveitamento do set da casa, cujo capricho é ressaltado pela colorida fotografia, para criar momentos dignos de tensão – o único item que merece ser mencionado é o espelho com a boneca.

Entretanto, o que derruba A Casa do Medo: Incidente em Ghostland é seu sadismo excessivo com as personagens principais. Tudo bem que isso já seja mais que esperado de Laugier, famoso pela violência extrema de seus filmes, mas não deixa de incomodar aqui, principalmente quando infligida em garotas menores de idade. Se em um primeiro momento essa brutalidade choca por uma razão, ela se torna cada vez mais vazia conforme as cenas de abuso são repetidas à exaustão, testando a paciência e o estômago. Por isso, mesmo quando a história chega a uma conclusão positiva, a satisfação maior é de vê-la simplesmente acabar, o que enfraquece sua tardia mensagem de superação.

Escolha o Streaming e tenha acesso aos lançamentos, notícias e a nossas indicações do que assistir em cada um deles.