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Crítica | Shade: Entre Bruxas e Heróis

Shade: Entre Bruxas e Heróis chega aos cinemas brasileiros sem fazer alarde. Aqueles que tiverem um primeiro contato com o filme podem imaginar que seu conteúdo é de todo infantil. Contudo, ele deve enganar o público mais superficial que o escolher sem maiores informações. O longa explora uma série de relações humanas nas mais diversas idades, mas usa como viés a perspectiva de duas crianças.

Ambas deslocadas em seu mundo social escolar, as duas crianças de realidades financeiras um tanto distintas acabam por encontrar um no outro uma amizade que partilha de um ponto em comum bastante interessante: a visão fantasiosa de suas respectivas realidades. Enquanto Jovan se mostra mais como um sonhador, que distingue bem sua realidade dos momentos onde se encontra voando pela cidade com a capa balançando com o vento, Milica procura respostas no extraordinário para preencher as lacunas deixadas pelos fatos mundanos que ela não entende ou discorda.

Assim, dá-se a base para uma história muito bem roteirizada por Milos Kreckovic e Marko Manojlovic, que vai levando o espectador por uma mistura interessante de drama com pitadas de aventura fantástica. Embora seja mais fácil perceber essa presença em momentos que retratam, por exemplo, os sonhos de Jovan, a verdade é que toda a construção da narrativa de banha na maneira habitualmente usada para se conduzir uma aventura fantástica. Construção que vai colocando situações bastante comuns nos clássicos de uma forma quase que irônica.

Milica, que se mostra uma menina corajosa e enérgica no dia a dia, acaba entendendo o término do casamento entre seus pais como um feitiço imposto pela nova namorada do pai. Brincando com a questão do esotérico, Milica vai se convencendo de que a mulher é uma bruxa ao tentar classificar os mais diversos campos de atuação da nova madrasta, já que ela nunca havia visto nada parecido. Após de confessar com Jovan, o garoto que tem uma paralisia cerebral parcial, resolve ajuda-la a matar a bruxa a bruxa, vestindo assim, na oportunidade perfeita, seu manto heroico. O que leva o público a acompanhar toda uma preparação para a “caçada à bruxa” e, eventualmente, a própria. São raros os momentos em que a fantasia sobrepõe a visão real das crianças. Assim, os fãs de aventura e fantasia poderão criar eles mesmos as analogias de situação.

Rasko Mijkovic faz um bom trabalho na direção. Apesar de não deixar uma marca impressa, o cineasta consegue muito bem transportar a visão infantil para a câmera. O olhar de Mijkovic acompanha o das crianças, e nos mostra uma visão extremamente real e palpável que, com a ajuda do diálogo entre Jovan e Milica, vai moldando a brincadeira comparativa entre a visão mais inocente dos fatos e a mais maliciosa. Dessa forma, o longa se mostra eficaz para toda a família mas, e apesar de ser consumível para crianças, não chega a ser infantil. Isso, ao menos, pensando no público brasileiro e, ou, estadunidense. Pouco dinâmico, a película foge da lógica normalmente empregada para atrair os mais jovens. Logo, os adultos devem ter uma compreensão e, também, imersão maior ao assistir o filme.

As atuações são todas bastante eficazes, com um destaque mais do que merecido para as crianças protagonistas. Mihajlo Milavic consegue passar toda a aura sonhadora da personagem, bem construída não só pelos efeitos especiais e por sua atuação, mas também pela sua contextualização de filho único, criança mais solitária e sua posição social que lhe permite um quarto lotado de brinquedos. Silma Mahmuti é a grande revelação, porém. A menina está perfeita em seus mais diversos momentos. Sua atitude mais enérgica e bruta a destaca das demais garotas, e a faz forte para suportar as desventuras de chegar em uma nova escola na qual é imediatamente vítima de bullying. A garota mostra muito bem sua raiva, sua frustação e sua tristeza, ao mesmo tempo em que se mostra doce e atenciosa com Jovan, sem perder a aura de criança ao brincar no recheado quarto do garoto.

O longa croata trata de questões bastante interessantes, e se mostra eficaz ao trabalhar a psique de suas personagens. Por não ser raso, o longa se mostra um ótimo produto para os adultos, mas não deixa de conseguir agradar as crianças. Um filme para a família toda que, encara com um olhar infantil problemas maduros.

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