Marighella marca a estreia de Wagner Moura na direção em uma produção que relembra uma importante história ocorrida no período da ditadura no Brasil. Para conseguir chegar aos cinemas nacionais, o longa estrelado por Seu Jorge afirma que teve que justamente passar por cima da censura, tão usada no regime militar.
O Observatório do Cinema esteve presente na cabine para imprensa de Marighella em São Paulo. Após a exibição de Marighella, o diretor Wagner Moura e a produtora Andrea Barata destacaram a trajetória do filme, que seria lançado em 2019, mas só conseguiu liberação para estrear neste 4 de novembro de 2021.
A data não é uma coincidência. Ela marca o aniversário de 52 anos da morte de Carlos Marighella.
“Foi muito angustiante o filme não ter estreado quando queríamos que estreasse. Foi muito difícil pra mim particularmente. Todo esse sucesso, esses prêmios, essa alegria, isso é tudo muito bom. Mas, nada disso fazia sentido sem chegar nesse momento que chegou agora, de entregar esse filme no Brasil e a gente ter recebido esse amor tão grande desde a nossa estreia em Salvador, no teatro Castro Alves, na terra de Marighella”, declarou Wagner Moura.
Para o diretor e a produção, a demora aconteceu apenas por conta de uma censura da Ancine.
“Eu tenho falado bastante sobre a censura. Eu não tenho a menor dúvida de que o filme foi censurado. Os pedidos negados pela Ancine, feitos pela O2 (produtora), foram negados em um momento em que (Jair) Bolsonaro falava abertamente sobre filtragem na Ancine, ‘Ou vai ter filtragem na Ancine, ou vai ter que acabar’.
Não foi só com a gente, era uma época que falavam que filme da Bruna Surfistinha não pode ter, editais LGBTQs eram cancelados inexplicavelmente, que o Crivella (ex-prefeito do Rio de Janeiro) nessa mesma onda cancelou as HQs que tinham uns caras se beijando na boca, enfim era um contexto”, completou o diretor de Marighella.
O caso da HQ citado por Wagner Moura é da Bienal do Livro de 2019, em que a prefeitura do Rio de Janeiro tentou recolher os quadrinhos dos Vingadores, da Marvel, que traziam os personagens Wiccano e Hulkling se beijando.
Ataques no IMDb contra Marighella e alegação de desmonte na Ancine
Além da dificuldade na liberação de Marighella para o Brasil, ainda existiram ataques no IMDb contra o filme por motivo político. Usuários começaram a “bombardear” o título com nota mínima para prejudicar o longa – a plataforma identificou o ataque e excluiu essas avaliações.
“Eu queria lembrar que esse ano a Ancine faz 20 anos e durante 18 anos esteve ao lado dos produtores brasileiros. Saiu do zero e levou o cinema nacional ao mundo. Faz dois anos, desde que Bolsonaro assumiu (a presidência), que a agência foi desmontada, que a cultura foi desmontada. Isso sim é uma forma de censura”, explicou a produtora Andrea Barata.
A alegação da produção de Marighella, bem de como outros artistas brasileiros, é que a Ancine, após mudança na direção, parou de ajudar em “questões burocráticas”, como fazia antes. A partir disso, a Agência Nacional do Cinema teria passado a atuar com motivações políticas.
“Não foi possível resolver as questões de Marighella, que eram simples, por censura. Então, teve censura sim. Todos os filmes brasileiros, todos estão sofrendo isso”, destacou a produtora, que já trabalhou em diversas obras como Cidade de Deus, Cidade dos Homens, Ensaio Sobre a Cegueira, Trash – A Esperança Vem do Lixo e Mulheres Alteradas.
Anteriormente, a Ancine limitou-se a explicar as recusas para estreia de Marighella por motivos burocráticos ou técnicos. Em 2019, a agência comunicou que a produção não teria conseguido “cumprir a tempo todos os trâmites” para a arrecadação de verba para distribuição.
Após essa polêmica, Marighella está chegando aos cinemas nacionais. Conheça abaixo a trama do filme e o elenco comandado por Wagner Moura.
A trama e o elenco de Marighella
O filme de Wagner Moura é baseado no livro de Mário Magalhães, que tem o título Marighella: O guerrilheiro que incendiou o mundo. A obra foi adaptada pelo diretor e também por Felipe Braga, de Sintonia e Samantha!.
O longa acompanha a história de Marighella nos anos 1960, quando a ditadura começa no Brasil. Escritor e político, Carlos Marighella se tornou um dos principais guerrilheiros brasileiros, liderando um dos maiores movimentos de resistência contra o regime, a ALN (Ação Libertadora Nacional).
“Comandando um grupo de jovens guerrilheiros, Marighella (Seu Jorge) tenta divulgar sua luta contra a ditadura para o povo brasileiro, mas a censura descredita a revolução. Seu principal opositor é Lucio (Bruno Gagliasso), policial que o rotula de inimigo público nº 1. Quando o cerco se fecha, o próprio Marighella é emboscado e morto – mas seus ideais sobrevivem nas ações dos jovens guerrilheiros, que persistem na revolução”, diz a descrição do filme.
O elenco é liderado pelo cantor e ator Seu Jorge. Além disso, conta com nomes conhecidos como Adriana Esteves como Clara; Ana Paula Bouzas sendo Maria; Bruno Gagliasso interpretando Lúcio; Bella Camero vivendo Bella; Herson Capri como Jorge Salles; Humberto Carrão no papel de Humberto; Jorge Paz como Jorge; e Luiz Carlos Vasconcelos sendo Branco.
O filme ganha ainda uma participação especial. Maria Marighella, neta do guerrilheiro, aparece durante o longa como a própria avó, Elza.
Antes de chegar ao Brasil, Marighella foi exibido em diversos festivais internacionais, passando por cidades como Berlim, Seattle, Hong Kong, Sydney, Santiago, Havana, Istambul, Atenas, Estocolmo e Cairo – no total, foram 30 exibições nos cinco continentes.
O filme brasileiro foi elogiado pela crítica por onde passou. No Rotten Tomatoes, no momento, a nota de Marighella é de 88%.
“A vontade de fazer esse filme nasce da vontade de devolver ao popular imaginário brasileiro a figura desse cara que teve a vida silenciada. Como Jorge Amado diz na lápide de Marighella, ‘Amaldiçoado, retiro da maldição e do silêncio e inscrevo aqui o seu nome de baiano’.
Então, eu queria isso, sempre fui fascinado por histórias de revolta popular e muito indignado, muito perturbado sobre como essas histórias eram contadas, sobretudo essa da resistência da ditadura militar que é uma geração muito próxima da minha”, contou Wagner Moura sobre a motivação para transformar Marighella no primeiro filme dele como diretor.
Com direção de Wagner Moura, Marighella chega nos cinemas brasileiros em 4 de novembro. Confira abaixo o trailer do filme estrelado por Seu Jorge.
*Com colaboração de Alexis Perri