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Crítica - A Mulher na Janela

Suspense da Netflix se autossabota em narrativa que comenta traumas e depressão enquanto homenageia Alfred Hitchcock

“Todo mundo gosta de um susto!”

Bom, ao menos era isso o que dizia o renomado “Mestre do Suspense” Alfred Hitchcock. Se é verdade ou não, pouco cabe discutir isso aqui. Agora, podemos dizer que o cineasta Joe Wright acredita, ou simplesmente gosta muito dessa teoria. O diretor inglês de 48 anos de idade aprecia tanto tal conceito que quis fazer o seu próprio suspense à la Hitchcock com A Mulher na Janela, que se encontra disponível no catálogo da Netflix.

Se, ao menos ele quisesse ser ele próprio, e não um dos mais celebrados autores cinematográficos de toda a história…

No thriller, acompanhamos Anna Fox (Amy Adams), uma psicóloga infantil que sofre de agorafobia, que se encontra intrigada com a família que se mudou para o apartamento em frente do seu na cidade de Nova York. Porém, tudo vira de cabeça para baixo quando a própria testemunha um assassinato. Agora, Anna precisará convencer todos a sua volta que o que ela viu não é um produto de sua imaginação.

Carta ao mestre

Ao analisar a carreira do diretor Joe Wright, nota-se que há um tanto de irregularidade em suas obras. Se por um lado, foi responsável por filmes como Orgulho e Preconceito (2005), Desejo e Reparação (2007) e mais recentemente, O Destino de Uma Nação (2017); por outro, entregou materiais bem questionáveis, como O Solista (2009), além de uma risível versão de Peter Pan (2015).

Lamentavelmente, seu mais recente trabalho A Mulher na Janela, junta-se ao grupo daqueles que se encontram na descendente da ladeira. Curioso, que é possível perceber equívocos similares na projeção atual que lembram às produções de 2009 e 2015, como por exemplo, fazer um comentário social de serviço público, mas escorregar em exageros narrativos visuais, ou pior, misturar elementos heterogêneos em um caos onde nada parece crível ou emocionalmente acolhedor.

De modo mais direto, Joe Wright quis abordar nesta produção da Netflix, uma temática que fala sobre traumas e depressão, mas autossabotou-se na construção de um suspense hitchcockiano no meio disso tudo. E, quando se fala aqui de um thriller inspirado nas obras do lendário cineasta inglês, pode acreditar que tal inspiração é literal na prática, dado que a produção toma emprestado elementos clássicos destes filmes feitos por Hitchcock.

Mais especificamente: Janela Indiscreta (1954), Um Corpo que Cai (1958) e Psicose (1960), três dos longas-metragens mais conhecidos e venerados do autor de cinema, reconhecido como um ás do gênero do suspense.

Obviamente, a inspiração maior fica com o clássico de 1954, estrelado por James Stewart, porém, não demora muito para que Wright “homenageie” os outros dois citados.

Talvez, faltou ao diretor de Uma Mulher na Janela perceber uma das características mais básicas quando falamos sobre Alfred Hitchcock: saber como criar e elevar o suspense com um bom uso de uma câmera que deixa a narrativa visualmente clara, e até mesmo elegante em estilo.

Nesse quesito, Festim Diabólico (1948), outro clássico de Hitchcock, talvez seja ainda melhor exemplo.

Até o diretor Christopher McQuarrie conseguiu ser mais distinto com sua câmera em Missão Impossível – Nação Secreta (2015) que Joe Wright em sua produção para a plataforma da Netflix. Isso considerando que o longa de McQuarrie pertence ao gênero ação, que exige movimentos mais rápidos e inesperados.

Frustração

A sensação maior que fica com o rolar dos créditos finais de A Mulher na Janela é de que houve um desperdício de talentos nessa produção Netflix.

Começando pelo diretor de fotografia Bruno Delbonnel, que repetiu a dobradinha com Joe Wright após o sucesso do muito competente O Destino de Uma Nação. Apesar do belo uso estético da técnica chiaroscuro para estabelecer a ambivalência em cena, tudo isso acaba sendo em vão, devido a direção desconexa de Wright.

Ainda mais sentida, quando falamos sobre o elenco estelar desse projeto, que possui nomes de calibre potentes, como Amy Adams, Anthony Mackie, Jennifer Jason Leigh, Julianne Moore, e o camaleão humano Gary Oldman.

Em especial, a protagonista interpretada por Adams, que faz de tudo para criar um laço de empatia com o assinante Netflix, mas é impedida por um entorno que não tem a menor ideia do que realmente quer ser.

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