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O desastre que foi a franquia O Espetacular Homem-Aranha

A verdade é que o Homem Aranha devia ter se juntado ao universo cinematográfico da Marvel assim que o quarto filme estrelado por Tobey Maguire foi cancelado pela Sony…

Mas já que a companhia quis se segurar ao personagem por mais um tempo, ganhamos mais dois filmes de uma nova franquia, intitulada O Espetacular Homem Aranha, com Andrew Garfield no papel principal. O que vale a pena fazer agora que entramos nessa nova era do personagem na Marvel é olhar para trás e ver onde esses dois filmes erraram, e onde nós, espectadores, erramos com eles.

Desde o anúncio de que a Sony faria um reboot da história do herói que levava Peter de volta para o ensino médio e trazia mais fidelidade aos gibis, especialmente na personalidade e nas piadinhas do herói em ação, os espectadores se mostraram um pouco injustos ao julgar a nova franquia. Isso é especialmente claro se você pensar que essas mudanças anunciadas pela Sony na época, assim como a inclusão de dispositivos eletrônicos que ajudam Peter a lançar suas teias, eram reclamações que os fãs apresentavam desde o primeiro filme, em 2002. É um caso estranho do público se voltando contra o estúdio quando ele lhe dá exatamente o que eles queriam.

Para começo de conversa, no entanto, a Sony nunca deveria ter cancelado Homem-Aranha 4 tão abruptamente no meio do seu processo de produção. Obviamente, o terceiro filme da franquia ficou aquém das expectativas em todos os sentidos, e a Sony não estava disposta a dar mais liberdade para Sam Raimi consertar os problemas causados, essencialmente, pela falta de liberdade dada para Sam Raimi na produção de Homem-Aranha 3.

É assim que as mentes de executivos de estúdios funcionam: se seu desastre foi causado por interferência demais no trabalho de um diretor, a solução é exercer ainda mais controle criativo do que antes. Cancelar Homem-Aranha 4, que já tinha escalado novos atores, começado o processo de design de produção, e já tinha um roteiro pronto, trouxe prejuízos absurdos para a Sony, que quase foi a falência – O Espetacular Homem-Aranha foi o que surgiu do desespero causado por essa decisão.

Avi Arad
Avi Arad

O segundo grande erro do estúdio aconteceu nos nomes que chamaram para o time de produção e roteirização da nova franquia. Avi Arad, um homem que é universalmente odiado por todos os fãs de Homem-Aranha do mundo, na época era o responsável por trazer o Venom para o terceiro filme da franquia de Sam Raimi, e portanto era visto pela Sony como um homem com ideias lucrativas. No entanto, analisando sugestões anteriores de Arad para os filmes de Raimi, vemos que a qualidade da franquia original só sofreu quando o cineasta deixou que o executivo ditasse as cartas.

Enquanto Arad controlava o jogo nos bastidores, quem deu a cara à tapa nos créditos de roteiro foram James Vanderbilt e Alvin Sargent. E não é que algum desses dois seja um mau roteirista – Vanderbilt é inconstante, mas já acertou em cheio um par de vezes pelo menos, em Zodíaco e no recente Conspiração e Poder, que também dirigiu; e Sargent venceu dois Oscar nos anos 70 e 80, além de ter nos trazido Homem Aranha 2, ainda um dos melhores filmes de super-heróis da história. O problema é que amarrar a história de Vanderbilt, que já estava desenvolvendo uma trama com o Homem-Lagarto para o cancelado Homem Aranha 4, a uma história de origem que o próprio Sargent já havia contado antes fez com que o filme soasse repetitivo e cansativo.

