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Festival de Curitiba | Saiba tudo o que rolou nos primeiros dias

Em seu primeiro dia, o 5º Olhar de Cinema – Festival Internacional de Cinema de Curitiba começou exibindo o recém-restaurado documentário italiano, Anna. Recuperado pela Cineteca di Bologna, o longa, dirigido por Alberto Grifi (1938 – 2007) e Massimo Sarchielli (1931 – 2010), em 1975, conta a história de uma adolescente, que morava pelas ruas de Roma, de 16 anos, que acabou sendo acolhida pelos dois.

À tarde, foram exibidos do Olhares Clássicos os longas Amarcord (1973), de Frederico Fellini e Compasso de Espera (1973), o único filme dirigido pelo diretor de teatro paulista, Antunes Filho. Do Olhar Retrospectivo, que nesta edição homenageia o diretor paulista Luiz Sérgio Person, foi mostrado o primeiro filme dele, Panca de Valente (1968). Em Outros Olhares, passou o longa austríaco do diretor Nikolaus Geryhalter, Homo Sapiens (2016). Em Exibições Especiais, foi apresentado o documentário, uma coprodução entre Israel e França, Entre Cercas (2016), do diretor israelense, Avi Mograbi.

À noite, inicio-se a mostra Competitiva, tanto de longas, quantos de curtas metragens. O público curitibano pôde assistir, entre outros, aos curtas Babor Casanova (2015), do suíço Karin Sayad; A Moça que Dançou com o Diabo (2016), do brasileiro João Paulo Miranda Maria, que foi exibida na Competição Oficial do Festival de Cannes deste ano. De longas foram exibidos o italiano Antonia (2015), de Ferdinando Cito Filomarino e o chileno O Vento Sabe Que Volto à Casa (2016), de José Luis Torres Leiva.

O filme indiano Meghe Dhaka Tapa (1960), de Ritwik Ghatak, foi o escolhido para passar em Olhares Clássicos. Já a mostra Outros Olhares passou os longas Rio Corgo (2016), uma coprodução entre Portugal e Suiça, com direção de Sérgio da Costa e Maya Kos; o documentário brasileiro Os Pássaros Estão Distraídos (2016), de João Torres e Diogo Oliveira e Ator Martinez (2015), dos diretores norte-americanos Nathan Silver e Mike Ott.

De curtas, Outros Olhares exibiu o suíço Um lugar que eu nunca estive (2015), de Adrian Flury; os franceses O aquário e a nação (2015), de Jean-Marie Straub e O horizonte de eventos (2015), do colombiano Guillermo Moncayo; a coprodução entre Líbano, Emirados Árabes e França, O escavador (2015), de Ali Cherri e a coprodução entre Brasil e França, Há terra! (2016), da brasiliense Ana Vaz.

Em Exibições Especiais, o longa Informe Geral II. O novo roubo da Europa (2015), de Pere Portabella. Mirada Paranaense mostrou os curtas MMXII (2016), de Alexander Aguiar e Frederico Neto; João & Maria (2016), de Eduardo Baggio; O último retrato (2016), de Arthur Tuoto.

Vistos pelo Observatório do Cinema

O documentário franco-israelense Entre Cercas exibido na mostra Exibições Especiais é documentário simples, mas cujo tema é forte e atualíssimo. O longa mostra refugiados de diversos países da África, como Eritreia e Sudão, que ao entrarem em Israel pela fronteira com o Egito, são capturados e confinados em um local chamado Holot. Eles não ficam presos, porém têm que responder à uma lista de presença três vezes ao dia. Durante as chamadas, eles podem sair livremente em meio ao deserto.

O diretor do longa, Avi Mograbi, realiza um trabalho de teatralização com alguns desses refugiados em um refeitório do exército israelense abandonado, mostrando, por exemplo, qual era a vida deles em seus países de origem, por quais razões os levaram a fugir de lá, como é a travessia da fronteira entre Egito e Israel e o que acham do governo de Israel não os reconhecê-los como refugiados e não os deixarem viver naquele país.

