Definitivamente, o maior e mais eficiente “guilty pleasure” dos tempos atuais, Riverdale retorna para sua terceira temporada abrindo caminho para desenvolvimentos ainda mais absurdos do que vínhamos vendo, até então.
A série começou sua trajetória apoiada na peculiar proposta de adaptar os clássicos quadrinhos da Archie Comics para a televisão, com uma abordagem muito mais tenebrosa e sensual do que poderia se esperar do material original. Com objetivos mais explícitos em sua primeira temporada, Riverdale foi conquistando o público jovem por conta de seus personagens charmosos, porém imprevisíveis, constantemente colocados em situações fascinantes (as vezes, invejáveis) para o espectador.
Com o final do primeiro ano, no entanto, a série precisou reinventar seus núcleos narrativos e produzir novas tramas que pudessem continuar desenvolvendo seus personagens ao longo de mais vinte episódios, sem perder a sensação de urgência e tensão que conseguia desenvolver até então. O resultado foi um tanto irregular, com algumas tramas soando redundantes, até mesmo inconsequentes ao longo do segundo ano. Os personagens chegaram a passar por evoluções relevantes, mas agora habitam um universo que não possui mais espaço para voltar atrás em seus absurdos, e este será, com certeza, o maior obstáculo desta terceira temporada.
Quando me refiro à absurdidade de Riverdale, estou falando da quantidade de tramas paralelas envolvendo diversos elementos comuns à histórias de suspense e terror, todos coexistindo em um mesmo universo adolescente pouco preocupado com sua coerência à longo prazo, e muito mais disposto a entregar os momentos escapistas e apelativos que envolvem seus protagonistas. Na segunda temporada, tivemos gangues de motoqueiros em guerra, um esquema de crime organizado, envolvimento do FBI (com Archie se infiltrando na máfia), uma caça à um serial-killer, conspirações políticas e várias outras tramas que poderiam render temporadas por si só.
Toda essa dispersão narrativa é sempre regada à intrigas adolescentes, romances novelescos, números musicais e muitas sequências em câmera lenta que, constantemente, relembram o espectador de como todos os membros principais deste elenco são deslumbrantemente atraentes. Chega a ser quase entorpecente, a quantidade de elementos apresentados por RIverdale para fazer com que seu público não perca a atenção, ou o desejo. De maneira geral, é possível dizer que a série permanece plenamente fiel a esta sua proposta original de conquistar o espectador jovem à qualquer custo, mesmo que isto signifique levar suas história para cenários um tanto divergentes, daqui em diante.
Esta terceira temporada começa trazendo tudo o que poderia se esperar de um típico episódio de RIverdale (em maratonas do Netflix, mal se perceberia que uma nova temporada começou). Os protagonistas são apresentados em seus contextos atuais, não tão diferentes assim do que vimos no ano anterior, e estão determinados a livrar Archie (KJ Apa) das falsas acusações orquestradas pelo pai de Verônica (Camila Mendes), Hiram Lodge (Mark Consuelos). Em meio à esta tensão, também temos uma festa de piscina, e uma breve viagem à um romântico riacho (sem se esquecer da briga de gangues). Normalmente, estes contrastes seriam , até mesmo, cômicos, mas Riverdale trata cada uma de suas cenas com muita seriedade, forçando peso dramático sem o menor receio, e não deixando nenhum espaço para o questionamento de sua abordagem frenética.
Ao final deste primeiro episódio, Archie acaba sendo mandado para a cadeia. Embora tal acontecimento sirva para movimentar um pouco a trama em direções menos comuns aos personagens (não tanto assim, afinal, Jughead já passou pela cadeia), é difícil crer que o simpático protagonista permanecerá longe dos outros núcleos narrativos por muito tempo. A real reinvenção de Riverdale para esta temporada (aquela que realmente eleva a série a patamares ainda mais arriscados) vem em seguida, com sua completa e descarada aceitação de elementos sobrenaturais.
Esta integração de rituais demoníacos e cultos sobrenaturais nas tramas de Riverdale não chega com tanta surpresa assim, uma vez que já foi confirmada a estreia da série focada em Sabrina, a “bruxinha adolescente”(Muitos nem sabiam que a famosa personagem fazia parte das antigas HQs de Archie e sua turma). A série de Sabrina, por sua vez, pretende trazer estes aspectos mais fantásticos, sem muitas restrições, e já sabemos que ambas compartilharão o mesmo universo. Sendo assim, era apenas questão de tempo até Riverdale abraçar seu lado sobrenatural, com o qual vinha apenas flertando, desde seu início.
Riverdale é uma série pouco coerente em suas diversas tramas mirabolantes que apresentam pouca relevância entre si, mas nunca poderia ser chamada de uma série inconsistente. Em meio ao seu caos, ao menos se mantém tão caótica quanto o seu público é capaz de acompanhar, sem que este acabe se sentindo alienado. E quando arrisca dispersar, os atributos físicos de seu elenco estão sempre a postos para retomar o foco do episódio. Por mais fútil que, ocasionalmente, possa parecer, Riverdale merece reconhecimento por se manter em constante movimento neste começo do terceiro ano, e conseguir, mais uma vez, intrigar o espectador com seu audacioso mundo cheio de apelos.