Por outro lado, apesar dos muitos erros da Sony, será que os fãs deram sequer uma chance para a nova franquia provar que poderia (ou não) funcionar? Quem passeava pelos fóruns de discussão e seções de comentários dos sites de cultura pop por volta de 2010 deve se lembrar bem de que não, isso não aconteceu. Talvez por desconsiderarem qualquer ideia que não envolvesse dar o Homem-Aranha para o universo Marvel de filmes que estava começando a ser construído ruim, talvez por não estarem prontos para ver a franquia de Sam Raimi terminar abruptamente, os fãs sempre estiveram firmemente contra O Espetacular Homem-Aranha. A escalação de Andrew Garfield, a revelação do visual do Lagarto e do novo uniforme do herói – nada disso foi visto com bons olhos pela comunidade online de fãs.

Quando o primeiro O Espetacular Homem-Aranha finalmente saiu, em Julho de 2012, a reação dos críticos e do público foi surpreendentemente positiva, mas esses fãs citados aí em cima não deram folga: apesar dos elogios da crítica, Andrew Garfield acabou sendo rotulado pela comunidade online como uma “versão hipster” de Peter Parker, e reclamações sobre o tom mais sombrio do filme e a semelhança absurda com o primeiro Homem-Aranha, de 2002, continuaram a aparecer. Embora considerado em largas margens um sucesso comercial, O Espetacular Homem-Aranha fez menos dinheiro que os três filmes anteriores, o que levou a Sony, infelizmente, a ouvir um pouco demais as insistentes reclamações dos fãs mais contrariados.

O resultado foi que, durante a produção do segundo filme da nova franquia, a Sony fez várias modificações da visão original do diretor Marc Webb, abandonando o tom um pouco mais sombrio do primeiro filme e adquirindo uma qualidade que se aproximava muito de Os Vingadores, um grande sucesso na época. É curioso traçar que, quando o primeiro O Espetacular Homem-Aranha entrou em produção, o grande filme de super-heróis no inconsciente coletivo era o definitivamente realista e sombrio Batman – O Cavaleiro das Trevas, e de 2012 para frente o tom mais leve e bem-humorado da Marvel tomou a frente.

O crescimento do universo compartilhado da Marvel também influenciou o segundo filme de Marc Webb, que tentou desastradamente desenhar o começo de um mundo expandido a partir do Homem-Aranha, contendo os personagens cuja propriedade ainda era da Sony. Pareceu uma decisão esperta do ponto de vista comercial, mas fazer isso apressadamente significou que O Espetacular Homem-Aranha 2 se preocupou mais em passar-nos essa noção de expansão do que em contar sua própria história.

Não ajudou o filme também, financeiramente, o investimento absurdo que a Sony fez em marketing na época do lançamento. Claro, propagandas são sempre positivas, certo? Nem sempre, especialmente quando o valor gasto para promover um filme pode dobrar os já altos custos de sua produção, fazendo que a missão de dar lucro para o estúdio seja um pouco mais difícil. Com a Sony não tendo mais o direito de comercializar produtos relacionados ao Homem-Aranha (os direitos foram vendidos à Marvel em 2012), O Espetacular Homem-Aranha 2 provavelmente não fez muito barulho nos bolsos e cofres do estúdio.

Agora, não estamos dizendo que o segundo filme da franquia de Marc Webb é excelente, nem que é um dos melhores Homem-Aranha que vimos no cinema. Mas a comparação que alguns fãs mais radicais fizeram com Batman & Robin, o terrível filme de Joel Schumacher de 1997, é um pouco injusta.

A moral que fica com essa nossa extensa história da franquia que muitos fãs desprezam é que talvez eles não sejam filmes ou tentativas tão ruins de fazer algo diferente com o personagem. O problema é que tanto o estúdio quanto os fãs não quiseram dar à visão do diretor Marc Webb para o Homem-Aranha uma chance de respirar e tomar vida – quando o segundo filme começou a ser produzido, o estúdio já imediatamente abandonou a visão original e seguiu para a direção do que era mais popular.

É claro, estamos todos muito felizes que o Homem-Aranha finalmente está no Universo Cinematográfico da Marvel, mas nem por isso precisamos desprezar os filmes que o levaram até lá.

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