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Elite | Crítica - 2ª Temporada

Creio que seria pedir demais que a segunda temporada de Elite realmente tivesse qualquer coisa interessante a dizer sobre “elitismo”. Mas mesmo dentro de sua proposta maquinalmente apelativa, a série espanhola da Netflix se mostra menos atraente, e sem a inventividade necessária para se revigorar. 

Quando se analisa uma série como Elite, é sempre importante levar em consideração as intenções da produção, e as evidentes estratégias empregadas para alcançar um público-alvo específico. Neste caso, o público em questão são os jovens adultos e adolescentes que buscam um escapismo dramático em ambientes colegiais repletos de intrigas e sensualidade. A primeira temporada não escondia suas intenções descomplicadas, e utilizava o mistério em volta do assassinato de Marina como mero pano de fundo engajante para manter a atenção do espectador enquanto retratava a rotina de seus personagens. 

Em meio a isso, no entanto, o primeiro ano também se esforçava (ainda que relativamente pouco) para ilustrar as diferentes visões entre os ricos alunos do colégio, e os novatos de classe média, bem como algumas breves discussões sobre problemas sociais contemporâneos. Esta nova leva de episódios, por sua vez, demonstra ainda menos interesse em tentar provocar debates relevantes sobre o ambiente colegial que retrata, além de se lembrar apenas ocasionalmente de refletir sobre as diferenças de classe que marcavam sua proposta inicial. E quando o faz, utiliza-se de clichês e convenções tão esquecíveis quanto antes. 

Mas como foi dito, a real intenção de Elite é agradar seu público-alvo com melodramas envolventes, reviravoltas chamativas e sequências superficialmente prazerosas. Tal objetivo continua alcançando um sucesso moderado nesta segunda temporada, com a entrada de personagens que trazem novos conflitos excitantes, ainda que pouco originais. No entanto, a série também acaba dando um passo atrás em sua abordagem provocativa, mostrando-se mais ponderada e dependente da tensão de seu novo mistério, o que pode afastar o interesse de seu público cativo. 

As consequências do assassinato de Marina (Maria Pedraza) reverberam ao longo das novas tramas, mas o novo mistério da vez envolve o prenunciado desaparecimento de Samuel (Itzan Escamilla) com cada episódio trazendo breves trechos de interrogatórios que supostamente deveriam dar pistas sobre o caso ao espectador (felizmente, Marina não retorna como um fantasma para atormentar Samuel durante a nova temporada, e devo dizer que estou me esforçando bastante para não traçar mais paralelos com 13 Reasons Why, ou ficaríamos dando voltas em torno da válida comparação por um bom tempo).

A maneira como a série tratava seu mistério no primeiro ano já trazia uma desconfortável gratuidade, sem muitos esforços para complementar sua trajetória com a resolução do caso em si. O mesmo pode ser dito com ainda mais ênfase desta temporada, que intitula seus episódios com o tempo passado após o desaparecimento de Samuel, mesmo com tais apontamentos não tendo muita relevância. O andamento da nova investigação é salpicado ao longo da narrativa de forma quase arbitrária, visando apenas manter o espectador intrigado (um exemplo claro de subestimação do espectador, empregando estratégia narrativa por mera estratégia). 

Ainda mais segura nesta segunda temporada, Elite raramente chega a confrontar seu público, ou agredi-lo equivocadamente com discursos plastificados e provocações descabidas. Tal abordagem confortável assegura que o espectador possa desfrutar do escapismo da série com pouca pretensão. O elenco incrivelmente atraente, e os triângulos amorosos (além de um eventual quadrado) continuam sendo suficientes para engajar o público e gerar os conflitos necessários para que a temporada nunca se torne enfadonha, ao longo de seus oito episódios. 

Mas é justamente quando a série almeja construir qualquer ideia mais profunda em volta de seus personagens, que seu aproveitamento torna-se consideravelmente menor. Algumas falas em volta da noção de que “errar é humano”, por exemplo, passam longe de ter qualquer propriedade, beirando a irresponsabilidade. 

Afinal, Polo (Álvaro Rico) não cometeu um simples erro meramente digno de advertências, mas a série parece tratar seus atos de forma mais conveniente para o tom mais leve da série do que seria ideal neste contexto. Diga-se de passagem, o personagem é talvez o assassino menos interessante que encontrei na televisão, atualmente, justamente pela falta de interesse da série em explorá-lo como algo além de uma constante ponta solta. 

A primeira temporada havia terminado de forma pouco otimista, apontando a injustiça de um crime acobertado sem muitas cerimônias, por conta do poder e da influência desta “elite”. Mas os roteiristas não parecem interessados em ir além deste apontamento, prezando a impulsividade de seus personagens como o tópico mais importante desta história. O final deste segundo ano não traz muitas resoluções adequadas tanto quanto procura estender a narrativa, e tudo indica que ainda precisaremos esperar mais uma leva de episódios até que a série decida lidar com tais problemas que deixou em aberto. 

Tal atmosfera moderadamente descontraída da série também é gerada pela trilha sonora eletrônica e pela fotografia convidativa. Senti falta, no entanto, de alguns alívios cômicos mais frequentes da primeira temporada (talvez por que o responsável por eles costumava ser o personagem Christian). 

Mas se tem um aspecto recorrente do gênero “young-adult” que Elite mais aproveita, é a maneira como estes jovens colegiais se comportam, na verdade, como adultos confusos e despojados. Os adultos, então, são majoritariamente figurativos, servindo apenas para providenciar status e conflitos superficiais para os personagens que realmente interessam ao público. Na reta final da temporada, um dos personagens chega até a apontar esta liberdade problemática proporcionada por tal distanciamento, e seria bem interessante ver a série se aprofundando nesta reflexão no futuro. 

Elite traz de volta tudo que agradou seu público durante o primeiro ano, mas com menos impacto em todos os sentidos. Menos provocativa, menos intrigante, com tons emocionais menos equilibrados e momentos de tensão menos chocantes. Até mesmo aqueles que foram atraídos pela presença de parte do elenco de La Casa de Papel, podem se frustrar com saída de dois dos integrantes e uma menor participação do terceiro. Para a próxima temporada (já confirmada) a série precisará ousar um pouco mais em suas tramas e colocar seus personagens em posições mais dinâmicas, ou correrá o risco de perder a atenção de qualquer espectador que não esteja acompanhando-a apenas por sua sensualidade casual.  

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