O segundo filme visto neste primeiro dia de festival foi o documentário brasileiro Os pássaros estão distraídos. Ao contrário do Entre Cercas, esse já tem toda uma preocupação estética. O tema do documentário é baseado em um fato da vida particular de um de seus diretores, Diogo Oliveira. Mostra o pai dele que está prestes a se mudar de apartamento no Rio de Janeiro e a relação desse senhor com a velha emprega doméstica, Hilda Atanázio. Diogo e João os mostram de uma forma tocante.

Com giros de câmera pelo apartamento, closes em objetos utilizados todos os dias ou que estavam guardados, longos takes feito pela porta do quarto pai, na cozinha e da janela da sala, captação de sons ambientes, como o da televisão ou da obra em frente ao prédio e de telefonas dados e recebidos, os diretores construíram uma narrativa sobre a passagem do tempo, a relação silenciosa e, por vezes, repetitiva aqueles personagens, inclusive o próprio Diogo, que acaba ajudando na mudança de seu pai.

O terceiro filme desse dia também foi um longa da mostra Outros Olhares, o metalinguístico. Ator Martinez. O ator e perfomer Arthur Martinez, que é técnico de computadores autônomo, morador de Denver, tenta entrar no show business. Para isso, ele contrata dois diretores independentes para fazerem um filme sobre a vida dele. A grande dúvida que paira no ar ao se assistir a este filme é até que ponto o que está ali é ficção ou realidade.

Apesar da aparência de documentário, os diretores Mike Ott e Nathan Silver acabam criando situações para que Arthur saia da zona de conforto durante o filme. Como, por exemplo, chamando uma atriz para fazer o papel de namorada de Arthur. É interessante perceber como aspectos técnicos vão mudando conforme o humor do personagem, como nos momentos em que Arthur se mostra confuso ou irritado com o modo como os diretores estão conduzindo a história e os planos acabam sendo contraluz deixando as pessoas no escuro.

Refletindo sobre a escolha de filmes do dia, percebe-se um eixo que reflete sobre os documentários. Sendo realmente verdadeiros ou um pseudodocumentário, como este estilo de filmagem pode se enriquecido por meios de recursos técnicos como a captação do som ambiente, da movimentação de câmera e exploração da fotografia.

Segundo Dia do Festival

O 5º Olhar de Cinema diversificou mais a sua escolha de filmes e assistiu a curtas, médios e longas metragens, das mostras Outros Olhares, Competitiva e Exibições Especiais.

A primeira sessão do dia foi à do Outros Olhares – Curtas. Nesta foi exibida cinco curtas. São eles o suíço Um lugar que eu nunca estive (2015), de Adrian Flury; os franceses O aquário e a nação (2015), de Jean-Marie Straub e o O Horizonte de eventos (2015), do colombiano Guillhermo Moncayo; a coprodução entre Líbano, Emirados Árabes e França, O Escavador (2015), de Ali Cherri e a coprodução entre Brasil e França, Há terra! (2016), da brasiliense Ana Vaz.

O primeiro curta é um fantástico trabalho de montagem com fotos de monumentos históricos de Atenas, Grécia. Ao reunir diversas fotos das mesmas ruínas e reuni-las, Adrian Flury faz com que locais visitados todos os anos por milhões de turistas acabem sendo vistos de uma forma diferente.

Já Jean-Marie Straub discute o papel dos cidadãos por meio de peixes em um aquário na primeira parte do seu curta, no qual, após um longo silêncio e contemplação, é introduzido uma música clássica. Na segunda parte, a figura de um senhor em frente à uma janela que dá para um jardim lê texto de Malraux sobre as relações de poder envolvidas entre governantes e governados. Por fim, na última parte, um trecho de um filme sobre a Revolução Francesa no qual um prisioneiro que há tanto tempo está preso que seus olhos acabaram tendo problemas para enxergar é solto por seus companheiros e um revolucionário conversa com um aristocrata sobre os novos termos, como, inclusive, cidadão. O revolucionário recomenda que ele parta e, quem sabe, pode até ir para Alemanha.

O Horizonte de eventos do colombiano Guillhermo Moncayo é um filme lindamente plástico. Tendo como pano de fundo, a história de um grupo de homens que acaba desaparecendo na Floresta Amazônica após uma revelação mística, Guilhermo constrói um rico trabalho calcado na captação de imagens. Seja mostrando uma antiga fotografia de dois homens tirada na floresta, seja mostrando a passagem de uma fantasmagórica canoa em um rio à noite, cujas luzes refletem nas folhas das palmeiras, ele conseguiu fazer com que cada uma das cenas tenha sua poética própria.

