Filmes

Crítica | Uma Nova Chance

Apenas uma semana após o lançamento de Eu Sou Mais Eu, chega aos cinemas uma produção que levou a ideia de retornar ao início dos anos 2000 ainda mais a sério. Não há nenhum tipo de viagem no tempo em Uma Nova Chance, mas fica a dúvida se o filme estrelado por Jennifer Lopez e dirigido por Peter Segal (Como se Fosse a Primeira Vez) tenta recapturar fielmente todos aspectos bons e ruins das comédias daquele tempo ou se apenas soa completamente datado por sua mentalidade corporativa – ou os dois.

A trama assinada por Justin Zackham e Elaine Goldsmith-Thomas parte de uma causa nobre: empoderar a protagonista Maya (Lopez), uma mulher latina de meia idade que trabalha em uma rede de supermercados e que se vê congelada no mesmo cargo ao ser frequentemente ignorada por seus superiores. Quando tem a chance de uma merecida promoção, a preferência é dada a um homem que acabou de chegar no estabelecimento, deixando-a desacreditada com suas capacidades de ascender profissional e economicamente.

Porém, quando o filho hacker de sua melhor amiga Joan (Leah Remini) cria um currículo falso para Maya, ela é chamada para fazer consultoria em uma grande empresa de cosméticos. Com nada a perder, a protagonista aceita a oportunidade e deve sustentar sua farsa, fingindo ser uma poliglota formada – com louvor ainda – em Harvard. Mas para garantir um cargo permanente, ela deve se provar e criar uma linha totalmente orgânica de cosméticos, concorrendo com outro grupo de funcionários liderados pela determinada Zoe (Vanessa Hudgens), a filha do chefe.

Há outras coisas acontecendo no enredo, como o namorado que quer constituir uma família com Maya e ainda um casal de coadjuvantes geeks, e a sensação que fica é a de excesso. Excesso, por sua vez, que resulta em um embaraçamento das tramas e núcleos, especialmente quando chega uma grande e conveniente reviravolta que liga Maya e Zoe. Esta ligação, aliás, em tese é muito mais essencial à trama do que qualquer outra, mas se perde no meio de detalhes e arcos que poderiam facilmente ser enxugados ou mesmo descartados por completo.

O longa de Segal também é incapaz de conciliar as intenções de ser uma comédia corporativa escrachada ou um drama meloso sobre o efeito que as escolhas do passado tem sobre o presente. Isso fica claro até porque uma dessas partes – a comédia – é bem mais atrapalhada que a outra, desviando o longa em uma série de momentos vergonhosos que mais parecem pertencer a um filme da laia de Adam Sandler – o jantar com um executivo chinês, no qual Maya fala um mandarim improvisado, parece coisa de um passado distante.

Além do mais, ainda sobre o elemento cômico, a farsa da protagonista é mantida intacta por uma série de conveniências e simplificações que não soam naturais nem para uma comédia com tais aspirações. Sempre que encontra um beco sem saída, Maya é salva por um deus ex machina ou uma epifania óbvia – um produto que junta três em um? Brilhante! Até o bombardeio de Hiroshima na 2ª Guerra Mundial é usado como um artifício de roteiro, levando ao sucesso de sua missão farmacêutica.

Porém Uma Nova Chance não é o completo desastre que parece. O elenco – exceto por Millo Ventimiglia e seu falso sotaque do Queens – faz um bom trabalho no geral, mesmo com as personagens mais unidimensionais ou caricatas. Jennifer Lopez, no caso, é a atração principal, e embora tenha entregue interpretações melhores no passado, ainda possui carisma e convence no drama emotivo. Além disso, sua química com Leah Remini exala bastante sinceridade, mas isso talvez se deva à amizade real das duas atrizes – ainda assim é algo que entretém e agrega.

De qualquer maneira, Uma Nova Chance fracassa no que mais quer transmitir. Como a linha de falsos produtos orgânicos que Maya critica por usarem componentes artificiais, o longa sufoca seus aspectos mais sinceros debaixo de uma porcentagem de elementos incluídos apenas para respeitar fórmulas e cumprir demandas. Mas no fim, é o mesmo que misturar água e shampoo: talvez funcione para prolongar a duração do produto, mas não acrescenta nenhuma sustância – só dilui. A mensagem final, por sua vez, é simplista, atestando que “a única coisa que te impede é você”. Talvez faça sentido… mas tenha uma árvore milagrosa de Hiroshima em casa, só para garantir.

Sair da versão mobile