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Lemony Snicket - Desventuras em Série | Crítica - 3ª Temporada

A Netflix não para! Primeiro dia do ano, e ficou disponível a terceira e última temporada de Lemony Snicket – Desventuras em Série, estrelada por Neil Patrick Harris como o impiedoso e camaleonesco Conde Olaf. Esta série original da provedora global via streaming conseguiu com suas duas primeiras temporadas se equilibrar bem com o sucesso entre o público e também da crítica especializada, que ficou com uma má impressão pelo filme lançado nos cinemas em 2004, com Jim Carrey no papel de Olaf.

Esta terceira temporada de Lemony Snicket – Desventuras em Série apresenta, só que de uma maneira mais curta e dinâmica, as mesmas qualidades, e também as mesma irregularidades das temporadas anteriores. Contudo, existe um diferencial: a maturidade do conteúdo, que acoplada à uma grande carga emocional que vem mais do texto que das performances dramáticas dos atores, e inundam o espectador com um choque de realidade que mistura o fantástico e a tragédia, sem fazer o que o próprio narrador da série, Lemony Snicket, adverte na maioria dos episódios que é, ao final, deixar uma impressão extremamente negativa sobre a vida, ao contrário, encoraja nos momentos mais difíceis, que não foram poucos.

Até o início desta terceira temporada, a premissa desta série original Netflix cobriu as vidas dos três irmãos Baudelaire. Violet, Klaus e a pequena Sunny que tiveram seus pais mortos em um misterioso incêndio. Depois de serem informados da tragédia por Arthur Poe, banqueiro pessoal da família, são deixados aos “cuidados” de um parente distante, Conde Olaf, um ator pouco talentoso e determinado a tirar a fortuna dos irmãos Baudelaire. Após os planos de Olaf falharem e ele ser descoberto, os Baudelaire se vêem na situação de ter que fugir de Olaf e seus comparsas enquanto tentam descobrir o mistério sobre uma sociedade secreta relacionada com o passado de seus pais, ao mesmo tempo, que são colocados sob custódia de diferentes guardiões.

Explorar o universo do fantástico sempre foi missão das mais audaciosas, e esta série de histórias baseada nos contos de Lemony Snicket não é diferente. Os gêneros narrativos da série original da Netflix são a de um drama com comédia de humor negro, que nos livros, apesar de serem considerados como obras para crianças, possuem um tom mais misterioso, até sombrio, flertando com o absurdismo e a literatura ficcional gótica. Assim, tanto o texto quanto as performances de boa parte do elenco alcançam sucesso ao transmitir tais elementos, em conjunto de uma boa parcela de encantamento, muito disso por conta dos visuais deslumbrantes, que por vezes, imitam uma peça de teatro, o que é perfeito para o narcisista Conde Olaf.

Sem ser brilhante, mas de grande firmeza, o texto desta terceira temporada só é um pouco mais afrouxado na primeira metade desta temporada. Quando chegamos no quarto episódio, a chave vira, e daí em diante, a narrativa irá embalar em uma escalada até a resolução da história trágica dos irmãos Baudelaire. Sendo que os dois episódios derradeiros, provavelmente poderão fazer mais do que entreter, pois há valorosa reflexão no conteúdo, que serve tanto para a criança, quanto para o adulto.

Tal fascínio pelo estranho, pelo absurdo e obscuro continua a vir muito pela atuação de Neil Patrick Harris, que não esconde alguns dos tiques e facetas de seu personagem mais popular na carreira, o abilolado e sedutor Barney da série de comédia How I Met Your Mother. Nem sempre o talentoso ator acerta o ponto em todas as cenas que faz, isso analisando todas as temporadas, pois acaba por vezes parecendo um truque repetido, porém, são inegáveis duas qualidades que o ator consegue entregar ao público: a primeira, um bom ‘timing’ cômico, algo essencial para criar um certo clima de leveza à uma jornada trágica, e ajuda ter um certo domínio da ironia, especificamente no texto de Lemony Snicket – Desventuras em Série; e a segunda, o quão à vontade, desenvolto o ator se mostra interpretando um personagem que é muito mais do que os olhos podem ver.

Do elenco infantil, todos também se saem bem. Os dois irmãos Baudelaire mais velhos, Violet e Klaus, conseguem equilibrar bem um certo nível de peculiaridade, particular de cada um de seus personagens, e humanidade, que não absolve dos erros, mas resiste em sua inocência, e fragilidade que são típicas na transição para a fase adulta. Geralmente, atores mirins ou adolescentes tendem a escorregar no vício do exagero em cena, caso de Owen Vaccaro em O Mistério do Relógio na Parede do cineasta Eli Roth, contudo, os atores Malina Weissman e Louis Hynes fazem o certo, e deixam o que é de excesso para o roteiro, e se atêm à questão emocional, essencialmente. E, esta será parte do porquê o final desta série original Netflix saiu-se bem em sua resolução.

Duas adições que irão passar despercebidas, infelizmente, pela terceira temporada de Lemony Snicket – Desventuras em Série, são dos atores Richard E. Grant e Beth Grant, que possuem o mesmo sobrenome mas não são irmãos ou casados, com personagens bem excêntricos, mas só isso!

Um aspecto nesta série Netflix que sempre causou uma boa impressão desde o primeiro episódio da primeira temporada, e persiste até o fim desta terceira, é o trabalho da direção de arte, que inclui cenário e figurinos, com um visual que faz lembrar, Tim Burton, ou Terry Gilliam em certos momentos.

Se, em geral, Lemony Snicket – Desventuras em Série conseguiu atrair a atenção de alguns mais do que outros, esta discussão pode pegar tanto curvas objetivas quanto subjetivas para chegar à conclusão de que houve apreço ou não pelo material. Isso é debater ideias, isso é uma forma progressiva de amadurecimento essencial à humanidade que visa, como o tempo, seguir em frente. Ironicamente, virá a mente o episódio final desta série, quando Olaf confronta outro personagem em uma disputa, bem infantilizada como costuma ser, de quem começou a provocar primeiro. Fica fácil relacionar como são as relações das pessoas, ainda mais nos dias atuais, com polarizações de todo tipo.

O narrador, quase sempre avisa ao espectador que esta história não é uma daquelas bonitinhas, mas uma cheia de tragédia, perdas e dor, e tem razão, isso é verdade. Mas, ironicamente nos dois últimos episódios de Lemony Snicket – Desventuras em Série, fica uma reflexão realista, dolorosa, e amadurecida sobre as durezas da vida, e saber ver as coisas como elas são, no total escopo. Contudo, a nota final é edificante, pois imprevisível como é, sempre trará consigo momentos perigosos onde parece que tudo irá se perder, aí entra a gratificação nas grandes tragédias que é a de elevar o ato de sobreviver para se viver, para ter uma, ou mais histórias a se contar.

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