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Crítica | American Son

É algo muito difícil e complicado falar sobre American Son, novo drama da provedora mundial Netflix. Porém, não é no sentido de ser um assunto delicado, assim devemos nos resguardar e evitar certas vias para não gerar conflito ou machucar alguém. Muito pelo contrário, talvez, são nestas vias perigosas onde podemos ter algum esclarecimento do problema, e mais ainda, se somos parte dele e o porquê caímos, e caímos nas mesmas armadilhas institucionalizadas. Por que esta tragédia americana – e do mundo – não encontra um ponto comum onde não haja dor e lágrimas no final?

Estas são perguntas difíceis, também com respostas divisivas. O cenário é muito mais complexo e profundo do que nossa superficialidade pode tentar abrandar. Afinal, o que é fácil no século 21?!

A obra de Kenny Leon, baseada na peça homônima da Broadway, escrita por Christopher Demos-Brown tenta responder e trazer alguma luz e ensinamentos com sua história. Infelizmente, encontra dificuldades dentro das várias ramificações que rondam o assunto do racismo mais do que presente em nossas vidas corriqueiras. Equiparando-se em paralelo com nossa própria realidade, confusa e embebida no sofrimento de tantos, responsáveis ou injustiçados, tanto faz. Dor é dor.

American Son nos conta a terrível noite de Kendra, mãe do jovem de 18 anos de idade Jamal, que está desaparecido. Ao lado de seu ex-marido Scott, um agente do FBI, passam a noite em uma delegacia de polícia atrás de notícias do que possa ter acontecido com o garoto. Nesta madrugada de aflições, Kendra irá de encontro com situações que situam o preconceito de raça, gênero e classe dentro dos procedimentos policiais, enquanto desesperadamente busca saber o paradeiro de seu filho.

O maior problema no longa de Leon não vem pelo fato da trama tentar exemplificar vários aspectos e pontos de vista do tema racismo. É até louvável que o filme faça algo por esta discussão tão presente e dura de nossa realidade. A adversidade vêm por dois caminhos: primeiro, há um excesso astronômico de informações para apenas 90 minutos de duração; e segundo, estabelece-se uma mescla que mira abordar temáticas sensíveis e de enredamento imenso com situações que adentram o campo familiar particular.

Óbvio, que na realidade, as coisas são assim e misturam-se. Todavia, dentro desta temática também faz parte um certo didatismo para tentar levar alguma elucidação, e este exagero associado a uma desorganização de ideias acaba distanciando mais o assinante Netflix do que gostaria.

Em resumo: American Son está mais próximo do competente, mas bagunçado O Ódio que Você Semeia de George Tillman Jr. do que do chocante e indispensável Fruitvale Station – A Última Parada de Ryan Coogler – melhor obra do cineasta responsável pelo popular filme da MCU Pantera Negra.

Uma produção com apenas quatro personagens – ainda temos um policial e um tenente da delegacia de polícia – e apenas um único cenário, lembrando uma peça de teatro, deve ser bem distribuída para que o assunto seja assimilado como se pretende. O diretor Kenny Leon não cria obstáculos visuais ou sonoros que entrem na frente da relevância do assunto, entretanto, o mesmo quase nunca tira o pé do acelerador, não deixando espaço para o espectador aprofundar-se junto de suas personagens nessa noite calamitosa.

O maior exemplo desta pisada forte chega através da atuação vigorosa, mas muito estática por parte de Kerry Washington – também produtora deste longa da Netflix. Sem desenvolvimento ou qualquer mudança, ou seja, ela começa a história de uma maneira, continua com as mesmas agonias na parte central, e no final, apenas as reafirma. Até o personagem de seu ex-marido – interpretado por Steven Pasquale – , uma figura difícil de se conectar ou gerar qualquer empatia pelas coisas que diz, apresenta um mínimo traço de nuance, uma ruptura que nos serve como isca para um melhor envolvimento na trama.

Então, quais seriam as qualidades existentes em American Son? Alguns momentos mais didáticos, como quando Kendra tenta explicar para seu ex-marido, o recente despertar de Jamal na fase adulta, além da exposição ordenada de alguns contrapontos que elevam a discussão de forma inteligente, desta maneira, sondando ambos os lados extremados desta situação – no caso, o Tenente John Stokes, papel do cirúrgico Eugene Lee.

Um aviso: American Son de Kenny Leon não é uma jornada prazerosa, nem um pouco, também assim é a realidade diária com baixas de todos os lados. Não há chuva capaz de lavar tamanha dor e sofrimento, e os momentos de conexão como as músicas de Thelonious Monk, acabam durando pouco, desgraçadamente, para todos nós.

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