Atenção para spoilers da série!
Na superfície, logicamente, a subtrama do filho que Mulder e Scully tiveram que dar para a adoção para protegê-lo das forças governamentais que perseguem os dois agentes, deveria ser uma parte interessante e eficiente do novo Arquivo X. William, o nome do garoto, faz com que o elo entre os dois protagonistas seja inquebrável, e nos lembra exatamente o quanto esses dois tiveram que sacrificar pela sua busca incessante por respostas.
E Gillian Anderson (Scully) entrega uma performance espetacular no quarto episódio, “Home Again”, mas a sensação é que sempre que paramos o episódio para assistir ela lamentando seu filho perdido, Arquivo X entra em um limbo do qual não consegue se recuperar.
Não ajuda que a trama central desse episódio, mais um “monstro da semana”, sofre um pouco dos defeitos que caracterizaram as últimas temporadas da série original. O conceito é interessante: uma versão anabolizada de um morador de rua, vestido com trapos e descalço, viaja em caminhões de lixo para matar os ricos e inconsequentes. Cada um dos ataques (são quatro mostrados pelo episódio) carrega aquela brutalidade intencional que fez de Arquivo X uma série respeitavelmente assustadora, e ainda é divertido ver pessoas das quais instantaneamente não gostamos sendo despedaçadas por criaturas sobrenaturais.
O problema é que esse monstro da semana não tem nenhum significado um pouco maior ou ponto de interesse. Mulder e Scully eventualmente acham o artista criador desse monstro, que confessa a eles ter usado seu dom (suas artes de rua tomam vida!) para dar aos fracos e oprimidos de Philadelphia uma voz. E não é que isso seja implausível demais – a essa altura, dá para aceitar que qualquer coisa é possível no universo de Arquivo X. O problema é que a ideia parece um conceito bacana mal desenvolvido, que confia mais no impacto visual do monstro do que no seu significado. O episódio nos apresenta algumas pessoas das quais não gostamos, mas que provavelmente não merecem morrer – elas são mortas, o crime é desvendado, e nós seguimos em frente.
Mas essa é só metade do episódio. A outra metade começa quando Scully recebe uma ligação do seu irmão William, que lhe conta que sua mãe está no hospital, e não tem mais muitos dias para viver. Essa revelação leva Scully a se preocupar com questões que nunca serão respondidas, com o bem estar do seu irmão mais novo Charlie, e, eventualmente, com o destino do filho que ela e Mulder deram para a adoção (também chamado William). O que funciona nessa trama são as atuações: Anderson é uma excelente atriz, e tanto ela quando David Duchovny (Mulder) estão comprometidos em dar peso a essa parte da série – em larga escala, eles conseguem.
O roteiro não faz o melhor trabalho para ligar as duas tramas, no entanto, e talvez por isso a trama do filho perdido dos protagonistas não tenha a significação que poderia ter. Como uma meditação sobre a natureza frustrantemente inarticulada da morte, o episódio tem seus momentos, mas a única vez que o roteirista Glenn Morgan tenta conectar as duas tramas, dando a Scully um discurso sobre a responsabilidade dos pais sobre seus filhos, dirigido ao artista que “deu à luz” ao monstro da semana, parece um pouco forçado.
Quando a mãe de Scully morre, é um momento tocante para qualquer fã da série original. Quando ambos os agentes são vistos em uma praia no final do episódio, com as cinzas da mulher, nós vemos Scully passando por um processo de luto tanto em relação à mãe quanto em relação às escolhas que ela fez, que a levaram a esse lugar em sua vida. Quanto ao pequeno William, no entanto, a decisão de fazê-lo um filho ausente diminui o impacto que ele tem no espectador.
“Home Again” tem momentos de quieta beleza e ainda conserva muito do prazer de ver esses dois personagens mais uma vez juntos, passando por novos obstáculos dramáticos e novas investigações. Em relação às ambições que o episódio apresenta, no entanto, o resultado final é certamente uma decepção.