Filmes

Crítica | O Grito

Nos créditos de O Grito é possível notar a presença de um nome de grande respeito. Sam Raimi está listado como um dos três produtores do longa dirigido por Nicolas Pesce. Para os que desconhecem quem é esse ícone do cinema, basta checar sua lista de filmes. Nela, encontrarão obras como os fenômenos cult Uma Noite Alucinante – A Morte do Demônio (1981) e Uma Noite Alucinante 2 (1987); além de perceber que ele é o responsável pelos dois melhores filmes do cabeça de teia já feitos, Homem-Aranha (2002) e Homem-Aranha 2 (2004).

Após a sessão da sequência/spin-off de O Grito 2 (2006), a mente fica rodando, rodando, e chega-se a conclusão de que o cineasta Sam Raimi poderia ter feito mais do que produzir, e ter tomado as rédeas criativas desta versão atual, já que o trabalho de Nicolas Pesce passa bem longe do terror, ou de transmitir uma narrativa engajante, ou de fazer qualquer coisa vibrante nessa história baseada no terror japonês Ju-On: The Grudge (2002).

O Grito (2020) nos apresenta a detetive Muldoon (Andrea Riseborough), que sofreu uma grande perda recente em sua vida, e resolve recomeçar junto de seu filho em um novo lugar. Em uma cidade pequena, no estado da Pensilvânia, a policial se depara com a história de uma mãe que assassinou a família dentro da própria casa. Ao investigar esse misterioso caso, descobre que o lugar foi amaldiçoado por um espírito vingativo. E, agora, ela também se tornou um dos alvos desse fantasma demoníaco, e se quiser sobreviver e salvar a si própria e seu garotinho terá que descobrir como acabar com a maldição que a assombra.

Vale destacar que as duas versões hollywoodianas lançadas no começo do século, pouco acrescentaram ao gênero, e foram facilmente esquecidas pelo público. Aí talvez, esta nova tentativa quatorze anos depois. Lamentavelmente, conseguiram fazer pior, muito pior! Chegando ao ponto de provocar risos (involuntários).

Sustos? Medo? Tensão? Aparentemente, o cineasta – que é conhecido por trabalhar em obras do gênero terror – não tem a mínima noção do que isso tudo signifique.

E, olha que o roteiro – também escrito por Pesce – tenta algo diferente. De modo que a estrutura é disposta de forma não linear, e acompanhamos as vidas e famílias afetadas pela maldição na casa 44 da rua Reyburn Drive. Porém, qual o propósito de elaborar um esqueleto narrativo intrincado, se no fim das contas usará o mesmo artifício toda vez?

Infelizmente, Nicolas Pesce se mostrou um ilusionista de poucas habilidades, dado que é possível notar cada um de seus truques. Mais: eles se repetem do começo ao fim, sem qualquer variação.

Quando o diretor mira assustar o espectador, ele é prejudicado por dois elementos: a trilha sonora que avisa (até mesmo quando se silencia) quando ocorrerá o tal “susto”; e a mise-en-scène (disposição dos elementos na cena) que expõe o horror acontecendo nas costas, ou ao lado das personagens, sempre nas sombras, claro. Existe uma expressão para isso, narrativas como esta recebem a pecha de ‘enredo GPS’, do tipo que avisa alguns segundos antes qual será o próximo movimento a ser feito. Simplesmente deprimente.

Ao longo de 94 minutos, a produção de terror vai escorregando para o ridículo mais e mais. Até usaram uma lente olho de peixe (fisheye) como o olho mágico de uma porta com o espírito demoníaco do lado de fora “querendo entrar”. Pode com um negócio desse? Difícil não cair na bobagem tola.

Dá para tirar alguma coisa boa de O Grito? Sim, duas coisinhas.

A atriz Andrea Riseborough se esforça para tirar algo de impulso deste arranjo embaralhado, e ao menos, mostra alguma vigorosidade nuançada, sempre muito prejudicada pelo texto insosso.

Mas, definitivamente, o único predicado na obra de Nicolas Pesce vem pela cinematografia de Zachary Galler, que usou com muita sensibilidade luz e sombras, criando algumas poucas pinturas na tela do cinema. E só isso!

Em resumo, O Grito entra na coluna das produções incapazes de arranhar a pele do espectador, como Cadáver (2018), ou Maligno (2019); se distanciando de obras mais arrojadas e incômodas, como o agoniante Hereditário (2018), por exemplo.

Mesmo como produtor, Sam Raimi vem apresentando algumas faltas. Ano passado, o fraco Predadores Assassinos, e agora, este filme. Talvez, esteja mais que na hora de Raimi assumir o posto que o tornou um artista renomado, e ajudar a evitar constrangimentos como este.

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