Por acaso, já pararam para fazer uma conta (de cabeça) a respeito de quantas produções já assistiram no último ano que falam diretamente ou indiretamente da pandemia, que lembremos ainda (!) faz parte de nossa rotina diária?
Algumas tantas, não?!
Então, sentem que lá vem mais uma!
O Páramo, mix de terror com drama que ficou disponível para os assinantes da Netflix, comenta sobre o aspecto de isolamento que vivemos principalmente no ano de 2020, quando ficamos meses e mais meses trancados em casa, atravessando para o ano seguinte, ainda na expectativa de uma vacina salvadora que pudesse nos libertar do enclausuramento inevitável no objetivo de salvar quantas vidas fosse possível.
O longa-metragem espanhol dirigido por David Casademunt também encontrou espaço para abordar a chegada da maturidade, que uma hora ou outra vai bater na porta quer queira ou não, às vezes, durante o período mais difícil.
Apenas lamentamos que assuntos e temáticas tão relevantes tenham causado menor impacto pela narrativa protocolar, que ainda praticou alguns truques (baratos) do cinema de gênero terror.
A produção espanhola da Netflix nos transporta para uma cabana no meio do nada, isolada da sociedade, onde vive uma família composta por uma criança e seus pais. Porém, um dia algo inesperado apareceu no riacho perto da casa, fazendo com que o patriarca sentisse a obrigação de resolver tal situação. Ele parte, deixando filho e esposa sozinhos. O tempo passa e observamos a mãe enlouquecida vislumbrando uma presença assustadora, sempre observando-os do horizonte, se aproximando a cada dia, testando os laços que os unem.
Crescendo em tempos difíceis
Mérito ou sorte da produção que escala um garotinho como Asier Flores para estrelar sua história. Se tem algo que definitivamente espanta qualquer um assistindo ao terror O Páramo é ele: adorável, impertinente, e acima de tudo, emocionalmente envolvido com tudo que diz respeito à cabana onde vive junto de seus pais.
Sempre exaltando que desenvolver uma história do tipo horror, tendo uma criança como protagonista não é das tarefas mais fáceis. No entanto, ele deu conta do recado, mesmo nos piores momentos do roteiro escrito pelo trio David Casademunt, Fran Menchón, e Martí Lucas, que arriscaram alguns velhos artifícios do terror em vão, como por exemplo, a cena onde o menino ficou envolto por um lindo lençol branco no chão assustado, sem conseguir ver nada, só escutando os tiros de escopeta da mãe que tentava afastar um invasor do terreno da família.
Apesar dos pontos fracos, tivemos uma trama que conseguiu esculpir situações que afrontavam o menino e a maturidade, que ele tanto evitava quando seu rígido pai tentava mostrar algo. O mesmo, pouco antes de partir a cavalo, disse para sua cria cuidar de sua mãe. Palavras pesadíssimas para alguém que ainda está nos estágios iniciais de entendimento e meios de comunicação com um mundo que desconhece em sua maior parte.
Além das fronteiras do medo
Asier Flores se destaca, mas muito disso também acontece porque sua mãe, interpretada pela atriz Inma Cuesta, serve de escada para que o pequeno garotinho mostre seus talentos, mas especialmente auxilie na progressão narrativa intencionada por David Casademunt.
Podemos encontrar o tema central de O Páramo através da mulher da casa que aos poucos começou a mostrar sinais de desânimo, má vontade e irritação, chegando ao nível de enxergar alucinações. Estamos falando aqui sobre a loucura do isolamento e solidão, que vão abatendo nosso emocional quanto mais tempo passa sem termos aquela clareza de que todas as coisas irão se encaixar novamente no lugar onde estavam.
Na obra de Frank Herbert, autor do clássico Duna, aprendemos a expressão “fear is the mind killer” (no traduzido, “o medo é o assassino da mente”), basicamente, sobre a necessidade de sermos maiores do que aquilo que sofremos e nos aflige, pois só superando este obstáculo poderemos seguir em frente na busca de algo que poderá nos trazer um tão merecido bem-estar.
Pela narrativa convencional da obra espanhola originalmente produzida pela Netflix, percebemos que os limites externos e internos se igualam, até o momento que decide firmemente expulsar aquilo que mantinha nosso corpo e espírito presos por correntes invisíveis.