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Crítica | Johnny English 3.0

Há décadas, sátiras de filmes de espionagem chegam aos cinemas e à televisão, inclusive em diferentes formatos. As mais famosas até hoje: Agente 86, Austin Powers e mais recentemente Kingsman. Cerca de 15 anos atrás, Rowan Atkinson, o Mr. Bean, teve sua primeira chance de parodiar o gênero com Johnny English, comédia de sucesso modesto mas que, por conquistar uma base de admiradores no Reino Unido, ganhou uma sequência em 2011, menos bem-sucedida.

O estilo de humor assumidamente careteiro de Atkinson já demonstrava claros sinais de desgaste, tanto nos filmes de Bean quanto do espião atrapalhado English. Esse desgaste se devia à repetição dos truques do ator, mas devo admitir que ainda era capaz de arrancar boas risadas. Mesmo assim, era uma carreira que parecia ser enterrada. Eis que, em 2018, Atkinson volta de surpresa com Johnny English 3.0, mas comprova que aprendeu poucos novos truques.

Numa trama que parodia elementos de Operação Skyfall, Johnny English (Rowan Atkinson) é retirado de sua aposentadoria após um ataque cibernético revelar as identidades de todos os espiões da MI7 alocados ao redor do mundo. Profissional de métodos mais analógicos e pouco contato com tecnologias, parece a escolha perfeita para a missão, difícil de ser rastreado. Sua agência, contudo, não contava com a burrice tremenda do agente, cuja missão é descobrir a identidade do hacker responsável pelo ataque.

Apesar de trazer o espião de Atkinson aos dias de hoje, Johnny English 3.0 não aproveita suas oportunidades de atualizar as aventuras do espião substancialmente. O roteiro escrito por William Davies, argumentista dos dois longas anteriores, não parece ter acompanhado os tempos, soando como um projeto escrito ainda no início da década. O vilão, por exemplo, vem na forma de Jason Volta (Jake Lacy), um CEO de uma grande empresa no ramo da tecnologia, satirizando figuras como Mark Zuckerberg e Elon Musk sem fugir do óbvio.

Davies até tenta subverter em alguns elementos, chegando a comentar o machismo do personagem. Quando está claramente exposto e sendo enganado pela russa Bhuletova (Olga Kurylenko), English está mais preocupado em galanteá-la do que fazer seu trabalho, deixado no colo do parceiro Bough (Ben Miller). Por falar no ajudante, que retorna do primeiro longa, ele infelizmente tem bem menos a fazer aqui do que no original, e sua dinâmica com English fica subaproveitada. Uma pena, já que era um dos pontos altos do filme de 2003.

Em comparação com seus precursores, Johnny English 3.0 decepciona bastante nas piadas. Enquanto o primeiro longa tinha uma boa sucessão delas e o segundo era capaz de atualizar o personagem para a era Bourne, mesclando humor pastelão com boas cenas de ação, este novo filme dirigido por David Kerr marca dois passos atrás para a franquia, ficando como uma imitação pálida que não cria, só recicla – e recicla mal, para piorar. Muito do filme recai sobre Atkinson fazendo as mesmas caras e bocas, como numa comédia com Leandro Hassum.

Apenas dois momentos de humor são dignos de nota. O primeiro deles é agradável e envolve uma invasão a um iate, no qual English e Bough sobem pelo casco usando botas magnéticas. O outro, que coloca English em um treinamento com óculos de realidade virtual, é a cena mais visualmente inspirada e chega perto da hilaridade, com o agente solto por Londres e atacando civis aleatórios com baguetes e livros. De resto, não há muito o que destacar, limitando-se às palhaçadas mais básicas.

Claro, isso depende do quanto o espectador ainda aprecia o estilo de Atkinson, mas como alguém que viu o primeiro Johnny English incontáveis vezes sem cansar – confesso -, o repertório do ator está limitado, assim como o resto do elenco. Até mesmo a grande Emma Thompson, que praticamente não errava uma, surge com pouco brilho aqui – devo dizer que, com um material desses em mãos, a falta de entusiasmo é compreensível. O mesmo vale para Kurylenko e Lacy.

Geralmente, tem-se a noção de que os britânicos possuem um humor mais sofisticado do que norte-americanos em suas comédias. Por mais que esta noção ainda se prove correta em certos casos, como o maravilhoso As Aventuras de Paddington 2, o mesmo não pode ser dito de Johnny English 3.0. O resgate de um humor mais simples e inocente até poderia funcionar como um respiro de ar fresco em meio a comédias de ação americanas, mais cínicas e violentas. A volta de Atkinson, porém, prova que algumas coisas devem evoluir ou simplesmente ficar no passado.

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