Todo mundo sabe que mês de outubro é o mês do terror. É como se toda cultura pop deste período convergisse para o último dia de outubro quando é celebrado o Halloween, a festa das bruxas. As lojas de fantasias faturam alto, vendem-se mais produtos de maquilagem – especialmente muito sangue falso para representações de zumbis ou serial killers – , as casas noturnas da cidade produzem festas temáticas que enchem os olhos dos que se sentem atraídos pelo macabro e grotesco, e tantas outras coisas.
No cinema, é mais simples, lançam-se filmes ao longo do mês para os aficionados do gênero, ou mesmo aqueles que possuem aquela boa curiosidade mórbida de se assustarem ou sentir-se enojados com figuras sombrias e violentas. O pilar do cinema de suspense Alfred Hitchcock já tinha cantado a carta décadas atrás, quando disse que o público geral adora se assustar e gritar na poltrona do cinema, pois se sentem estimulados pelas faces do horror do ser humano.
Pois bem, se nas salas exibidoras, tivemos O Clube dos Canibais, Morto Não Fala, Zumbilândia: Atire Duas Vezes, e Os 3 Infernais; na Netflix também houveram algumas produções, como o ridículo Campo do Medo, o presumível Fratura, o peculiar Contato Visceral e o surpreendente Eli. Agora, mais um a se juntar ao grupo.
Cascavel, escrito e dirigido por Zak Hilditch acompanha a viagem de uma mãe solteira e sua filha pequena que percorrem pelas rodovias em busca de um novo início em suas vidas. Quando o carro tem um de seus pneus furado na estrada, Katrina para no acostamento para fazer os reparos e seguir sua viagem, porém, a menina enquanto brincava acabou sendo picado por uma cobra do tipo cascavel. A mãe consegue ajuda de uma estranha que mora em um trailer ao lado da via pavimentada. Quando se dá conta, sua menina se encontra febril, mas as marcas das presas da cobra sumiram de sua perna. Ainda assim, a mãe leva sua garotinha até o hospital na cidade mais próxima para tratá-la com mais segurança. Lá, descobre que o salvamento de sua filha, deixou-a em dívida com alguma entidade maligna. Assim, Katrina terá agora que encontrar uma maneira de pagar pela vida que foi salva.
Para os amantes do futebol: sabe quando o time têm ótimos jogadores, realmente habilidosos, e ainda assim, quando entram em campo, percebe-se que não dá liga, e que mais parecem um bando que um grupo treinado?! Sabem?
Então, é isso o que se pode dizer do longa elaborado por Zak Hilditch, possui os ingredientes certos, mas a execução é problemática.
O diretor australiano entregou com Cascavel, seu segundo projeto para a provedora mundial via streaming. Uma vez que dois anos atrás, fez 1922 estrelado por Thomas Jane, baseado em um conto de Stephen King. De fácil percepção pegar que o australiano se inspira muito no autor americano em seu trabalho. Já que, mesmo sua mais recente obra – disponível ao assinante Netflix – que é de autoria própria, lembra muito o estilo do renomado autor de histórias assustadoras.
Mas, ficou só na inspiração mesmo, dado que a trama de Hilditch acerta e erra, erra e acerta, e se mantêm assim por todos os atos do filme.
A climatização é boa, pois suga de um dos subgêneros mais sedutores da literatura americana, chamado de ‘southern gothic’ – no traduzido, gótico sulista. Desta maneira, situa-se na parte sul dos Estados Unidos, rodeado de personagens profundamente falhos, perturbados e excêntricos em seu jeito de ser; em cenários abandonados ou isolados envoltos por um ar sinistro e hostil de pobreza, crime e violência.
Se o ambiente era correto, só acertar o desempenho. Pois, é aí onde Cascavel deixa a peteca cair, muitas vezes. Por duas vias: primeiro, a falta de vibração (ou tensão) em muitas cenas onde deveria haver tal carga dramática, e também não ajuda muito o fato de Zak Hilditch errar no ‘timing’ do que poderiam ser alguns momentos de susto, ou mesmo, do tipo incômodos nesta obra; e o segundo, a protagonista Carmen Ejogo, que é convincente como uma mãe cuidadosa, mas desmotivada em todo o resto.
A performance da atriz nos distancia de qualquer sensação mais forte em Cascavel. Mesmo quando o enredo gradualmente vai ficando mais intrincado, fica a impressão de que o horror da personagem se encontra alguns andares abaixo do que o material pretendia.
E, mesmo a parte final da história sofre desta desigualdade, de modo que compreendemos a intenção definitiva do roteiro em apresentar o que é uma vida de remorso, onde sempre olhamos no retrovisor – algo inclusive, levemente eastwoodiano – , seja para onde formos ou estamos. Todavia, para sentir tamanha agonia, usa-se de um ‘Deus ex machina’ dos mais mequetrefes que pode haver, longe daqueles mais apropriados, como em Jurassic Park: O Parque dos Dinossauros de Steven Spielberg, ou Adaptação de Spike Jonze; e, lamentavelmente mais próximo dos usados em Star Wars – Os Últimos Jedi de Rian Johnson.
Isto acaba anulando quase que toda a densidade pretendida, pois soa falso e manipulador demais no momento de catarse.
Em resumo, Cascavel não é muito mais do que uma cobra aleatória que se encontra pelo caminho. Veja aonde pisa!