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Mostra SP | Crítica: Guerra Fria

O cineasta Pawel Pawlikowski fez um nome para si, de 2013 para cá. Pois naquele ano, lançou Ida, obra laureada com inúmeros prêmios, incluindo um Oscar de melhor filme estrangeiro entregue pela Academia, tornando o filme de Pawlikowski, o primeiro na história da Polônia a levar a estatueta do homem dourado. Verdade seja dita, Ida é realmente muito bom. Portanto, se espera bastante do diretor polonês hoje em dia. Infelizmente, Guerra Fria que será exibido na Mostra SP não chega perto do nível de sua obra mais conhecida, apesar do fato do cineasta ter levado o prêmio do melhor diretor no festival de Cannes deste ano, e do filme já ter sido o selecionado do país para a cerimônia do Oscar, ano que vem.

Guerra Fria conta a história de amor, vagamente inspirada na vida dos pais do cineasta, entre duas pessoas diferentes uma da outra, em suas origens e personalidade. Desde o fim da Segunda Guerra Mundial em 1945, a Polônia visa reconstruir sua imagem perante o mundo, mostrando sua cultura e valores artísticos. Assim, Zula e Wiktor irão cruzar o caminho um do outro, se apaixonando, e tentando manter este amor durante o período da Guerra Fria iniciada na década de 50, em seu país de origem, mas também em Berlim, Paris, e na antiga Iugoslávia.

É, precioso perceber as diferenças, nas semelhanças entre seu filme atual e Ida. Ambos, preto e branco, além da proporção 4:3, na horizontal e vertical, que deixa um aspecto mais quadrado ao filme. Pawel Pawlikowski fez um tipo de ‘copia e cola’. Pena, que repetir as mesmas formas não eleva Guerra Fria da Mostra SP da mesma maneira que fez com o filme de 2013.

Ida possui uma atmosfera de austeridade, como se toda vez que uma personagem falasse, estivéssemos a espera de algo ruim acontecer. Era uma obra mais fria e sóbria que o longa atual. Assim, o aspecto preto e branco harmonizava mais em estabelecer o ambiente adverso e trágico que passavam as personagens femininas da trama.

Já, em Guerra Fria a ideia é outra, com um clima muito mais musical, até dançante, inevitável não sentir uma energia mais otimista, inclusive porque a música folclórica polonesa é capaz de contagiar o espectador de mente aberta e espírito livre. Mesmo um pouco de humor é algo existente aqui nesta obra. Desta maneira, a escolha do preto e branco acaba sendo mais um capricho do cineasta em condicionar uma forma ou estilo, do que uma escolha narrativa condizente ao contexto do enredo.

Mesmo, a forma quadriculada é mera escolha estética. Não, que esta seja mal feita, muito pelo contrário, algumas das composições na tela são hipnóticas de se olhar. O trabalho do cinematógrafo Lukasz Zal é belíssimo e muito inspirado quando vistos como quadros, por exemplo, na cena que Zula pula no rio e deixa a correnteza levá-la, só aparecendo sua face, da testa ao queixo, e em alguns momentos suas mãos acima da superfície da água, fazendo seu corpo desaparecer. Seguramente, colírio para os olhos, mas ao fazer isso em um roteiro sem conflitos, acaba por revelar desigualdades.

Nesse quesito, é possível fazer um comparativo entre Guerra Fria e Dunkirk de Christopher Nolan. Óbvio, que no filme de Nolan existe uma harmonização dos fatores técnicos que faltou no longa de Pawlikowski, mas não eximiu Dunkirk de revelar seus desequilíbrios narrativos, pois assim como no filme polonês, os momentos de conflito são efêmeros, até mesmo inexistentes, seja pela estrutura escrita ou na dramaticidade das ações.

Do casal de protagonistas, convence a performance espevitada de Joanna Kulig, que interpreta Zula, porém, não se pode dizer o mesmo do ator Tomasz Kot, seu par romântico, que faz Wiktor. Em uma obra que busca retratar o amor incontrolável entre duas pessoas, só Kulig recebeu o memorando, dado que o trabalho de Kot ficou sempre em temperatura morna. Mesmo nos momentos de paixão, a câmera de Pawel Pawlikowski só consegue capturar a selvagem Zula.

Agora, o próximo desafio do cineasta polonês será desenvolver algo novo e menos familiar. Uma vez que, acreditar que Ida e Guerra Fria da Mostra SP são similares, só indica que o autor deva fazer como seus protagonistas. Sair do lugar onde está, e ir a outro em busca de uma melhor vista.

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