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Mostra SP | Crítica: Poderia Me Perdoar?

Com estreia programada apenas para o começo do ano que vem, chega antes na Mostra SP, a mais recente obra da cineasta Marielle Heller, Poderia Me Perdoar?, estrelando Melissa McCarthy. Felizmente, Heller mostrou evolução de seu último projeto, a comédia dramática sobre amadurecimento O Diário de uma Adolescente de 2015. Enquanto no longa de três anos atrás escreveu e dirigiu, agora, apenas ocupou a função de manipuladora da narrativa. Quem roteirizou foram Jeff Whitty e Nicole Holofcener, sendo a última também diretora de filmes, como o fraco Gente de Bem ou o agradável À Procura do Amor, conhecido por ser lançado três meses após a morte de um de seus protagonistas, o ator James Gandolfini.

Poderia Me Perdoar?, baseado em eventos reais, conta a história de Lee Israel, aclamada autora de biografias que ganhou notoriedade nas décadas de 60, 70 e 80 publicando obras sobre mulheres que triunfaram em suas áreas, como as atrizes Katharine Hepburn e Tallulah Bankhead, ou a executiva dos cosméticos Estée Lauder. Mas, em 1991, a escritora está falida pois ninguém do campo editorial se interessa por suas propostas de biografias, fora de sintonia com o mercado. Assim, Lee Israel começa a improvisar e passa a falsificar cartas, documentos e anotações de pessoas famosas, com a intenção de vender a colecionadores.

Ao contrário de O Diário de uma Adolescente que é cheio de montagens que pouco ornam com a atmosfera do filme, de clima ligeiramente tenso, até pelo tipo de fotografia estabelecida, o longa estrelado por Melissa McCarthy é mais harmonioso em suas escolhas narrativas, e consegue transitar livremente e com fluência entre comédia e drama, sem precisar pesar a mão em uma ou outra.

No filme, existem dois aspectos a serem exaltados: o primeiro, é a abordagem do seu tema que fala sobre encontrar sua própria voz, pois Lee Israel tornou-se uma mulher amarga, cínica e antissocial que é incapaz de colocar no papel, ideias próprias, e apenas consegue falar ou imitar uma outra pessoa; e o segundo discorre sobre a interlocução magnética entre a escritora e o malandro Jack Hock, um low-life que ganha a vida vendendo drogas, tipo maconha e cocaína.

O roteiro de Holofcener e Whitty dá conta do recado. Há construção bem sedimentada, além de tratamento cheio das duas personagens centrais, especialmente a protagonista interpretada por McCarthy. Feliz foi a escolha de Marielle Heller para o papel da escritora, pois a atriz conhecida na maior parte por comédias, dominou a personagem à sua maneira. Irônica e melancólica, Melissa McCarthy atrai com o chamado charme do mau humor, que sempre encantou em vários filmes bem diferentes um do outro, como Dois Velhos Rabugentos de Donald Petrie, Gran Torino de Clint Eastwood, ou no filme sueco Um Homem Chamado Ove.

Do outro lado, temos uma estupenda performance do ator de origem africana e inglesa Richard E. Grant, visto recentemente em Logan. Beira ser impossível não rir ou se encantar com seu personagem que é um sobrevivente na vida. Tratante, imoral e sem papas na língua, Jack Hock é o tipo de personagem fácil de se aproximar, pois tudo sobre ele é incerto mas cativante. A atuação de Grant construiu um personagem caricatural, mas real, algo que o cineasta Quentin Tarantino geralmente exerce em nível de excelência. Carregado nos trejeitos, seja pela fala ou expressões corporais, e sempre com um sorriso do tipo Gato Risonho de Alice no País das Maravilhas.

Não seria surpresa alguma imaginar o ator sendo indicado a prêmios por seu trabalho em Poderia Me Perdoar? sendo exibido na Mostra SP, mais especificamente no Globo de Ouro, que existe uma categoria voltada para comédias ou musicais.

Tendo em mãos, duas forças opostas que se atraem, a diretora Marielle Heller faz um filme tocante, sem apelar ao sentimentalismo barato, e divertido. Sem esquecer o fato de ser uma história peculiar e muito interessante sobre tipos marginais, nos dois sentidos da palavra.

Tanto Lee Israel, quanto Jack Hock vivem, ou sobrevivem à margem dos principais eventos da vida. E, é nesta marginalização que criam uma amizade impensável, mas verdadeira. Doída e empática, porque mesmo os delinquentes e criminosos sofrem com as mesmas perdas que nós. Só que estes, não aceitam que o mundo os paralise com tanta facilidade.

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