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Criminal: Reino Unido | Crítica - 1ª Temporada

Qualquer espectador acostumado às típicas séries policiais procedurais irá perceber o apelo imediato da proposta de Criminal: Reino Unido, a nova produção da Netflix que faz parte de uma iniciativa cativantemente adequada ao formato da plataforma de streaming. 

Criminal: Reino Unido é, na verdade, uma das quatro séries que compõem a coleção Criminal. A proposta deste conjunto de produções é acompanhar, exclusivamente, a fase do interrogatório de uma investigação, com um suspeito para cada episódio, e com cada série se passando em um país diferente. Esta é a primeira das quatro críticas feitas para analisar a coleção completa. Você pode conferir as outras abaixo: 

Criminal: Espanha

Criminal: França

Criminal: Alemanha

O formato procedural de séries policiais americanas é um dos elementos atuais mais cansados da televisão. A casualidade de poder acompanhar investigações sem qualquer compromisso com uma narrativa mais abrangente sempre fez sentido quando a ideia era que o público pudesse assistir episódios esporádicos que passavam em horários pré-determinados. A ironia do formato dentro da Netflix, portanto, é óbvia. Mas ainda assim, séries procedurais podem trazer explorações ricas e divertidas, que conseguem extrair boa parte do potencial de um cenário intrigante, quando se dispõem a trabalhar suas narrativas fugindo das fórmulas costumeiramente atribuídas ao tema em questão.

Criminal, então, dedica-se a construir a tensão destas investigações com apenas um punhado de cenários, mantendo a maior parte do foco na sala de interrogatório. A série reconhece que não tem o luxo de gastar tempo com amplas contextualizações, e com seus episódios girando sempre em torno de quarenta minutos, cada linha de diálogo ou mero enquadramento precisa carregar algo relevante para a construção destas tramas.  

O primeiro episódio desta versão britânica da série serve como uma ótima introdução para o conjunto como um todo, com o detetive comentando sua frustração com a previsibilidade da situação (os típicos clichês e convenções de um interrogatório). E para completar a recomendação de que o espectador comece por aqui, do outro lado da mesa, David Tennant interpreta o suspeito da vez, indo contra a ideia de que toda a “ação” desta história se daria através dos diálogos ao repetir constantemente: “Sem comentários”. 

De primeira, já começamos a reconhecer os elementos da dinâmica que permeia todos os episódios da série. Os detetives optam por uma abordagem específica para o interrogatório, o suspeito apresenta sua personalidade logo nos primeiros minutos, o advogado também já deixa claro qual o seu papel e a sua visão dentro da situação de cada episódio, e a atmosfera da trama é trabalhada pela maneira como o diretor decide evidenciar ou apaziguar cada desenvolvimento. É interessante notar, também, que a sala de interrogatório desta série já é visualmente bem menos entediante do que costumamos ver em outras produções policiais. 

Na trilha sonora, as estratégias são evidentes. Toda a tensão é enfaticamente complementada, assim como os enquadramentos procuram incluir representações que vão além de uma mera linha de diálogo. Esta questão dos enquadramentos pode ser ainda melhor percebida durante o primeiro episódio, e não demora para notarmos como a direção da série procura utilizar o espelho, que separa o interrogatório dos observadores, para providenciar um dinamismo visual maior às cenas, bem como retratar mais personagens simultaneamente. 

Com o personagem de Tennant, a tensão do episódio sobe e desce de forma engajante para o espectador. Durante a primeira parte, com os “sem comentários” constantes, tudo parece indicar que o suspeito é plenamente culpado. Uma vez que este se cansa da repetição e começa a contar a sua perspectiva, a inocência se torna mais plausível, pelo menos até os detetives virarem o jogo de novo com novas informações, e o personagem retornar ao estado “sem comentários”, com a irritante frase se tornando tão impactante quando uma admissão. 

O segundo episódio coloca Hayley Atwell no papel de Stacey, uma personagem que não só é bem distinguível de outros papéis da atriz, como sua personalidade e suas reações dentro do interrogatório contrastam com as do personagem de Tennant no episódio anterior. Para um bom procedural, é essencial que a série consiga demonstrar sua capacidade de revigoração a cada episódio, exibindo diferentes abordagens. Felizmente, Atwell também consegue, inclusive, superar a performance de Tennant (que sempre é tido como o fator chamativo das séries que estrela), e carrega longas falas emocionais capazes de manter as reviravoltas do episódio, relacionáveis. 

Este também é o episódio que retrata, com mais ênfase, um dos aspectos recorrentes da série como um todo. A sala de interrogatório não é onde se busca fazer justiça (isso fica para os tribunais), mas sim onde se pretende descobrir a verdade. Esta simples diferença já serve para distinguir o potencial da dinâmica de Criminal entre tantas comparações procedurais, e coloca o foco de algumas possíveis tramas no aspecto pessoal e emocional do suspeito em questão, mais do que qualquer grande descoberta policial ou reviravolta.

Mas é claro que o espectador passa a esperar grandes reviravoltas de qualquer mistério que acompanhe, e sendo assim, o terceiro e último episódio de Criminal: Reino Unido coloca seus detetives para lidar com uma situação onde as escalas e riscos são ainda maiores, com maior urgência para que se obtenha a confissão do suspeito o quanto antes. Em vários quadros dos episódios, a atenção do espectador se volta para um relógio na parede da sala de observação, que está sempre mantendo viva a noção de tempo limitado para cada interrogatório. 

Mas por mais que os diferentes advogados, suspeitos, circunstâncias e as diferentes abordagens dos interrogadores consigam manter o ritmo da série digno de atenção dentro do seu gênero, maratonar a nova e peculiar produção da Netflix pode ser tornar, facilmente, uma experiência cansativa. Afinal, não é difícil prever que o final de cada episódio deve entregar alguma grande mudança para o caso, ou contar com algum imprevisto no comportamento dos suspeitos que acabará se destacando. 

Para conseguir superar este empecilho da previsibilidade (inerente ao formato), Criminal precisará entregar um nível de inventividade narrativa que vai muito além de se apoiar em performances notavelmente bem trabalhadas por um elenco que carrega grandes responsabilidades nas costas. Quanto a este ponto, no entanto, pelo menos esta primeira leva de episódios não deixa a desejar. 

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