Filmes

Crítica | O Manicômio

O terror found-footage, popularizado em 1999 com A Bruxa de Blair, renovou-se algumas vezes na últimas duas décadas mas agora parece finalmente ter atingido uma parede. Quando não há um autor que use o formato com mais inteligência, como M. Night Shyamalan em A Visita ou até mesmo Barry Levinson com The Bay, sobram produções como O Manicômio, que tentam tirar leite de pedra ao juntar o registro de falso documentário a histórias básicas de terror e suspense, com resultados no máximo medíocres.

A trama de O Manicômio é em si promissora, com um grupo de jovens vlogueiros que decidem participar de um desafio: passar 24 horas em um manicômio que muitos dizem ser assombrado. Entre eles, há uma dupla de rapazes responsáveis por um canal de pegadinhas – terrivelmente chamado de Pegadinhas.TV -, uma vlogueira de moda obcecada por sua própria imagem, uma vlogueira mediúnica que realiza vídeos sobre superar seus próprios medos e, por fim, o ex-namorado desta última, que age como guia de todos durante a visita ao local.

Há muito potencial, a princípio, no comentário que o diretor e roteirista Michael David Pate quer fazer sobre uma geração preocupada em se apresentar diante de câmeras, buscando estrelar algum tipo de espetáculo a todo momento. A apresentação dos personagens e seus respectivos canais é coerente com o que se vê hoje em vlogs, fazendo até mesmo alusões a polêmicas recentes – uma pegadinha em um necrotério remete diretamente ao péssimo vídeo no qual o youtuber Logan Paul filmou um cadáver – para criar a impressão de uma sátira ácida e irreverente sobre esse tipo de produção de conteúdo.

No entanto, quando o elenco passa a ser caçado pela entidade maligna que assombra o local, o longa se atrapalha com a proposta. Apesar de ser coerente com essa ideia de que os vloggers querem se manter presentes diante das câmeras – talvez uma maneira de permanecerem vivos? -, a direção de Pate é cansativa, se não irritante, ao insistir nos mesmos movimentos repetitivos de câmera para construir essa relação no terror. Com celulares e outros dispositivos de gravação nas mãos dos atores, os planos geralmente consistem entre panorâmicas rápidas que vão dos rostos ao cenário e de volta, de novo e de novo, para no último movimento alguma assombração aparecer.

Tenta-se, então, compensar o fraco trabalho de câmera com uma ambientação realmente sinistra e um certo cuidado com a iluminação, seja nas imagens diurnas – os feixes de luz que atravessam janelas e frestas, sombras que surgem pontualmente – ou nas noturnas – o quarto com as velas, a perseguição com os flares. Como de costume nesse subgênero, o desenho sonoro também é um elemento crucial para que exista alguma autenticidade, ora indicando a proximidade de uma ameaça, com grunhidos e o bater de asas de insetos, ou o total isolamento com um silêncio perturbador.

Ainda assim, não há situações dignas de nota que coloquem essas poucas qualidades em bom uso. Muitos dos sustos, aliás, são realizados como jumpscares e da forma mais genérica possível: uma deixa musical alta, algo que torna tudo imediatamente menos crível. Porém, outro aspecto que prejudica bastante uma imersão é a dublagem – o filme, que é alemão, chegou ao Brasil apenas em cópias dubladas. O maior problema dela não chega a ser exatamente a diferença entre as línguas portuguesa e alemã, implicando uma dificuldade adicional de sincronizar lábios, mas sim a falta de uma reverberação convincente nas falas que as situe naquele espaço físico.

Tudo soa como numa cabine de gravação, com alguns ajustes, e as falas nunca mesclam o suficiente com as imagens e o restante dos sons. Dentro daquele manicômio, há espaços abertos e outros fechados, portanto a dissipação do som deveria ser específica para cada um deles, mas isso não chega a ser sentido. Pode parecer algo bobo, mas para um longa que aposta tanto no trabalho de som para criar atmosfera, a dublagem chega a ser uma distração quase fatal, mesmo que as interpretações mostrem algum esforço e os tradutores tenham apostado em termos locais para caracterizar o elenco – deve ser a primeira vez que escuto o termo “top” em um longa estrangeiro.

Entretanto, O Manicômio talvez nem sofra tanto com isso como sofre com sua resolução. Resgatando em um último momento o elemento de sátira sugerido no início, Pate entrega uma reviravolta tão engenhosa quanto estúpida para explicar os acontecimentos mais absurdos do filme, inclusive comentando sobre algumas de suas piores decisões – “achei a trilha um pouco exagerada”. O uso da Sinfonia no. 7 de Beethoven – aquela mesma do final de Presságio – tenta dar um ar mais elegante ao momento, mas a sensação é uma só: a de que fomos vítimas de uma grosseira pegadinha.

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