Caçando nazistas

Crítica: Jaguar – 1ª Temporada

Série espanhola da Netflix aposta no talento de seu elenco, e entretém apesar de algumas escolhas desperdiçadas

Todos concordam que Hollywood não é sinônimo de qualidade.

Sim, a indústria cinematográfica americana cria grandes, por vezes, enormes produções em escala, que geralmente chamam a atenção do público geral, como os filmes de super-heróis, que hoje em dia, nem se encaixam mais no gênero ação, tornando-se um subgênero específico do sistema.

E, apesar de recebermos tantas produções bem (!) questionáveis, algo se mantém intacto: o estereótipo de qualidade do cinema americano.

Não interessa quantas produções abaixo da média vejamos que são produzidas por lá. Fomos formatados pelo sistema para acreditar sempre no melhor cenário quando falamos sobre Hollywood.

Óbvio, que do mesmo lugar, criam-se obras capazes de mudar o panorama, por diferentes razões. Desta maneira, fica a curiosidade deste texto em saber se um dia os espanhóis poderão bater no peito com orgulho e afirmar que são um novo polo de referência para o audiovisual no mundo.

Se isso um dia se concretizará, não há como saber. Contudo, tomamos consciência dos grandes valores produzidos por aquelas bandas nos últimos tempos. E, inegavelmente, isto está atrelado à plataforma Netflix, que elabora e distribui muitos desses materiais ao redor do globo, para que possamos conhecer diversificadas propostas narrativas.

Só neste ano, tivemos: Sky Rojo; Valéria, La casa de papel, além da ótima série O Inocente. Todas estas produções espanholas de maior escala ou alcance com o público.

Agora, chega mais uma (provável) forte marca para a Netflix. Jaguar, que se passa na Espanha durante a década de 60, nos apresenta a jovem Isabel (Blanca Suárez), uma sobrevivente do Holocausto que se junta a um grupo de agentes que buscam justiça contra as centenas de nazistas que fugiram para o país para se esconder após a Segunda Guerra Mundial.

Os cinco jaguares

Possivelmente, uma das coisas mais empolgantes em Jaguar são as personagens, em especial, o quinteto de agentes que busca apreender alguns nazistas infiltrados no país.

Mais excitante ainda é notar que, à parte a protagonista feminina, iremos desvendando o passado de cada um dos membros do grupo no desenrolar dos fatos. Conhecendo suas características, comportamento, manias, e assim por diante.

E, podemos afirmar que apesar de todos, sem exceções, terem sobrevivido situações horrorosas no passado, diretamente ou não, são personalidades diferentes uns aos outros. Isso traz diversidade para a narrativa, além de beneficiar o material com a possibilidade de contrapontos, que sempre geram boas chances para conflitos capazes de educar e entreter o assinante da Netflix.

Melhor: não houve a necessidade de encontrar qualquer destaque do elenco, já que todos estão atuando em alto nível, trazendo um equilíbrio muito bem-vindo à trama.

Isabel é a prova de maturidade no grupo, uma vez que acompanhamos a mudança da jovem raivosa para uma mulher mais consciente de seu papel nestas missões; Lucena (Iván Marcos) é o líder dos Jaguares e a figura mais heroica do grupo, que vai afrouxando sua rigidez a cada episódio; Marsé (Francesc Garrido) é o motorista dividido entre a fé e a vingança; Surdo (Adrián Lastra) é o especialista faz-tudo que reprime o sofrimento do passado pela morte dos amigos; e, Castro (Óscar Casas) é o garoto falastrão que tem habilidades de se infiltrar em qualquer ambiente.

Juntos, formam uma equipe que trabalha complementando as características entre parceiros, enquanto avançam na missão de capturar um médico-cientista responsável por experimentos humanos cruéis.

Espionagem

Para os amantes do cinema de espionagem, Jaguar é um prato cheio. Em apenas seis episódios, cairemos de cabeça em situações típicas deste tipo de cinema, com perseguição de carros, invasão de apartamento, lutas corpo a corpo, e outras coisas.

Mas, é bom levar em consideração que tudo isso é feito sem a proposta da grande escala, pois lembremos, esta não é uma grande produção de orçamento mastodôntico. Desta maneira, teremos algo mais similar aos filmes de espionagem vistos no terço final do século passado.

Todavia, deve-se acrescentar que o roteiro nem sempre aproveita o melhor das situações criadas, dado que não dispõe do tempo necessário para encorpar certas propostas, assim, desperdiçando-as para logo em seguida, introduzir algo novo.

Exemplo: Isabel e Lucena fingindo ser um casal para se aproximar de um ex-militar nazista e sua esposa, para pouco mais a frente, praticar o embate direto entre lados opostos.

Também não faltou ação em Jaguar, principalmente nos episódios ‘Almeria’ e ‘O hospital’. No último, tivemos aquela clássica troca de tiros para tudo o que é lado, ou seja, esse foi daqueles episódios bem barulhentos.

Trauma pós-guerra

De todos os episódios, ‘O esconderijo’ é o que fecha essa primeira temporada de Jaguar na Netflix, sendo definitivamente o mais anticlimático deles. Ainda mais, se pensarmos que se trata do momento onde joga-se a isca na tentativa de convocar o assinante para uma (esperada) próxima temporada.

Um dos temas tratados desde o primeiro episódio desta série é o trauma pós-guerra. Assunto este que afeta a história de todos os personagens, cada um à sua maneira. Então, é um tanto estranho observar o que pode ter motivado os roteiristas Ramón Campos e Gema R. Neira para usar o capítulo derradeiro como um mergulho para o passado, com flashbacks entre a protagonista Isabel, ao lado de cada um dos membros da equipe. Sempre pontuando o sofrimento que envolve a história de vida destas figuras.

Independente do desperdício do episódio, deve-se exaltar o discurso feito por Isabel sobre o divisor de águas, que foi aquele período na vida dela, assim como de tantos(as) que vivenciaram todo aquele terror.

Imagina-se que, havendo uma segunda temporada, podem aprofundar ainda mais nos detalhes de cada uma dessas perturbações dos cinco jaguares. E, se o indicativo diz que quem mais reprime mais perigoso é, então, sai de baixo!

Resumindo: se Jaguar conseguir aproveitar melhor as chances que cria, seguramente tem todas as peças no estoque para ter uma maior longevidade dentro da Netflix. Parece claro, que ela já desvendou o segredo nesta primeira temporada, agora, é só cavar mais fundo.

Sair da versão mobile