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Elite | Crítica - 1ª Temporada

O público órfão de Gossip Girl, que não consegue se dar muito bem com os lados mais absurdos de Riverdale, com certeza encontrará muita satisfação na mais nova série espanhola, Elite, a segunda a entrar para o catálogo da Netflix depois da aclamada La Casa de Papel.

Embora as duas séries carreguem alguns apelos em comum (além de parte de seus elencos), Elite não procura construir uma trama tão mirabolante quanto La Casa de Papel, preferindo concentrar a maioria de seus esforços em suas intrigas adolescentes e discussões sociais que preenchem boa parte dos episódios. Quando não está retratando seus jovens relacionamentos conturbados, a série dedica algumas sequências pontuais ao seu grande mistério, que permeia toda esta primeira temporada.

Inicialmente, Elite traz a história de três adolescentes que recebem bolsas de estudo para ingressarem em uma escola de alta classe na Espanha. Os primeiros episódios procuram capitalizar em cima dos estranhamentos entre estes supostos protagonistas, e os estudantes ricos que apresentam diversos clichês já vistos em tantas outras séries colegiais. Com o passar do tempo, no entanto, os personagens acabam recebendo tempos de tela mais equilibrados entre si, e suas perspectivas começam a ser melhor ressaltadas para que o espectador consiga simpatizar com aqueles que se apresentavam como antagonistas, até então (Até mesmo a inescrupulosa Lucrecia possui alguns momentos de humanização na reta final).

Boa parte do foco desta primeira temporada se mantém ao redor da personagem Marina (María Pedraza), com o primeiro episódio estabelecendo (através de um vislumbre do futuro) que a jovem será cruelmente assassinada ao longo da história. De maneira eficiente, a série constrói a personagem com muito espaço para conquistar a empatia do público, com sua personalidade amigável e alegre. Ao mesmo tempo, a personagem também apresenta os esforços e obstáculos mais interessantes de serem acompanhados pelo público, o que torna o mistério em volta de seu assassinato muito mais engajante.

Os outros personagens da série, conforme vão sendo melhor desenvolvidos, trazem diversos elementos apelativos ao seu público-alvo, que deve se pegar torcendo fervorosamente por seus favoritos em meio aos triângulos amorosos de Elite. Christian (Miguel Herrán) tem potencial para se tornar um dos personagens mais queridos entre este público, com uma personalidade excêntrica (porém sem exageros) e produzindo diversos momentos sutis de alívio cômico.

Mas a grande questão de Elite, está em sua proposta evidentemente dedicada a agradar um público alvo grande, porém bem específico: os jovens adultos da nossa geração. DIvidida entre tentar ser um típico drama adolescente, e uma história de mistério com desenvolvimentos superficiais, esta segunda linha narrativa traz uma sensação de ter sido trabalhada de maneira secundária durante a execução da série, e apresenta poucos desenvolvimentos realmente relevantes que possam proporcionar a oportunidade do espectador conseguir decifrar este grande mistério.

As tramas românticas, por outro lado, compõem uma enorme parte de todos episódios, e apresentam desenvolvimentos demasiadamente conturbados e dinâmicos. Os americanos costumam classificar este tipo de abordagem como “soapy” (o termo vem de “soap opera”, que significa novela, em inglês, indicando que as relações de determinada história soam imediatistas e melodramáticas demais).Tal abordagem costuma ser muito eficiente para um público mais aficionado, mas também acaba implicando uma certa irrelevância nas trajetórias destes personagens, que parecem mais a mercê de caprichos do roteiro, do que de suas próprias personalidades. Elite contorna estes empecilhos com uma eficiência moderada.

Boa parte das tramas da série gira em torno de algum tipo de tópico socialmente discutido nos tempos atuais. Vários personagens apresentam sexualidades fluidas, que podem acarretar em confrontos ao longo da série, ou apenas comporem a volatilidade de seus romances adolescentes (Omar tem que lidar com o preconceito de sua família por ser gay, enquanto Christian apenas exerce sua sexualidade dentro de seu triângulo amoroso). Marina, sempre em evidência, é portadora do vírus HIV, e fica responsável por produzir um retrato relevante de como a doença é encarada nos dias de hoje, por um público jovem. A relação entre Nadia (Mina El Hammani) e Lucrecia (Danna Paola), por sua vez, traz à tona um dos grandes debates atuais na sociedade europeia: o preconceito contra imigrantes muçulmanos.

Mas o tópico social que mais engata as tramas de Elite, é a diferença entre as classes sociais de seus protagonistas, e as críticas que podem ser feitas à imparcialidade de uma comunidade composta por pessoas mais ricas. Estas críticas tornam-se ainda mais evidentes com a conclusão da série, que prepara um gancho trágico para temporadas futuras.

No último episódio, descobrimos quem foi o responsável pela morte de Marina. O assassinato ocorre muito mais por conta das circunstâncias específicas do episódio, do que por qualquer construção que série tenha feito até então. Inevitavelmente chocante, porém pouco envolvente para o espectador que viu este grande mistério sendo deixado de lado em função dos relacionamentos corriqueiros entre os personagens. E com o assassino sendo um dos personagens ricos, seu crime acaba sendo acobertado sem muitas cerimônias, e a série conclui sua narrativa desta primeira temporada apontando a injustiça da situação, sem muito otimismo.

Como é costume em séries deste gênero, todos os membros do elenco são quase que universalmente atraentes, e se portam de maneira charmosa e sedutora, compondo mais um grande apelo de Elite ao seu público alvo. No que diz respeito às suas atuações, nem sempre contam com o texto mais orgânico ou polido quanto poderiam, mas (de maneira geral) se mostram consistentes dentro de personagens adolescentes tão voláteis quanto a série procura construir.

Elite apresenta todo o potencial necessário para se tornar uma série válida dentro do cenário atual, consciente da responsabilidade de seus retratos sobre o universo adolescente, e repleta de elementos extremamente atrativos para o seu público. Diferente de Riverdale, a série prefere manter sua atmosfera com traços mais sofisticados e escapistas e do que sua comparação, mas se mostra plenamente disposta a abraçar tramas com mais suspense em suas temporadas futuras. Caso consiga equilibrar melhor suas linhas narrativas contrastantes, e desenvolver seus personagens sem que caia nos eternos clichês deste gênero de história, acabará sendo mais uma prova da eficiente proposta da Netflix de apresentar o público mundial a diferentes produções internacionais.

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