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Com trama e personagens desinteressantes, Rua Augusta começa com o pé esquerdo

A personagem mais interessante de Rua Augusta, primeira série brasileira produzida pelo canal TNT, é Nicole, interpretada por uma magnética Patrícia Dejesus. Apesar de trabalhar em um clube de strippers e frequentemente (pelo que subentendemos de um diálogo) passar noitadas na boate ao lado onde arranja um ou outro cara para levá-la para casa, Nicole tem um namorado estável, Bruno (Jonathan Haagensen), para quem mente sobre seu trabalho.

Um dos tais caras com quem ela passa uma noite quente é Emilio (Rodrigo Pandolfo), um jornalista. Quando os dois chegam na “hora H”, Nicole o proíbe de beijá-la, mas Emílio “não resiste”, fazendo com que a stripper pare a coisa toda na metade – só que, mais tarde, quando Emílio a visita no clube, Nicole corre atrás dele na rua e o beija sem aviso, inciando o próprio gesto que o proibiu de fazer.

Há uma personagem complexa, conflituosa e interessante para explorar aqui, e em larga parte o roteiro de Jaqueline Vargas a explora, deixando um gostinho de “quero mais” – Nicole (e Patrícia) é uma presença em tela da qual queremos mais doses, doses semanais. Uma pena que ela seja a única trama verdadeiramente interessante em meio a um pastiche de mistério, thriller criminal sujo e observação social rasa.

Uma série passada na Rua Augusta é uma excelente ideia. Qualquer um que conheça a locação mais movimentada da noite paulistana sabe que um milhão de histórias se desenvolvem por lá rotineiramente, poucas realmente notáveis sob uma perspectiva dramática, mas muitas extremamente envolventes, que teriam algo de humano a ensinar (e criticar, e expor) caso fossem contadas em uma obra de ficção.

Rua Augusta, a série da TNT, não parece disposta a contar nenhuma dessas histórias. Sua estética cansada abusa das sombras e das luzes neon, seus diálogos nem sempre escapam da rigidez do português escrito (em oposição ao falado), sua câmera parece viajar por tempo demais nos corpos expostos das mulheres que filma ao invés de mergulhar em suas psiques.

Mika, a protagonista de Fiorella Mattheis, é uma cifra em forma de personagem – propositalmente, é verdade, uma mystery girl cujas relações com outros personagens devem ser desvendadas e revistas com o passar dos episódios. Como ponto de introdução ao universo da série, no entanto, ela não é interessante o bastante para gerar empatia quando sofre um ataque misterioso em uma boate, ou quando seu namorado (possivelmente abusivo) encontra e espanca o responsável pelo ataque quase até a morte.

Violenta e ligeiramente deprimente, Rua Augusta perde a oportunidade de capturar um ambiente de ebulição cultural, de expressão, de representação humana. Ao invés disso, escolhe fazer do seu cenário tão interessante só mais uma via asfaltada onde sangue é derramado sob luzes neon. Que pena.

Rua Augusta
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