Após o razoável Tudo por um Pop Star, a carismática Maísa Silva parecia começar uma nova e promissora fase nos cinemas com produções que, embora pouco ambiciosas, oferecem um entretenimento caprichado ao público-alvo de garotas e garotos pré-adolescentes. Repetindo a parceria com o diretor e roteirista Bruno Garotti, Maísa agora estrela Cinderela Pop, uma reformulação do clássico conto de fadas com uma roupagem moderna e 100% mais música eletrônica envolvida. A obra, no entanto, é menos bem-sucedida que a produção anterior, sofrendo com problemas de roteiro e uma execução hiperativa que por vezes a torna irritante.
A introdução ao mundo de Cinderela Pop é trôpega, com uma acelerada sequência de eventos que ocorrem em uma festa da família de Cíntia Dorella (Maísa), que sonha em cursar produção musical para um dia se tornar uma DJ. Quando decide fazer uma releitura de Für Elise no piano em homenagem ao casamento de seus pais, seu pai careta, César (Marcelo Valle), reage mal e a festa sai do eixo. Logo depois, o pai é flagrado junto com Patrícia (Fernanda Paes Leme), o que bota um fim nos laços entre César e a mãe de Cíntia, Ana (Miriam Freeland). A novela dos minutos iniciais pouco acrescenta além de estabelecer a descrença de Cíntia no amor romântico.
Dois anos se passam e vemos Cíntia em uma outra fase, agora morando com a tia Helena (Elisa Pinheiro) e o namorado DJ da mesma, Rafa (Sérgio Malheiros). A garota sente-se à vontade nessa nova residência, livre para praticar suas habilidades de DJ e demonstrar suas aspirações musicais. Isso até que um dia é chamada para um job, que por coincidência é o aniversário das filhas gêmeas de Patrícia, Graziele (Letícia Pedro, de DPA) e Gisele (Kiria Malheiros), e atrai a atenção do jovem músico Freddy Prince (Filipe Bragança), cujo som romântico e meloso não é do seu gosto mas que vem a ser seu interesse amoroso – o sobrenome já entrega seu papel de bandeja.
Fica claro em pouco tempo que o roteiro de Cinderela Pop dá voltas desnecessárias para chegar ao essencial do conto no qual se inspira. Mesmo que seja uma maneira de diferenciar-se da obra original e de suas diversas adaptações, inclusive criando novas peculiaridades para suas coadjuvantes – como por exemplo a tia que guarda um animal para cada amante passado -, a sensação é a de que o longa tropeça frequentemente por conta das tantas complicações e coincidências que coloca no caminho de seu enredo. Até mesmo o surgimento do nome Cinderela no longa é mais engenhoso do que o necessário, até porque já estava refletido no trocadilho encontrado no nome real da protagonista.
Soma-se a tudo isso uma condução artificial, que não permite que cada cena tenha seu respiro e que cada sentimento ganhe volume. No campo técnico, destaca-se de forma negativa a trilha sonora, ininterrupta e histriônica, que torna a progressão de cena a cena cansativa, por vezes interrompendo uma melodia para logo começar outra sem qualquer fluidez. O mesmo vale para muitas das cenas, numa sucessão de eventos que se atropelam – talvez o trecho mais bem construído seja aquele ambientado na boate Midnight, numa montagem paralela bem humorada entre as personagens jovens flertando com seus pares, por permitir que a situação se desenvolva com mais tempo de tela.
Estranhamente, é apenas no ato final que Cinderela Pop se assume mais à vontade como uma adaptação de uma história já tão conhecida, mas ainda capaz de render boas experiências. Porém, neste caso, o esforço em se diferenciar é tanto, mas tanto, que acaba deixando o trabalho aleatório, especialmente nos figurinos e sets inconsistentes – a mescla entre elementos visuais fabulescos e outros modernos cotidianos nunca aparenta natural ou sequer real. Os únicos acertos, quanto às alterações, vem na forma dos comentários que a obra faz sobre a importância do amor próprio e sobre como o amor romântico pode ser subestimado.
Estes detalhes, contudo, perdem força quando o longa decide seguir o conto original mais à risca, justo quando havia a possibilidade de realmente subverter seus elementos para um efeito positivo. Como em Tudo por um Popstar, em Cinderela Pop há a realização de uma meta principal em paralelo com alguns aprendizados. Aqui, a grande meta passa a ser a conquista do rapaz “colírio”, e assim como no longa anterior ela é alcançada sem naturalidade. Porém, enquanto em Popstar havia uma ênfase mais perceptível nas amizades das protagonistas e suas histórias pessoais, desta vez os objetivos paralelos, que no caso mereciam o destaque, mal ganham corpo.
Cíntia quer conseguir uma bolsa de estudos em Londres e produzir o tipo de música que tanto gosta, mas o longa trata a conquista de seu príncipe como a vitória máxima da garota na narrativa. Nota-se que tudo que a diferenciava das outras garotas do longa, como a preocupação profissional, uma visão mais pé no chão do amor e a independência de uma figura masculina, servem apenas para que Cíntia chegue mais perto de se tornar a típica princesa que sempre vemos. Apenas que, desta vez, é uma princesa pop – uma descrição tão vaga quanto a releitura oferecida pelo filme.