Além de um novo ator principal, a segunda temporada de Altered Carbon também traz uma nova proposta tonal para a sua narrativa de ficção científica, deixando para trás as características “detetivescas” que marcaram a história de Takeshi Kovacs, quando o personagem ainda era interpretado por Joel Kinnaman.
Desta vez, Anthony Mackie é quem assume o comando do protagonista, após este ter encerrado sua investigação repleta de conspirações durante a primeira temporada. A nova interpretação não traz muitos destaques condizentes com o que já estávamos acostumados, no que diz respeito à personalidade de Kovacs, mas também é preciso notar que o personagem se encontra em novas circunstâncias bem diferentes, depois de se passarem trinta anos desde que precisou matar sua irmã. No entanto, esta nova versão do personagem não tem a mesma “presença” ou o “ar misterioso” de antes, com Mackie até mesmo integrando um pouco mais de charme descontraído no personagem.
Agora, Kovacs dedica todos os seus esforços a encontrar pistas sobre o paradeiro de Quellcrest Falconer (Renée Elise Goldsberry), depois de ter descoberto que sua irmã fez um “backup” do cartucho da líder revolucionária. Espectadores que tenham assistido a primeira temporada na época do lançamento podem se sentir um tanto enferrujados ao adentrarem este universo novamente, com todos os jargões sci-fi que há para se decorar, mas os primeiros episódios se esforçam para reestabelecer as dinâmicas principais da série, e relembrar o público de pontos essenciais da trama anterior.
As novas metas para esta temporada são rapidamente estabelecidas, após um pouco de recontextualização. Kovacs se encontra, novamente, no “Mundo de Harlan”, e precisa encontrar Falconer enquanto lida com mais um “regime elitista” em conflito com uma nova versão da revolução que ajudou a construir, séculos atrás. Este segundo ano trata sua história com bem mais objetividade do que antes. Tramas paralelas são bem mais sucintas, e o desenrolar da narrativa passa por menos desvios, o que torna a nova trama bem mais palatável do que as investigações da primeira temporada. E de quebra, ainda temos o retorno de Poe como ajudante do protagonista, o que facilita a transição destas novas circunstâncias para o espectador.
E conforme a temporada avança, fica claro que Altered Carbon deixa de lado suas referências ao gênero “noir”, e até mesmo certas construções “cyberpunk”, para focar em uma narrativa mais dinâmica e abrangente, em um tom que se assemelha muito mais ao que a CW costuma apresentar em séries como The 100 ( diferenças de orçamento à parte). A trama, desta vez, traz mais sequências de ação, e menos momentos de reflexão sobre o estado do ser humano em meio à esta sociedade capaz de viver indefinidamente. O universo da série se expande nestes novos episódios, mas não é necessariamente aprofundado ou discutido com o mesmo entusiasmo que o primeiro ano exibia por seus temas sociais e filosóficos.
Isso pode acabar desanimando fãs que haviam se interessado por esse lado mais reflexivo da série, mas pelo menos, o ritmo desta nova temporada é inquestionavelmente mais envolvente, mesmo que Mackie acabe não tendo o mesmo espaço que Kinnaman para explorar a complexa perspectiva deste protagonista. Falconer, por outro lado, acaba recebendo ainda mais destaque, se tornando uma personagem possivelmente mais interessante de se aprofundar em uma terceira temporada do que o próprio Kovacs (caso um terceiro ano decidisse continuar indo mais à fundo nas tramas revolucionárias recorrentes deste universo).
As cenas de ação desta segunda temporada seguem o padrão esperado de grandes produções televisivas atuais, com algumas sendo mais pragmáticas do que outras, mas entregando algumas sequências visualmente elaboradas que conseguem colocar Altered Carbon em um nível mais próximo do que se almeja em séries mais populares e mais caras (como os carros-chefes da HBO). Mais do que nas cenas de ação, o trabalho estético dos diversos cenários e figurinos futuristas, além da quantidade de efeitos especiais, é onde deve cair a culpa para que as temporadas da série precisem de um tempo maior entre suas produções.
Altered Carbon é uma série que exibe perfeitamente o que o público passou a esperar do gênero “cyberpunk”, bebendo da fonte de referências predominantes na cultura pop como “Blade Runner” e “Akira”. Mas nesta segunda temporada, apesar da trama ainda continuar aproveitando as diferentes reviravoltas proporcionadas por um mundo onde pode-se trocar de aparência com relativa liberdade, os roteiristas foram atrás de elementos incomuns às suas referências para gerar um certo aumento de escala para a narrativa, o que enfraquece um pouco a consistência deste universo, e a dinâmica mais burocrática que foi estabelecida na primeira temporada.
Ainda assim, o universo da série apresenta potencial de sobra para diversas histórias que podem seguir tons diferentes em suas execuções. Caso a série apresentasse um sucesso esmagador, a Netflix certamente não demoraria a introduzir spin-offs que se passassem paralelamente à série (Um anime, inclusive, já está à caminho). E para futuras temporadas, chegamos a torcer para que Altered Carbon se permita explorar outros planetas desta sociedade, abrindo espaço para diferentes caracterizações deste futuro distópico.
E com a conclusão deste segundo ano, é bem possível que a próxima temporada esteja justamente mirando em uma nova narrativa ainda mais distante do que vimos até aqui. O resultado da trama gera uma certa liberdade para os roteiristas, que com certeza poderia elevar Altered Carbon à um patamar mais memorável, pois apesar do bom trabalho estético e referencial, a série ainda precisa conseguir apresentar a originalidade que acompanha as obras mais aclamadas do gênero.
Em certos pontos, esta foi uma temporada mais aproveitável do que a primeira, com um ritmo perfeito para maratonas e ação de sobra para manter o espectador casual envolvido. Ao mesmo tempo, também perdeu-se um pouco da ambição temática da série, que servia como um dos maiores apelos do primeiro ano para fãs de ficção científica. Mas Altered Carbon continua sendo interessante de acompanhar, tanto por seu potencial, quanto por seus visuais atrativos. Nos resta, então, esperar e torcer por uma continuação que possa fazer com que a série se torne um assunto recorrente nas discussões do público.