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O Príncipe Dragão | Crítica - 2ª Temporada

Se a primeira temporada já indicava tamanha classificação, agora é oficial. O Príncipe Dragão é a perfeita sucessora da franquia Avatar: The Last Airbender, para fã nenhum botar defeito. E com uma mitologia notável, esta segunda temporada comprova ainda mais o potencial que a série tem para conquistar o próprio público.

O Príncipe Dragão é produzida por uma nova produtora de televisão chamada Wonderstorm, composta por profissionais com experiência em videogames como League of Legends e Uncharted. E com Aaron Ehasz (principal roteirista de Avatar) co-escrevendo a animação, a primeira temporada já apresentava diversos elementos que remetiam a abordagem da série da Nickelodeon que conquistou uma legião de fãs pelo mundo.

Esta nova história se iniciou com o atentado à vida do rei Harrow (Luc Roderique), deixando seus dois filhos. Ezran (Sasha Rojen) e Callum (Jack De Sena), em fuga. Os dois príncipes acabam descobrindo um ovo de dragão que acreditavam ter sido destruído, e juntos à elfa Rayla (Paula Burrows), que precisou rever seus ideais como uma assassina treinada para matar os príncipes, o recém-formado grupo parte em direção a terra de Xadia para retornar o ovo ao seu legítimo lar. A premissa, por si só, já é o suficiente para intrigar qualquer fã de fantasias medievais e dinâmicas mais lúdicas que envolvem sistemas mágicos e criaturas fantásticas.

A série traz uma divisão de capítulos que irá agradar os fãs de Avatar, com as temporadas sendo divididas em livros, nomeados de acordo com alguns dos elementos principais que movem o sistema mágico deste universo. E embora tal sistema já traga uma elaboração empolgante, com variações suficientes para atiçar a imaginação de qualquer espectador, o trabalho de construção deste universo é o que realmente chama mais atenção, e demonstra ter fôlego para expandir suas histórias muito além desta jornada principal.

Outras semelhanças com a Lenda de Aang incluem uma atenção especial às sequências de combate, com os personagens tendo estilos de luta bem definidos, de acordo com a classe de cada um (jogadores de RPG já não devem conseguir conter o entusiasmo neste momento). Seja com armas ou com magia, cada combate envolve abordagens distintas e reconhecíveis para cada personagem, tornando estas sequências de ação mais envolventes e memoráveis. O orçamento da série (além da animação mais elaborada), no entanto, não parece permitir que tais sequências sejam tão frequentes ou grandiosas quanto muitos espectadores gostariam (ainda).

A animação de O Príncipe Dragão é composta por uma mistura entre 2D e 3D. Os personagens são construídos com modelos 3D feitos em computador, enquanto cenários menos impactantes são produzidos com quadros em 2D. Como sempre cito em animações, o público infanto-juvenil atual parece estar desenvolvendo uma aversão à animações 2D por considerá-las pouco empolgantes, e a escolha da série de diminuir a taxa de quadros das cenas (dando a sensação de uma movimentação menos fluída) foi feita em função de um apego à forma estilística que, embora louvável, pode desencorajar alguns espectadores.

Esta segunda temporada continua avançando a jornada principal de forma compassada, construíndo arcos narrativos que englobam três episódios de cada vez, com desenvolvimentos pontuais em cada um. Diferente de Avatar, nenhuma das duas temporadas teve episódios isolados (os chamados “fillers”), o que embora torne uma maratona mais dinâmica e envolvente, também priva a série de uma expansão de universo ainda mais rica.

No entanto, a construção e expansão deste universo, até o momento, tem sido deslumbrante de se acompanhar. No segundo arco de episódios, somos apresentados a diferentes regentes de outros reinos humanos, e conhecemos uma jovem rainha chamada Aanya que já deve ganhar o apreço dos fãs com apenas algumas falas, além termos alguns vislumbres sobre a cultura e estética de cada reino, apenas observando a detalhada composição visual de cada regente. Tal atenção aos aspectos visuais é importante para manter o espectador intrigado com este universo, e fornecer material para que os fãs possam especular e imaginar o que poderia existir além desta história.

Há de se notar, também, um trabalho inteligente dos valores progressistas e da representatividade que marcou a franquia Avatar. A tia dos príncipes, uma hábil general surda e muda, que se comunica exclusivamente por linguagem de sinais, é empolgante de se acompanhar em combate, tal qual os fãs prezavam na personagem Toph. Orientações sexuais são tratadas com naturalidade neste mundo, sem gerarem conflitos específicos, assim como questões de preconceito racial não envolvem a cor da pele dos humanos, mas sim suas diferenças com os elfos, por exemplo. São representações não apenas relevantes para a televisão infanto-juvenil atual, como também produzem personagens vigorosamente distintos.

O Príncipe Dragão traz ótimos exemplos de como se trabalhar arquétipos já bem conhecidos do público, de um forma característica e marcante para o espectador. Gatunos, magos e guerreiros são moldes usados à esmo por fantasias como esta, mas é a maneira como cada classe tem suas próprias peculiaridades, obstáculos e progressões que torna este universo tão empolgante.

É possível perceber a intenção da série de manter a franquia em constante expansão, com todos estes esforços voltados para uma maior contextualização da história e da política entre estas raças, e constantes introduções de novos elementos visuais que enriquecem o ambiente destes personagens. Até mesmo um jogo de videogame já está sendo produzido para aumentar impacto da franquia, enquanto a série ainda possui um enorme espaço a ser explorado com seu sistema mágico, que só chegou a arranhar a superfície de alguns de seus elementos principais.

E embora o ritmo da narrativa possa ser frustrante para alguns espectadores mais ávidos pelos grandes embates que estão sendo preparados por esta jornada, estes meros dezoito episódios soam como apenas um exemplo de todas as possibilidades que este mundo ainda pode apresentar. Se os vários reinos e classes já são suficientes para atiçar minha curiosidade, não quero nem começar a imaginar o que poderia ser feito quando decidirem estabelecer diferentes eras e figuras lendárias.

O Príncipe Dragão é uma série que merece a atenção do público, tanto infanto-juvenil, quanto jovens adultos e adultos eternamente interessados por cultura pop. Sua disposição para histórias abrangentes e uma excelente dinâmica de personagens e arquétipos faz com que esta seja uma aposta excitante para a Netflix. Avatar: A Lenda de Aang pode nunca mais ver a luz do dia, mas torço para que os fãs ainda continuem bem servidos com esta nova empreitada, tão empolgante quanto, por um bom tempo.

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