Atenção para spoilers do último episódio!
The Walking Dead não tem uma filosofia narrativa consistente. Não estamos querendo dizer num sentido elevado, como “o que essa série toda tem a dizer sobre a nossa sociedade?”, mas seria bacana se houvesse um ponto por trás de toda a violência, miséria e sangue de cada episódio.
Talvez não seja justo pedir isso da série da AMC, que está no ar já há seis anos – talvez os roteiristas da série tenham achado que colocar um único ponto ou uma única filosofia por trás da narrativa da série fosse ser um pouco limitante, e tenha pedido aos seus espectadores que abracem essa experiência por todas as suas múltiplas facetas. Mesmo assim, para cada momento de personagem bem escrito em “No Way Out” – o episódio de retorno do hiato – como o surgimento dos Alexandrinos, por exemplo, há uma falha na formulação das histórias e narrativas que é tão desastrada que chega a ser engraçada. “No Way Out” nos lembra repetidamente que essa é uma história séria, especialmente através da trilha sonora e dos múltiplos monólogos sobre sobrevivência e outros detalhes. Ao mesmo tempo, é um episódio em que Daryl tem poderes tão ilimitados que ele poderia muito bem ser um super-herói.
Seriamente, o personagem consegue cometer um assassinato silencioso com um grupo de seguranças/criminosos bem armados não muito longe dele. Em seguida, ele derruba ditos criminosos com um lançador de foguetes, e usa o lançador de foguetes para colocar fogo em um lago em Alexandria, o que atrai os walkers para o lago e os leva para sua (segunda) morte – sempre foi tão fácil matar os zumbis de The Walking Dead com fogo? Essa não é uma armadilha. Eles estão vendo o fogo, e andam diretamente em direção a ele.
Os nossos heróis também matam os capangas de Negan, logo quando o líder deles estava prestes a desferir um tiro que mataria Abraham e/ou Sasha. É sempre interessante quando The Walking Dead recorre a um pouco de violência exagerada, mas vamos esperar que a próxima vez que Negan ou as pessoas que trabalham para ele forem mencionadas ou aparecerem em tela, não seja para uma participação tão rápida e pouco significante na trama geral. Ambas essas partes até fizeram um pouco de sentido.
É difícil argumentar que a morte da família Anderson pode ser vista da mesma forma, no entanto – inevitavelmente, a decisão de tirar Jessie, Sam e Ron da história parece um recurso dos roteiristas para nos lembrar que ninguém está seguro no mundo da série, e mais nada além disso. Apagar personagens supostamente importantes não é um defeito por si só, mas dar a eles uma morte que não tem sentido nenhum dentro da trama, e que provavelmente não vai afetar em nada (ou em muito pouco) os próximos desenvolvimentos da temporada, tem um nome: sensacionalismo. A família Anderson é apagada de The Walking Dead como letras são apagadas de uma lousa, sem pensar duas vezes.
É especialmente difícil se importar muito quando estamos exponencialmente mais preocupados com Carl, que leva um tiro no rosto e perde um dos olhos. Fazer com que Ron seja o causador desse ferimento, mesmo que por acidente, só faz embolar a história dos Anderson com personagens mais interessantes, com os quais nos preocupamos mais. O conflito todo da família, e suas eventuais mortes, empalidecem ainda mais se comparados à trama e à dinâmica de Carl e Rick.
O Lobo que capturou a Dra. Denise tem o que parece ser uma mudança radical de intenções, só para em seguida ser morto por Carol. Enid aprende o valor do trabalho de equipe, e Glenn quase é morto tentando salvar Maggie, mas na verdade ele sobrevive, graças a algumas metralhadoras. Nada disso, no entanto, realmente ressoou como uma decisão narrativa interessante ou com qualquer sentido de desenvolvimento de personagem/história.
Mas talvez estejamos sendo um pouco duros com “No Way Out”. A visão dos Alexandrinos se unindo para lutar contra os Walkers foi quase inspiradora, e será bacana ver Rick tentando ajuda-los ao invés de dispensá-los como uma perda do seu tempo. Mesmo assim, The Walking Dead parece tão cansada de si mesma quanto alguns espectadores que abandonaram a série temporadas (ou episódios) atrás – a sensação é que a história nunca está se movendo adiante, e que as ameaças e conflitos para os personagens são sempre os mesmos, não importa onde ou com quem eles estejam dessa vez.
Está mais do que claro que a série mais vista da AMC (e, argumentadamente, o maior fenômeno cultural da atualidade) precisa de novidade, de uma ameaça nova, de uma visão diferente dos seus personagens. Caso contrário, é tudo mais do mesmo.