Em O Escavador, Ali Cherri mostra a vida de um trabalhador de uma escavação arqueológica que acaba se tornando uma espécie de guarda dos restos mortais encontrados. Com cenas cuja sensibilidade dialogam com as do O Horizonte de eventos, Ali mostra a rotina desse homem que passa os dias a arrumar e a vigiar em um deserto crânios e ossos de pessoas há muito tempo já mortas. O deserto, a forte luz do sol, a forte luz da lanterna carrega pelo escavador, o barulho do vento, o barulho dos insetos a noite ou de dia e os diferentes ângulos da câmera é que contam a história.

O franco-brasileiro Há terra!, de Ana Vaz, é mais um dos curtas cuja preocupação com a captação de som do que está sendo contado está presente. A história, infelizmente, não fica muito clara. Percebe-se a preocupação com a existência do problema da posse de terra no Brasil, principalmente, por causa de uma rápida cena na qual aparece uma casa com a bandeira do MST, porém, o tema do curta não fica claro. Há algumas imagens muito bem feitas de uma jovem que conta uma história em um microfone, de animais em um zoológico, como se dissesse que há espaço até para aprisionar animais, porém não há terra para muitas pessoas, porém os efeitos na hora de captar a imagem e o efeitos de pós-produção utilizand por Ana acabam deixando o curta um pouco confuso.

O primeiro filme da Mostra Competitiva foi o média metragem Maestá, A Paixão de Cristo, do francês Andy Guérit. Esse filme é um ótimo exemplo de inventividade. Andy também é artística plástico e este é seu primeiro filme. Ele reproduz na tela grande o políptico – quadro com diversas cenas, neste caso, 26 painéis – do mestre sienese Duccio di Buoninsegna, do século XIV. Como o próprio nome do filme e do quadro diz, ele conta a história de Jesus Cristo. Porém, Andy dá movimento aos personagens dos painéis que se movimentam de um a outro. A falta de perspectiva dos quadros daquela época é reproduzido fielmente por meio dos cenários que são carregados pelos próprios atores. Ao final, o políptico é reproduzido em sua íntegra. Muito interessante de ser assistido.

Em Exibições Especiais, foi mostrado o trabalho de restauração feito em animações realizadas pelos irmãos Wagner, do Paraná, nos anos 1980. Formado por Ingrid, Rosane, Elizabeth e Helmut, os irmãos iniciaram seus trabalhos ainda adolescentes fazendo animações por meio de desenhos pintados, – há trabalhos com mais de 12 mil feitos –, e gravados em Super8. Eles, depois, trabalharam em outros formatos, como 16 e 35mm. Suas animações iniciais, apesar da pouca experiência e dos poucos recursos, já eram de uma grande inventividade, inclusive um primitivo 3D, com que objetovos se destacassem na tela. Conforme envelheceram, seus trabalhos se enriqueceram tanto visualmente, quanto em relação ao roteiro. Um ótimo exemplo é a produção A Cidade dos Executivos, onde percebe-se um apurado senso estético através do traços e da utilização das cores, quanto o tema que é uma crítica ao modo enlouquecido de se viver em uma cidade grande com grandes engarrafamentos e sem espaço para crianças brincarem.

O filme com o qual se encerrou o segundo dia de festival foi o chinês Um Outro Ano (2015), de Shengze Zhu. Em um trabalho quase antropológico de três horas, Shengze mostrada uma família de Wuhan de janeiro de um ano até o ano seguinte. Um filme muito interessante para se conhecer o convívio dentro de uma família formada por um casal com duas filhas e um filho e a avó paterna. Mas cinematograficamente muito pobre. Simplesmente, uma câmera em um determinado ponto da casa onde a família está, voltada para o lado oposto, gravando por um bom tempo as pessoas presentes. Ela vai mostrando um determinado tempo, de um determinado dia, de cada mês. Tendo, por isso, 13 takes, apenas, em três horas de duração. Uma produção que precisa se estar muito bem para poder assisti-la inteira.

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