Seguindo o mesmo estilo de séries de sucesso como Narcos e Rainha do Sul, além de constar como a mais nova produção nacional para o catálogo da Fox Premium, a saga do crime Impuros estreia sua primeira temporada completa no serviço de assinatura da FOX hoje (19). Criado por Alexandre Fraga, ex-policial, o seriado propõe uma ampla narrativa sobre o tráfico no Morro do Dendê, Rio de Janeiro, durante a década de 90, acompanhando um extenso elenco de personagens e as trágicas maneiras com que suas vidas se cruzam. Saiba o que achamos dos dois primeiros episódios a seguir.
A premissa inicial de Impuros é retratar de forma crua a transformação de um homem comum em criminoso e consequentemente sua ascensão como chefe do tráfico, abordando uma série de questões no caminho. A primeira dessas questões é a segurança pública, algo que fica claro já nos créditos de abertura, com imagens do morro em verde e amarelo ao som de uma versão melancólica de Eu Só Quero é Ser Feliz, que se repete ao final do primeiro episódio. O perigo no ato de simplesmente ir e vir na periferia, tanto pelo movimento do tráfico quanto pela truculência policial, é o que desencadeia sua narrativa.
No primeiro capítulo, somos apresentados a dois irmãos, Evandro (Rafael Logam) e Zeca (Antônio Carlos), que acabam de completar 18 anos e se alistam para servir no exército. O primeiro, que não fazia questão de servir, é recrutado, enquanto o segundo, que via no serviço militar a oportunidade de sustentar sua namorada grávida, fica de fora. Assim, passamos a acompanhar duas trajetórias paralelas: Evandro treinando no exército e Zeca entrando para o crime, passando a transportar propina do tráfico para policiais corruptos. O piloto faz um bom trabalho de alternar entre as duas histórias e capturar o interesse, mesmo que de forma tradicional.
Também são introduzidos outros personagens de importância no episódio piloto, embora com participações reduzidas. Arlete (Cyria Coentro), a mãe dos dois, mal sabe que um dos filhos está envolvido com o tráfico, enquanto o amigo Afonso (João Vitor Silva), que estuda economia, serve para explicitar os diferentes tratamentos dados a brancos e negros da periferia – quando Zeca é dispensado do exército por ter cara de “vagabundo”, Afonso é dispensado por excesso de contingente. Por fim, o traficante para o qual Zeca trabalha, Salvador (André Gonçalves), é uma espécie de intermediário entre o comando do morro e a polícia, alternando entre os papéis de mentor e inimigo.
As duas linhas narrativas principais voltam a se cruzar no trágico fim do piloto, quando Zeca perde o dinheiro do suborno e é morto por um dos policiais, o que tira Evandro dos trilhos. No processo de buscar justiça, executa uma vingança contra os assassinos do irmão e também se torna um criminoso, sendo recrutado por Salvador. Esse final amarra bem a estreia e cria um bom gancho para o próximo capítulo, que é o pontapé “pra valer”. Isso reforça a busca da Fox por um modelo que se equilibre entre o formato padrão televisivo, com capítulos mais contidos, e outro mais similar ao da Netflix, com episódios colados diretamente um no outro.
Entretanto, digo que o próximo capítulo é “pra valer” por ser nele que se consolida um formato específico, neste caso o apelidado como “teia da vida”. Saltando no tempo e introduzindo novos personagens de destaque, como o policial Morello (Rui Ricardo) e a DJ Geisy (Lorena Comparato), o segundo episódio apresenta arcos dramáticos mais robustos para o elenco coadjuvante introduzido anteriormente. A ida da mãe Arlete à igreja, por exemplo, faz um bom contraponto à vida de violência do filho, enquanto o amigo Afonso passa a usar seus conhecimentos em exatas para atuar como contador do traficante Salvador. Assim, a série passa a ser sobre um grupo de pessoas, e não só a saga pessoal de Evandro.
Na verdade, é no arco de Afonso que a série passa a fazer um maior uso de seu período. Se antes, no piloto, a ambientação nos anos 90 se limitava aos batidões da época na trilha sonora, aqui a reforma fiscal do governo Collor, quando o cruzado passou a ser cruzeiro novamente, tem um papel chave no destino do personagem, que comete o erro de comprar um carro conversível na véspera dessa mudança. Porém, por mais interessante que seja a ideia de juntar tramas ficcionais e fatos para criar tensão, é nela que o roteiro começa a se apoiar nos acasos, especialmente na conclusão desse arco, e isso pode prejudicar o realismo da série futuramente.
Com direção de René Sampaio e Tomás Portella, que bebem da mesma estilização crua consagrada por filmes policiais como Tropa de Elite 1 e 2, Impuros é eficiente em sua proposta mas ainda não se distingue muito de outras produções do tipo. Mesmo que conte com um forte elenco comandado por Raphael Logam, que torna crível a transformação radical de Evandro e cria promessa para os capítulos futuros, o seriado ainda tem muito o que provar com sua narrativa, que aparentemente só vai se expandir daqui em diante, como o próprio império adentrado pelo protagonista.