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Game of Thrones | Crítica - 8ª temporada

SPOILERS!

Game of Thrones mudou a história da televisão. Com orçamento de Blockbuster e ambição de um verdadeiro épico, a fantasia de George R.R. Martin ganhou vida pelas mãos de D.B. Weiss e David Benioff, que hoje se transformam em dois dos produtores mais cobiçados e renomados de toda a indústria. A HBO trouxe um espetáculo como poucas produções televisivas ousaram pensar, e que muitas vezes o cinema nem é capaz de alcançar.

Sua última temporada traz grandes responsabilidades, como todo encerramento. E não só um encerramento qualquer, mas o desfecho de uma história que os fãs acompanham por oito anos, e na atual era de streaming e binge watching, Game of Thrones pode ser a última grande série que os espectadores assistirão “juntos”, comentando com a empolgação de uma reviravolta e um novo episódio a cada semana. Diante de tanta pressão, era esperado que Weiss e Benioff cometeriam erros na oitava temporada, e o tempo acabou sendo justamente o maior deles.

Por mais que a série compense o número inferior de episódios com uma duração mais extensa para a maioria deles, não é o bastante para garantir um desenvolvimento apropriado. Weiss e Benioff perdem muito tempo em cenas menos relevantes, como ao ilustrar seus personagens bebendo e se divertindo após o alívio de vencer a batalha, quando deveria estar sendo investido para preparar o terreno para grandes reviravoltas – especialmente aquelas envolvendo o ataque de Euron Greyjoy e a repentina loucura de Daenerys Targaryen.

O arco da Mãe dos Dragões não foi concluído de forma equivocada, como muitos fãs bravaram nas redes sociais após a exibição do episódio. Só foi extremamente apressado e súbito, com os primeiros episódios gastando tempo em romances ruins e pessimamente escritos, como aquele envolvendo Dany e Jon Snow. A intriga interna que se cria com a revelação de Jon ser um Targaryen, e apontado por Varys e Tyrion como um líder mais apropriado do que Dany, é uma solução narrativa empolgante, mas que também se perde na pressa e mau desenvolvimento de seus personagens, que surgem estranhamente descaracterizados.

As decisões da dupla – e de George R.R. Martin, que é produtor da série e está envolvido no processo criativo – são as corretas para a história, mas a execução não as justifica. A virada de chave para Jaime Lannister abandonar sua nobre postura que havia sendo construída por ano, para voltar correndo à Porto Real e Cersei é terrível, e praticamente joga todo seu desenvolvimento no lixo. Curiosamente, nem a icônica vilã de Lena Headey teve tanto destaque aqui, sendo desperdiçada tanto quanto ameaça ou em lhe dar um desfecho mais memorável. Tanto Cersei quanto o Rei da Noite (descartado em um Deus Ex Machina risível) mostraram-se como dois antagonistas desperdiçados nesta reta final.

E quando chegamos ao grande final, a este ponto estava claro que não seria possível agradar a todos. A resposta definitivamente veio como surpresa após Bran Stark ser apontado como o novo governante. Apesar de ser uma cena mal apresentada, com todos os personagens sobreviventes simplesmente sentados em uma roda para decidir o futuro, o texto de Weiss e Benioff foi excelente para justificar a escolha do jovem Stark, quase quebrando a quarta parede para afirmar que o que une o mundo e as pessoas são histórias, e que Bran é a representação desse elo graças à sua conexão com o passado e o futuro.

Confesso que a ideia de Bran governar havia me soado besta de início, o discurso de Tyrion foi forte o bastante, e justifica-se na ideia de que um homem “normal” não seria capaz de ser o Rei certo. Graças ao roteiro surpreendentemente bem escrito no capítulo final, Weiss e Benioff foram capazes de justificar a escolha do novo governante. Não só isso, foram felizes ao trazer desfechos emocionantes e bem pensados para a maioria de seus personagens principais.

Tecnicamente, Game of Thrones continuou impecável, mas com suas exceções. A maior batalha da temporada, marcada no episódio “The Long Night” foi vendida como o grande acontecimento da série, especialmente pela preparação insana de elenco e equipe, que finalmente mostraria a guerra entre os exércitos do Norte contra a invasão sinistra do Rei da Noite e sua congelante frota de mortos-vivos. É uma batalha que acabou prejudicada pela decisão infeliz do diretor Miguel Sapochnik e o diretor de fotografia Fabian Wagner em rodar a cena com uma escuridão que literalmente impediu muitos espectadores de enxergarem o que se passava ali. Um erro técnico que se torna exacerbado em decorrência dos diferentes dispositivos de transmissão, que incluem streaming e TV a cabo, em sua maioria.

Ainda assim, o chapéu precisa ser tirado. Quando conseguimos enxergar a ação na Batalha de Winterfell, o resultado é satisfatório. Game of Thrones já havia flertado com o terror diversas vezes, mas o abraçou por completo em sequências apavorantes que abraçam elementos de cineastas como John Carpenter e Sam Raimi, e que o sempre eficiente compositor Ramin Djawadi é capaz de aprofundar musicalmente. O mesmo acontece no evento climático de “The Bells”, quando Sapochnik registra o ataque de Daenerys e seu dragão em Porto Real como uma verdadeira tragédia, com forte inspiração no caos de O Resgate do Soldado Ryan e a urgência dos planos-sequência de Filhos da Esperança, garantindo um resultado grandiloquente e intenso – que também é sentido na ótima luta entre os irmãos Sandor e Gregor Clegane, um dos pontos altos da temporada. 

E ainda que diversas decisões de roteiro tenham sido infelizes e apressadas, o olhar de Sapochnik e de David Nutter conseguiu suportar suas decisões. O isolamento de Daenerys em planos com diversos grupos de personagens ajudam a construir minimamente sua descida à loucura, enquanto a direção também demonstra um carinho à momentos de afeto genuínos, como o aguardado reencontro entre Jon e Arya e a belíssima cena em que Jaime nomeia Brienne como Cavaleira dos Sete Reinos – pessoalmente, minha cena preferida de toda a temporada.

No geral, o que resume a oitava temporada de Game of Thrones é pressa. D.B. Weiss e David Benioff tinham uma tarefa difícil, e o resultado parece um amontoado de ideias confusas e desleixadas. Felizmente, a dupla conseguiu entregar um final satisfatório, que pode não parecer o mais apropriado, mas se revela como um desfecho emocionante e belo. Pode não ter sido o melhor percurso, mas a história de Game of Thrones se justifica no final, e ela viverá para sempre.

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