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Crítica | Jane Fonda em Cinco Atos

Sintetizar a vida de uma grande personalidade em um filme de duas horas e cadinho é uma tarefa difícil – mesmo eficiente, Bohemian Rhapsody prova isso. Foi a missão que a diretora Susan Lacy aceitou ao produzir o documentário Jane em Cinco Atos, a ser exibido hoje (5) às 21h na HBO, que aborda o fascinante e complexo trajeto da atriz e ativista política Jane Fonda. No entanto, diferente de outros cineastas que tentam ligar os pontos a partir de um acervo, num processo distante do biografado, Lacy conta com um enorme privilégio: Fonda está disposta a narrar sua história diante das câmeras, detalhe por detalhe, com a franqueza irresistível de sempre.

Quem é Jane Fonda? Cada geração tem uma resposta, já que ela se manteve uma figura relevante ao longo de tantas décadas. Era primeiramente conhecida como filha do ator Henry Fonda, mas depois passou a ser muitas coisas: guerreira espacial, ganhadora do Oscar, traidora da nação, pioneira das fitas de ginástica, até amada protagonista de série da Netflix, com Grace and Frankie. Esses rótulos, no entanto, são apenas rótulos, e o filme de Lacy adentra as histórias fascinantes por trás de cada uma dessas fases.

Interessante notar que Jane Fonda em Cinco Atos, um documentário sobre uma figura feminista, seja pautado a partir dos homens de sua vida. Salvo por uma das partes, cada uma delas tem o nome de um desses homens: no primeiro, o pai Henry; no segundo, o diretor e primeiro esposo Roger Vadim; no terceiro, o político e segundo marido Tom Hayden; no quarto, o filantropo e “ex-marido favorito” Ted Turner. Esses nomes, porém, não indicam o foco de cada ato, e servem mais como pontos de referência para a transformação constante de Jane.

“Eu era tão velha aos 20”, diz a documentada a certo ponto do filme. A partir de suas memórias, constrói-se essa noção de que Fonda ficou mais jovem conforme o tempo passava. Da forma mais íntima, sabemos do seu longo e árduo processo de auto-aceitação, que remonta à relação com o pai, os distúrbios sofridos pela mãe e também aos problemas graves que ela mesma enfrentou em sua juventude, como a bulimia. Fonda relaciona essas agruras às tentativas passadas de se adequar ao “time vencedor dos homens”, como ela expressa, mas este filme nunca assume um tom de denúncia.

Embora toque em temas densos e delicados, o otimismo inabalável da atriz é tão refrescante quanto comovente. Fonda ressalta ter sido constantemente moldada pelos homens de sua vida, mas é aquela coisa: precisou dos moldes para depois quebrá-los, usando-os como um aprendizado. Conquistou sua autonomia sob grande pressão e nunca cedeu, mesmo quando foi considerada ameaça à segurança de seu país ao protestar contra a Guerra do Vietnã e visitar o Vietnã do Norte durante o conflito – uma decisão conturbada e ainda complexa, mas que levantou discussões necessárias.

Apesar de todo o peso do passado, as entrevistas com Fonda não raro são hilárias. Seu senso de humor faz com que os 133 minutos de duração corram suavemente, e deixa aquele gostinho de quero mais – talvez, por isso, o mundo não se canse dela com facilidade. Para cada revelação que faz, há um comentário sarcástico, como se a atriz não vivesse sem essa válvula de escape – herança notada no filho Troy Garity, quando descreve o fervor político do pai Tom Hayden. Mas isso nunca soa artificial em frente à câmera, mantendo-nos sempre próximos.

O olhar criterioso de Lacy, que antes conduziu o doc Spielberg, faz jus à complexidade da figura central. Com atenção aos detalhes e um acervo generoso de imagens a seu dispor, a cineasta constrói um panorama surpreendentemente denso da vida de Fonda. Inicialmente, a quantidade de tópicos abordados pode intimidar um espectador casual, mas a habilidade de Lacy a permite criar intersecções entre os diferentes temas sem que a experiência se torne cansativa. É um trabalho notável e que foi merecidamente aclamado nos festivais de Sundance e Cannes deste ano.

Como documento, Jane Fonda em Cinco Atos deixa muito pouco a desejar. Suas limitações, na realidade, não são por culpa de Lacy nem de Fonda, mas da passagem do tempo em si. Por isso, o último ato, intitulado Jane, é o mais enxuto de todos. Tem seu início na década de 2000, ou seja, tempo ainda recente, e Fonda diz que este ato ainda está “apenas começando”. Tomando como referência seu comprometimento com causas variadas e a energia pura que traz às suas aparições recentes na mídia, é capaz que seja o ato mais longo de todos na brilhante vida de Jane Fonda.

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